quinta-feira, 18 de março de 2021

Cientistas propõem guardar o DNA de 6,7 milhões de espécies na Lua

O apocalipse já foi assunto exclusivo da ficção científica (ou da Bíblia). Mas, com o aumento das temperaturas médias, do nível dos oceanos, da poluição e do desmatamento, a extinção de ecossistemas inteiros pela ação humana não só se tornou um horizonte realista como já está em andamento. Um grupo de engenheiros da Universidade do Arizona sugere se precaver construindo uma “arca” com sementes, gametas e outras amostras representativas de 6,7 milhões de espécies terrestres. 

A ideia é usar criogenia (temperaturas extremamente baixas) para preservar as amostras no subsolo. A Lua apresentava vulcanismo ativo há mais de um bilhão de anos, e a lava expelida acabou esculpindo passagens subterrâneas no satélite. É justamente nesses túneis que o depósito ficaria, abastecido por painéis solares na superfície. A proposta foi apresentada na Conferência Aeroespacial do Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos.

A ideia de construir uma “arca” de biodiversidade não é nova. O arquipélago de Svalbard, na Noruega, abriga o Silo Global de Sementes. O mega depósito funciona desde 2008 e guarda milhares de sementes de diferentes espécies de plantas. Mas nem ele está a salvo de algumas tragédias particularmente trágicas, como o aumento do níveis do mar ou o impacto de um asteroide.

Por isso, para o grupo de pesquisadores, o ideal é montar esse acervo biológico fora da Terra. A Lua foi a escolha mais óbvia por ser o corpo celeste mais próximo de nós, a apenas quatro dias de viagem. “É como copiar as fotos e documentos do seu computador para um disco rígido separado, então você tem um backup caso algo dê errado”, disse o pesquisador Jekan Thanga, chefe do Laboratório de exploração robótica espacial e terrestre (SpaceTREx) da Universidade do Arizona, à Live Science.

Mas que evento poderia ser tão dramático a ponto de dar reset o planeta? Os pesquisadores listaram alguns na apresentação do projeto: a erupção de um supervulcão, uma guerra mundial nuclear, o impacto de um asteroide, aceleração das mudanças climáticas, uma tempestade solar, uma seca global…

Esses cenários podem parecer pouco prováveis agora – mas, se pensarmos bem, poucas pessoas no início de 2020 acreditariam que estavam prestes a passar o ano trancadas em casa. Além disso, alguns eventos apontados pelos pesquisadores são graduais – como as mudanças climáticas, que já estão em curso. Quando eles alcançarem uma gravidade irreversível, pode ser tarde demais. 

Construção da base lunar

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O primeiro passo seria montar uma infraestrutura para abrigar as amostras genéticas. Os cientistas acreditam que ela poderá ser construída ao longo dos próximos 30 anos. O subsolo da Lua pode proteger a arca do impacto de meteoritos e de radiação capaz de danificar o DNA.

Mais de 200 tubos de lava, como são chamados os túneis naturais da Lua, são conhecidos desde 2013. A equipe de Thanga propõe mapeá-los usando robôs autônomos, que podem explorar essas imensas cavernas e avaliar quais têm o tamanho adequado para a construção da estrutura.

<span class="hidden">–</span>Universidade do Arizona/Divulgação

As amostras ficariam em câmaras a temperaturas entre 180 ºC e 196 ºC negativos. Para se ter uma ideia, a vacina da Pfizer exige uma refrigeração de 80 ºC negativos, e isso já gera um impasse tecnológico e logístico para muitos países, como o Brasil.

A temperaturas criogênicas, o desafio é ainda maior. Primeiro porque nenhum humano poderia entrar na câmara para mexer nas amostras: tudo precisa ser feito por um robô. Mesmo assim, há o risco das partes metálicas do robô congelarem ou se fundirem com o chão – um processo chamado de soldagem a frio.

A solução para isso seria uma espécie de levitação quântica. Nesse processo, um material supercondutor de eletricidade flutua sobre um ímã a uma distância e posição fixa. Esse fenômeno, velho conhecido dos físicos, só se manifesta no frio extremo. “É como se eles estivessem presos por uma corda, mas uma corda invisível”, diz Thanga em nota. Dessa forma, o robô poderia andar e mexer nas amostras sem tocar em nada. Não seria fácil aplicar a ideia na prática, mas o pesquisador aposta que a tecnologia para isso deve ser desenvolvida nos próximos anos, já que ela será necessária para outras empreitadas espaciais.

A equipe também calcula que seriam necessárias, no mínimo, 50 amostras de cada espécie para que elas possam ser reintroduzidas na natureza (é importante manter a diversidade genética). Isso significa pelo menos 250 viagens para transportar o DNA de 6,7 milhões de espécies – e nem estamos contando os materiais de construção da base. Para comparação, foram necessários 40 foguetes para construir a Estação Espacial Internacional.

Ainda há muito chão pra percorrer. Afinal, essa é só uma proposta de projeto apresentada recentemente à comunidade internacional. Porém, seja na Lua, seja em órbita, seja em outro planeta, não é má ideia a humanidade fazer um back up do planeta que tanto maltrata.

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