Por meio de observação empírica, o homem foi descobrindo, ao longo dos séculos, que alguns alimentos eram melhores do que outros para sua saúde e disposição. A capacidade de examinar e correlacionar a qualidade e a quantidade dos ingredientes com o bem-estar e a expectativa de vida permitiu inclusive iluminar o elo entre a dieta e o estado cardiovascular. E a ciência, claro, colocou tudo isso em outro patamar de confiança.
A soma das evidências dos estudos hoje permite que identifiquemos fatores de risco e a influência dos hábitos alimentares na saúde do coração. Isso nos dá a possibilidade de intervir mais precocemente, prevenindo eventos potencialmente fatais como infarto e derrame cerebral, e estender a longevidade.
Na realidade, as pesquisas nos mostram modelos de estilo de vida que não se resumem aos alimentos em si, mas contemplam também fatores culturais e geográficos. Um bom exemplo é a dieta mediterrânea. Pode até parecer simples, mas a estreita ligação entre cardápio e fatores socioeconômicos, religiosos e até climáticos torna difícil responder à pergunta: qual é a melhor dieta para o coração?
Amparados em estudos populacionais feitos ao longo das últimas décadas, assim como em pesquisas sobre as propriedades dos alimentos, chegamos a uma direção lógica que nos permite dar alguns conselhos gerais sobre o menu bem-vindo à longevidade cardiovascular. Esses conselhos convivem com uma profusão de outros indícios e mesmo modismos e atitudes radicais que nem sempre prezam pela saúde.
Em 2020, um importante estudo liderado por pesquisadores italianos, o Opera (Obesity Program of Education, Research and Assessment), reuniu evidências sobre quais grupos alimentares devem ser mais ou menos priorizados pensando na saúde do coração. Resumindo os achados, podemos dizer que esse trabalho pede para prestarmos atenção no seguinte:
Carboidrato: a redução de 20-25% na quantidade de carboidratos simples (arroz branco, macarrão, batata…) num período de seis meses ajuda a baixar os níveis de gordura no sangue, a pressão arterial e o peso corporal.
Gordura saturada: é a gordura da carne vermelha e de boa parte dos produtos industrializados. Ela aumenta as taxas do colesterol ruim (LDL), favorece o desenvolvimento do diabetes e eleva o risco de entupimento nos vasos sanguíneos, a despeito do peso.
Açúcar refinado: o risco de ter sobrepeso ou obesidade aumenta em cerca de 15% se você adicionar mais de uma colher de açúcar ao seu dia. Não deveríamos ingerir mais que 5 gramas do ingrediente. O abuso faz subir o peso e os níveis de triglicérides.
Fibras: pessoas que ingerem regularmente alimentos ricos em fibras, como frutas e verduras, apresentam uma redução de mais de 20% no risco de desenvolver doenças cardiovasculares. O aporte ideal de fibras promove maior eliminação do colesterol e inibe processos inflamatórios que agridem o corpo.
Ômega-3: a gordura poli-insaturada, que abunda em pescados de água fria, tem propriedades cardioprotetoras, entre elas diminuição do triglicérides e defesa anti-inflamatória do endotélio, a camada que reveste internamente os vasos.
Antocianinas: são compostos que conferem cor vermelha ou roxa aos vegetais (morango, uva, cereja etc.). Também estão relacionados a melhor controle das gorduras pela circulação.
Vitaminas: embora os estudos não sejam conclusivos, os cientistas italianos relatam benefícios das vitaminas C e E nesse contexto. Fornecidas por alimentos de origem vegetal, elas têm efeito antioxidante. Deficiências podem aparecer com o envelhecimento.
Juntando esses dados com outras pesquisas focadas na saúde cardiovascular, chegamos a alguns modelos de dieta que se mostram proveitosos para o coração. Eu destacaria:
Dieta mediterrânea: preza pelo consumo de frutas, legumes, verduras, cereais, azeite e peixes. E pede restrição a carne vermelha, gordura saturada e açúcar refinado. Tem resultados contra obesidade, diabetes, pressão e colesterol altos. As sociedades americana e europeia de cardiologia defendem fortemente a implementação desse cardápio como forma de prevenir problemas cardiovasculares.
Dash (Dietary Approaches to Stop Hypertension): traduzindo do inglês, é uma dieta criada para controlar a hipertensão. Foca nos vegetais e promove redução no consumo do sal. Ao baixar a pressão arterial, ajuda a afastar perigos como infarto e AVC.
Dieta vegetariana: não se pode questionar seu valor para o coração. Um estudo da Universidade de Oxford, na Inglaterra, mostra que ela reduz em até 30% os eventos cardiovasculares. Mas o ideal é individualizar a adoção do cardápio, e contar com orientação especializada, a fim de ponderar e evitar carências nutricionais.
Outras dietas, como a cetogênica, vêm recebendo atenção dos cientistas nos últimos tempos — nesse caso, a combinação do teor elevado de gorduras e baixo consumo de carboidratos parece contribuir para controle do peso e dos níveis de lípides no sangue. E vamos aguardar o que estudos mais longos e robustos têm a nos dizer a respeito.
De um modo geral, fica claro que existem modelos dietéticos capazes de resguardar a saúde cardiovascular. No entanto, devemos ter em mente que a dieta isolada não garante o sucesso da empreitada. Cada pessoa tem particularidades genéticas e diferentes necessidades do ponto de vista energético e nutricional. Além disso, outros elementos do estilo de vida contam pontos.
No mundo ideal, personalizaríamos os ajustes na alimentação de cada um. Mas, se me perguntarem com qual dieta eu fico pensando no coração, juntando os dados da literatura médica com a experiência profissional, eu diria que a dieta mediterrânea é um ótimo modelo. E, para que ela traga bons resultados, não devemos descuidar do acompanhamento médico, da atividade física e de outros itens que compõem um estilo de vida saudável.
* Edmo Atique Gabriel é cardiologista e cirurgião cardíaco, professor universitário e palestrante
Qual é a dieta que mais faz bem ao coração? Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br
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