segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

Antonov-225, destruído na Ucrânia, nasceu para carregar ônibus espacial soviético

No último domingo (27), o Antonov-225, maior avião do mundo, foi destruído após um incêndio provocado por um ataque russo no aeroporto de Hostomel, cidade próxima à capital da Ucrânia, Kiev.

A informação foi dada pela Ukroboronprom, fabricante de armas estatal ucraniana (e responsável pela Antonov Company). Também foi confirmada pelo ministro das relações exterior do país, Dmytro Kuleba. A aeronave estava parada em Hostomel desde quinta-feira (24) para efetuar reparos em um dos motores.

A Ukroboronprom afirmou que serão necessários US$ 3 bilhões para reconstruir o avião, o que pode demorar até cinco anos. Em comunicado, a empresa defendeu que a Rússia é quem deve arcar com todo esse custo.

O Antonov-225 (ou An-225) era capaz de levantar 250 toneladas de carga. Tinha 84 metros de comprimento e 88,4 m de envergadura (a distância de uma ponta da asa para outra). As asas, inclusive, possuíam 950 m2 de área. De altura, media 18,2 m – o equivalente a um prédio de seis andares.

Era um gigante. Um gigante filho da Guerra Fria.

Carregador de piano

A história do An-225 começa em 1981. Em 12 de abril daquele ano, os Estados Unidos lançaram o ônibus espacial Columbia de Cabo Canaveral, na Flórida. Impulsionado por foguetes e reutilizável, o Columbia deu início a uma nova era da exploração espacial – e a União Soviética não poderia ficar para trás.

A URSS tratou de construir o seu próprio ônibus espacial. Ele foi batizado de Buran (“nevasca”, em russo) e era bem parecido com o Columbia. Já o foguete que o levaria ao espaço recebeu o nome Energia.

Mas havia um problema. O Buran foi construído em uma base nos arredores de Moscou, mas o Cosmódromo de Baikonur, a importante estação de lançamento soviética e de onde o ônibus decolaria, ficava a 2090 quilômetros dali, no Cazaquistão. Como levá-lo até lá?

A solução mais viável era pelo ar. Engenheiros soviéticos, então, contataram a Antonov Company, fundada em Kiev em 1946 por Oleg Antonov e especializada em aviões de grande porte. O objetivo era construir um cargueiro que realizasse as idas e vindas do Burian, tanto na fase de testes quanto depois que ele começasse a operar em missões.

A base do An-225 foi um modelo já em atividade, o An-124, lançado em 1982 e capaz de levar 150 toneladas de carga. Ao An-225 foram adicionados dois motores extras, totalizando seis – o único avião do mundo a ter essa quantidade. A aeronave pesava 175 toneladas e tinha 32 rodas.

O primeiro voo do An-225 aconteceu em 21 de dezembro de 1988. Durante a cerimônia de inauguração, ele entalou momentaneamente no hangar em que estava. O avião foi batizado como Mriya, que em ucraniano significa “sonho”. Foi a primeira aeronave soviética a receber um nome nesse idioma.

O Mriya realizou uma dúzia de voos teste com o Buran (havia duas pequenas “corcovas” na parte de cima do avião para segurar o ônibus espacial), e a dupla foi uma das principais atrações em 1989 durante o Show Aéreo de Paris, a maior feira de aviação do mundo. Mas o projeto não durou muito. Com o fim da União Soviética, em 1991, o programa foi cancelado.

<span class="hidden">–</span>picture alliance/Getty Images

Nos anos seguintes, diferentes propostas foram feitas para aproveitar o An-225. Uma delas transformaria o grandalhão em um hotel voador, com direito a piscinas e capacidade para 1,5 mil pessoas. Não rolou: o Mriya foi desmontado e guardado em um hangar por quase uma década.

Continua após a publicidade

No início dos anos 2000, a Antonov Company percebeu que a demanda para grandes cargas crescia a ponto de o An-124 não conseguir atender a algumas delas. Foi quando eles decidiram revitalizar o An-225 e colocá-lo para jogo.

Segundo a empresa, o avião quebrou 124 recordes em seu voo de retomada, incluindo o de maior carga transportada pelo ar (250 toneladas). Coincidentemente, o voo aconteceu no dia 11 de setembro de 2001.

Manual de instruções

O An-225 transportava diversos tipos de carga: turbinas, veículos, máquinas de construção, turbinas, trens Maglev (de levitação magnética) e aeronaves de pequeno porte. A carga mais comum eram geradores elétricos.

