Quando o glifosato chegou ao mercado, na década de 1970, foi apresentado como um herbicida universal. Matava tudo, e por isso era usado só para limpar o terreno, eliminando as pragas, antes do plantio. Mas a Monsanto (criadora do produto) desenvolveu versões transgênicas da soja, do milho e do algodão, que são imunes ao glifosato – e aí ele começou a ser aplicado também durante o cultivo dessas plantas.
Virou o agrotóxico mais usado do mundo. Mas isso teve uma consequência: começaram a surgir pragas resistentes. Cientistas da Embrapa detectaram mais uma: o picão-preto, que ataca a soja – e, graças a uma mutação, criou resistência ao glifosato. Conversamos com o agrônomo Fernando Adegas, um dos autores da descoberta (1), para entender a razão.
Por que as pragas criaram resistência?
É um processo de seleção de plantas que já existiam na natureza. Com o uso contínuo do glifosato, nós fomos eliminando as plantas que eram sensíveis a ele. Isso ocorre com todos os herbicidas, infelizmente.
A mutação do picão-preto foi consequência de uso incorreto do glifosato?
Não houve uma rotação de produtos [alternância do glifosato com outros], e por isso ocorreu essa seleção. A diversificação é fundamental na agricultura.
O picão-preto afeta a soja, cultura que mais utiliza o glifosato. Quais consequências a praga pode ter no Brasil?
O picão já está disseminado pelo país todo. Ele foi a primeira planta a se tornar resistente a outros herbicidas também. Essa população [variante resistente ao glifosato] foi encontrada numa lavoura de soja com milho, e pode afetar o algodão também. O potencial [da praga] é muito alto.
Se o agricultor detectar a nova praga, o que ele deve fazer?
A primeira coisa é tentar evitar que ela se espalhe. A disseminação provavelmente vai ser por máquinas agrícolas, [então] tem que fazer um sistema de contenção. Também deve utilizar produtos alternativos ao glifosato e adotar boas práticas agrícolas, com rotação de culturas.
A Europa tem debatido a proibição do glifosato, devido às possíveis consequências para a saúde. Na sua opinião, isso seria viável no Brasil?
É uma pergunta difícil. Mas eu não imagino a agricultura tropical sem o glifosato. Nossos sistemas de produção são mais intensivos, temos duas safras por ano, e uma variedade de plantas daninhas muito grande. O que a gente deve fazer é utilizar [o produto] com mais racionalidade, diversificar um pouco mais.
Fonte 1. Novo caso de resistência de planta daninha ao glifosato no Brasil: picão-preto (Bidens subalternans). F Adegas e outros, 2023.
Praga desenvolve resistência ao glifosato Publicado primeiro em https://super.abril.com.br/feed
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