sexta-feira, 29 de março de 2019

Recém-descoberto medusavírus transforma seu hospedeiro em “pedra”

Apesar dos poetas insistirem que a vida imita a arte, ninguém pode negar o clichê de que é a arte que imita a vida. Até mesmo quando ela não sabe que o faz.

Um vírus recém-descoberto em uma fonte termal do Japão é um bom exemplo disso: assim como a figura mítica Medusa, o microrganismo é capaz de transformar seu hospedeiro em “pedra”. Sorte a nossa que seus anfitriões são amebas, não humanos.

Ele sempre esteve lá, na natureza – mesmo que os gregos que primeiro criaram o mito da mulher com cabelo de cobra não fizessem ideia.

Sempre mesmo: a estimativa é que ele exista e interaja com sua ameba hospedeira desde antes da existência do antecessor comum mais antigo conhecido dos eucariontes. Ou seja, sua origem remonta a 650 milhões de anos, quanto se estima que surgiram as primeiras formas de vida multicelular.

Em comunicado emitido pelas universidades japonesas de Kyoto e Tóquio, responsáveis pela descoberta, os pesquisadores reforçam que o medusavírus é antiquíssimo, e que eles e as amebas hospedeiras, da espécie Acanthamoeba castellani, trocam genes desde “tempos primórdios”, ao longo da história e de toda a evolução.

“O medusavírus é um vírus gigante único que ainda preserva antigas características das interações evolutivas com seu hospedeiro”, afirmam eles. Até seu superpoder “do mal”, portanto, seria resultado das trocas genéticas entre o medusa e suas próprias vítimas. Mas, indo ao que interessa: como ele transforma sua ameba hospedeira em pedra?

Lógico, o vírus recém-descoberto não é capaz de converter ninguém, quimicamente falando, em uma rocha literal. Mas, em testes de laboratório, os cientistas atestaram que ele estimula as amebas a desenvolverem uma grossa “casca” externa e entrarem em um estado de dormência – conhecido como encíclico. Elas viram, basicamente, estátuas, presas dentro de uma armadura que seu próprio organismo foi enganado para criar.

Na verdade, essas amebas podem entrar naturalmente nesse estado dormente, mas só em resposta a estresses extremos em seu ambiente. É uma das estratégias extremamente efetivas que elas desenvolveram para sobreviver a ambientes escassos: “adormecem”, consomem o mínimo de energia possível, e voltam a existir normalmente quando as condições são mais favoráveis à vida.

Acabou que as interações ao longo de eras entre as adaptáveis amebas e o medusavírus fizeram com que o microrganismo desenvolvesse seu “poder mítico”: provocar essa reação no hospedeiro quando quiser, e usá-la a seu favor. 

As semelhanças com o monstro grego não terminam aí. Os pesquisadores descobriram que a superfície externa do medusavirus – o seu corpinho – é recoberta por mais de 2.600 pontas arredondadas. Ok, ele pode até não ter as “cobras contorcidas” de cabelo de Medusa, como na singela imagem que dá início a esta matéria, mas podemos dizer que essas pontas sobressalentes são sua própria “peruca” de cobrinhas. 

O estudo, publicado no Journal of Virology, detalha ainda outras características desse microrganismo. Apesar dele pertencer à categoria de “vírus gigantes”, por causa do grande tamanho de seu genoma (bem maior do que a dos vírus comum), ele é muito diferente de tudo que já foi descoberto. Por isso, os cientistas defendem que ele deveria ser agrupado em uma nova família, chamada de medusaviridae.

Agora ficamos no aguardo e na torcida – quem sabe a ciência não descobre o minotaurovírus.


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