Feito na URSS dos anos 1980, o An-225 ainda guardava muitos comandos analógicos. Pela sua idade (e tamanho), não era tarefa fácil operá-lo – só seis pilotos eram autorizados a fazer isso. Além disso, reparos precisavam ser feitos constantemente, inclusive durante as entregas. Não à toa, vários cabos e componentes internos do avião ficavam expostos para facilitar a manutenção.

A tripulação do Mriya era composta por seis pessoas: um piloto, um copiloto, dois engenheiros, um especialista em navegação e outro em comunicação. Isso sem contar dezenas de funcionários e supervisores que acompanhavam o carregamento e descarregamento de carga.

O An-225 realizava 20 voos por ano, em média. Isso porque toda viagem requeria semanas de planejamento envolvendo aeroportos, equipes de logística e a empresa responsável pela carga. Às vezes, era preciso levar, de Kiev, um caminhão reboque de quase 450 cavalos para manobrar o Antonov na pista certos aeroportos não tinham reboques potentes o suficiente.

As cargas entravam e saiam pela frente do avião. O nariz do An-225 levantava e uma enorme rampa descia, como uma língua. Era um processo lento e barulhento, acompanhado minuciosamente por trabalhadores na pista qualquer desnivelamento na rampa poderia comprometer o transporte.

O An-225 Mriya no Aeroporto de Viracopos em Campinas-SPRicardo Matsukawa/VEJA/Divulgação

O An-225 tinha capacidade para 330 toneladas de combustível, e queimava 20 toneladas por hora (e você reclamando do seu carro). Os motores demoravam até quatro minutos para ligar completamente. Ele tinha uma autonomia de 15,4 mil quilômetros e atingia 800 km/h.

Em abril de 2020, o Antonov carregou 100 toneladas de equipamentos de proteção contra a Covid-19 da China para a Polônia. Não fosse o ataque russo, ele continuaria em operação pelos próximos 25 anos.

De passagem

O An-225 esteve duas vezes no Brasil: em 2010 e 2016. Na última visita, ele passou pelos aeroportos de Viracopos, em Campinas, e o de Guarulhos, antes de seguir para o Chile.

Em Campinas, o avião recebeu um suporte de 30 toneladas para a carga que o esperava em Guarulhos: um gerador de 150 toneladas. Dezenas de pessoas acompanharam os pousos e decolagens do grandalhão.

Com a destruição do An-225, o maior avião cargueiro passa a ser o Boeing 747-8F, com capacidade de 132,6 toneladas. Ele tem 76,3 m de comprimento e 68,4 m de envergadura. Mas ele não ganha do Airbus A380, que não possui versão cargueiro e é o maior avião comercial do mundo: são 72 m de comprimento e 79 m de envergadura.

Isso até reformarem o Mriya – o que permanece incerto. Há ainda um segundo An-225, feito durante a Guerra Fria. Todas as suas peças foram construídas e guardadas, mas ele nunca foi montado.

Compartilhe essa matéria via:
Continua após a publicidade

Antonov-225, destruído na Ucrânia, nasceu para carregar ônibus espacial soviético Publicado primeiro em https://super.abril.com.br/feed

Leucemia: o que é, causas, sintomas, diagnóstico e tratamento

O que é a leucemia?

Primeiro, é preciso entender que quem fabrica as nossas células sanguíneas é a medula óssea. E esse tipo de câncer ocorre quando essa produção sai do controle, levando a uma quebra no equilíbrio especificamente dos glóbulos brancos no sangue.

Existem diferentes versões de leucemia. Os grupos principais são divididos pela gravidade – crônica ou aguda – e pelos tipos de glóbulos brancos afetados – linfoides ou mieloides –, gerando as seguintes combinações:

+ Leucemia linfoide crônica (LLC), que costuma acometer gente com mais de 55 anos
+ Leucemia mieloide crônica (LMC), mais comum em adultos
+ Leucemia linfoide aguda (LLA), a versão mais prevalente em crianças, mas pode atingir adultos
+ Leucemia mieloide aguda (LMA), que pode ocorrer em crianças e adultos, mas é mais observada em idosos

“A grosso modo, a divisão mais clássica é entre crônica e aguda, mas, hoje, há inúmeros subtipos que servem para guiar o médico rumo o tratamento mais eficaz”, esclarece Breno Gusmão, onco-hematologista e integrante do Comitê Médico da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale).

Compartilhe essa matéria via:

O número de casos novos de leucemia esperados para o Brasil para cada ano do triênio 2020 – 2022 é de 5 920 em homens e de 4 890 em mulheres — valores que correspondem a um risco estimado de 5,67 casos novos a cada 100 mil homens, e 4,56 para cada 100 mil mulheres.

A taxa de letalidade da doença é de 40%, segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca).

O que causa a leucemia?

