quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

Terra já esteve perto de perder seu campo magnético

Sem um campo magnético, a vida na Terra seria inviável. É graças ao magnetismo do planeta, combinado a seu movimento de rotação, que existe a atmosfera, camada de ar que nos impede de ser completamente tostados pela radiação e sofrer com a influência dos ventos solares – partículas carregadas que o Sol emite. Sem esse escudo protetor, a Terra se tornaria um enorme descampado, como Marte, por exemplo, é hoje.

Parece um cenário distante, não é? Mas por muito pouco isso não aconteceu. Pelo menos é o que argumentam pesquisadores da Universidade de Rochester, nos Estados Unidos, em um novo estudo, publicado na revista científica Nature Geoscience.

Segundo o grupo, o campo magnético da Terra chegou a ser dez vezes mais fraco que o atual no final do período Ediacarano (entre 630 e 542 milhões de anos atrás). Por volta de 565 milhões de anos atrás, no entanto, teve início um fenômeno que impediu seu colapso definitivo: a solidificação do magma no interior da Terra, que ocasionou a formação do núcleo do planeta.

Pesquisas anteriores sempre apontaram para a ideia de que o núcleo interno de nosso planeta seria mesmo relativamente novo. Nos anos iniciais da Terra, há 4,5 bilhões de anos, seu interior era feito basicamente de magma – rochas em estado líquido. Por conta da diminuição da temperatura terrestre e consequente perda de calor, no entanto, a camada rochosa que hoje conhecemos como crosta e manto foi aumentando – deixando o magma represado em partes mais profundas.

Isso aconteceu porque, a partir de um certo momento – algo que os cientistas acreditam ter ocorrido entre 2,5 bilhões e 500 milhões de anos atrás – o ferro e o níquel do interior terrestre passaram a se resfriar, dando origem ao núcleo interno. A solidificação do núcleo fez com que elementos como sílica, magnésio e oxigênio fossem expulsos do centro, criando um movimento de convecção.

Esse fluxo de metais no centro do planeta mantém partículas eletrizadas em constante movimento, o que gera corrente elétrica e, por tabela, o campo magnético terrestre. É esse movimento de fluidos de rocha que explica, até hoje, a existência do magnetismo.

“Conforme a Terra foi se formando, a energia para manter o processo de convecção foi diminuindo aos poucos, até o ponto crítico de 565 milhões de anos atrás em que o campo magnético tinha intensidade extremamente baixa”, explicou John Tarduno, co-autor do estudo, em entrevista à revista Newsweek. “O crescimento do núcleo interno da Terra proveu uma nova fonte para a convecção e religou o ‘geodínamo’ do planeta”.

Ou seja: quando, há 565 bilhões de anos, o movimento natural de minerais no interior terrestre estava quase cessando, o início do resfriamento do núcleo deu o empurrãozinho que a Terra precisava. Isso religou o sistema e colocou o movimento de convecção para funcionar novamente, moldando o campo magnético terrestre até que ele atingisse a força que tem hoje.

Mas como é possível saber de um evento que aconteceu há quase 600 milhões de anos, você leitor, deve estar se perguntando. Para estimar essa data, cientistas analisaram partículas de cristais com o tamanho de um grão de areia, retiradas de uma rocha próxima a Sept-Îles, atual Quebéc, no Canadá, formada nessa mesma época geológica.

Amostras de minerais dessa rocha como plagioclásio (primo do feldspato) e piroxena (da família dos silicatos), mesmo milhões de anos depois, são, portanto, uma forma de mapear o campo magnético terrestre. Em sua composição, elas carregam partículas de ferro em formato de agulha. Aí está a chave: elas se alinham na rocha em um padrão que obedece a orientação do campo magnético da época de sua formação – um prato cheio para entender o comportamento do magnetismo da Terra no período.

Ao analisar as amostras com a ajuda de um equipamento chamado magnetômetro, usado para medir intensidade, direção e sentido de campos magnéticos, cientistas identificaram que a carga das partículas era muito baixa. Estimativas dos pesquisadores indicam que a força do campo magnético da Terra na época seria, mais precisamente, dez vezes mais baixa que atual – a menor já registrada pelos geólogos em todos os 4,5 bilhões de anos de história do planeta.

A Terra segue perdendo calor desde então. É por isso que, daqui a alguns bilhões de anos, o miolo de magma do planeta tende a ficar cada vez menor pelo processo de resfriamento e solidificação – atrapalhando, de novo, o campo magnético. Isso, a menos que outro fenômeno do tipo dê conta de colocar o sobe e desce de minérios no interior terrestre de volta nos eixos. Como quase sempre acontece quando se trata de escalas geológicas, não devemos estar aqui para ver a história se repetir, é claro.


Terra já esteve perto de perder seu campo magnético Publicado primeiro em https://super.abril.com.br/feed

Nenhum comentário:

Postar um comentário