segunda-feira, 16 de setembro de 2019

Cometa que se formou em outra estrela está passando pelo Sistema Solar

Na manhã de 30 de agosto, hora local da Crimeia, o astrônomo Gennady Borisov resolveu apontar seu pequeno telescópio para perto do horizonte, em um ponto não tão distante do Sol. Assim, como quem não quer nada, totalmente por acaso, ele fez uma das descobertas mais ansiosamente aguardadas pela comunidade científica — um cometa de origem interestelar. Batizado C/2019 Q4 (Borisov), o viajante galáctico virou o centro das atenções.

Claro que, de início, Borisov não tinha certeza que o objeto tinha se formado em outra estrela que não o Sol. Era apenas uma suspeita. Então ele fez o que muitos astrônomos profissionais e amadores costumam fazer quando descobrem algo potencialmente incrível: compartilhou a notícia em um fórum especializado. Não demorou para que a boa nova corresse quase tão rápido quanto o próprio cometa. E olha que ele viaja a 150 mil km/h.

“A alta velocidade indica não só que o objeto provavelmente se originou fora do nosso sistema solar, mas também que está só de passagem e vai voltar ao espaço interestelar”

Além de estar muito mais rápido que o normal para um corpo a 420 milhões de quilômetros do Sol, ele apresenta uma órbita estranha demais para se encaixar na família solar. “A alta velocidade indica não só que o objeto provavelmente se originou fora do nosso sistema solar, mas também que está só de passagem e vai voltar ao espaço interestelar”, disse em comunicado da Nasa o astrônomo Davide Farnocchia, que estuda o C/2019 Q4 (Borisov).

Desde o princípio, ficou claro que a órbita do astro não fica girando em loop infinito ao redor do Sol, ou seja, ele não é gravitacionalmente vinculado ao nosso sistema. Em vez disso, ela forma um arco que o traz para perto do Sistema Solar interior. Em 26 de outubro, cruzará a eclíptica — o disco em que orbitam os planetas. Já em 8 de dezembro, vai atingir seu ponto mais próximo do Sol, o periélio, quando estará a 300 milhões de quilômetros da estrela.

Mesmo que a comunidade astronômica já esteja 100% certa se tratar do primeiro cometa interestelar a passar por essas bandas, a confirmação ainda não saiu. Quem tem a palavra final nessas questões é o Minor Planet Center, órgão oficial que cataloga dados sobre os parâmetros e as órbitas de asteroides e cometas. Se confirmado, o C/2019 Q4 (Borisov) vai ganhar um “2I” antes do nome, quase como um carimbo que atesta sua origem interestelar.

Antes dele, outro viajante cósmico roubou a cena mundo afora: o Oumuamua, detectado em outubro de 2017. Foi o primeiro objeto interestelar já registrado da história (o 1I), mas não era um cometa, e sim um asteroide. E também, sua passagem por aqui foi bem mais meteórica. Como os cientistas só o encontraram quando já estava de partida, tiveram só uma semana para estudá-lo. Com o Borisov, será diferente.

Haverá tempo de sobra para coletar dados de tudo que é tipo sobre ele. Telescópios no hemisfério norte poderão monitorá-lo até janeiro, e em seguida passarão o bastão para os instrumentos da metade sul do globo terrestre, que terão visibilidade até outubro de 2020. Toda a comunidade astronômica se mobiliza para estudar o visitante nos mínimos detalhes. Propostas de pesquisa são escritas aos montes, e muitos observatórios apontam para ele.

É que sua natureza volátil e brilhante faz do cometa um objeto interestelar bem mais interessante para a ciência do que um opaco asteroide. Conforme se aproxima do Sol, o calor evapora substâncias e forma a cauda, que já se estica por 150 mil quilômetros no espaço — maior que o diâmetro de Júpiter. Com todos esses elementos químicos borrifados aqui tão perto de nós, é possível estudá-los em um nível absurdo de detalhes.

Quando investigam outras estrelas, os cientistas até conseguem ter uma ideia de sua composição. Mas não é tão precisa. Karen Meech, astrônoma da Universidade do Havaí que está à frente dos principais estudos do Borisov até agora, explicou isso melhor ao Space.com. “Voltamos no tempo para ver o que aconteceu com o Sistema Solar ao olhar para os restos e pedaços de suas sobras — cometas e asteroides — e tentar juntar tudo.” 

Entre 8 e 10 de setembro, Meech e colegas foram os primeiras a fotografar o forasteiro, com um telescópio do Observatório Gemini, no Havaí. “Agora, convenientemente, nos deram um punhado de objetos que foram ejetados daqueles discos que podemos estudar de perto como fazermos no nosso sistema solar, é muito legal”, ela disse. Então se prepare para ouvir falar muito sobre o cometa que entrou de penetra. Ainda mais que o Oumuamua.


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