Há uma lista de coisas que podem desencadear esse tipo de câncer, mas não existe uma relação de causa e efeito tão direta como ocorre com o tabagismo e o câncer de pulmão, por exemplo.

Por falar em cigarro, vale pontuar que ele tem uma conexão com a leucemia mieloide aguda – inclusive, é o único fator que pode ser evitado.

“Estar exposto ou manipular pesticidas, agrotóxicos, derivados do petróleo ou viver em zonas radioativas são causas mais frequentes da doença. Lembrando que esses níveis de toxicidade não chegam ao consumidor comum”, relata Gusmão.

A doença não é hereditária, mas há casos de eventos genéticos, que são raros.

E, infelizmente, o tratamento de outro tipo de câncer pode acabar prejudicando a produção de células sanguíneas. “A quimioterapia e radioterapia usam compostos químicos capazes de afetar o DNA de algumas células, gerando leucemias. É uma contradição, mas pode ocorrer”, informa o médico.

Quais são os sintomas da leucemia?

Infecções graves recorrentes, anemia, cansaço, palidez, falta de energia, hemorragia na gengiva, sangue na urina e hematomas pelo corpo são possíveis sinais da leucemia.

“O sangue é formado por glóbulos brancos, glóbulos vermelhos e plaquetas. Como a leucemia é uma doença do sangue, se uma das células não exercer a sua função adequada vai, rapidamente, interferir no trabalho da outra”, relata o médico.

Entender esse caminho é importante para não chegar a confusões, como a de achar que a anemia pode evoluir para uma leucemia. Na verdade, é o contrário. Como citamos, a anemia pode ser um indício da leucemia.

Principais sintomas

  • Palidez
  • Cansaço
  • Palpitação
  • Aumento de gânglios
  • Infecções persistentes ou recorrentes
  • Hematomas, manchas avermelhadas que não doem e sangramentos inexplicados
  • Aumento do baço e do fígado
  • Anemia
  • Fraqueza
  • Sangramentos nasais e nas gengivas
  • Gânglios inchados (na região do pescoço e nas axilas)
  • Febre
  • Sudorese noturna
  • Dores nos ossos e nas articulações
  • Perda de peso sem motivo aparente

Os sintomas no público infantil são semelhantes, mas, segundo levantamento da Abrale, nesses casos as queixas mais comuns são febre, cansaço excessivo, dor das juntas e hematomas.

Continua após a publicidade

Diagnóstico

A investigação costuma demorar um pouco mais porque o médico que dará a palavra final é o hematologista.

Como as pessoas costumam fazer exames rotineiros com profissionais de outras especialidades (cardiologistas, ginecologistas e urologistas, por exemplo), é preciso que esses médicos desconfiem da doença para fazer o encaminhamento correto.

Um exame simples de sangue – pedido em qualquer check-up – já pode dar uma pista de que algo não anda tão bem. Para ter ideia, um hemograma alterado pode indicar um aumento do número de leucócitos associado ou não à diminuição das hemácias e plaquetas, mas outros detalhes técnicos também são avaliados pelo médico.

A confirmação só vem mesmo a partir de um exame da medula óssea, o mielograma – em que se retira sangue de dentro do osso para analisar as células mais de perto. Em alguns casos, é feita a biópsia da medula óssea.

Principalmente quem recorre ao sistema público de saúde (e tem que enfrentar uma espera considerável para o agendamento de consultas) pode receber um diagnóstico tardio, complicando a próxima fase: o tratamento.

De acordo com levantamento da Abrale, pelo menos 1/3 dos indivíduos com leucemia demoraram um mês para descobrir a doença. Cerca de 7% chegaram a aguardar um ano para a confirmação, segundo dados de uma pesquisa com pacientes de diversos tipos de leucemia, em 2019.

Tratamento

Gusmão conta que o destrinchamento dos tipos de leucemia permite maior personalização nesse momento. O médico defende inclusive que o Fevereiro Laranja deve ser utilizado para disseminar uma informação mais otimista sobre a doença. “Temos mais ferramentas que podem dar qualidade de vida e chance de cura a esses pacientes”, relata.

De fato, graças a muitas pesquisas e ao avanço da tecnologia, o arsenal terapêutico disponível hoje está tornando o tratamento menos duro e mais eficiente.

Para alguns casos, já há tratamentos medicamentosos. Em outras circunstâncias, associa-se a quimioterapia aos remédios. As soluções dependem do quadro de cada paciente.

Um desafio que ainda fica é o acesso – principalmente quando se fala em opções mais inovadoras. Tudo é muito caro e pouco disponível, seja no sistema público como no privado.

+ LEIA TAMBÉM: Doação de medula óssea: os bancos precisam de jovens adultos

O mesmo levantamento da Abrale revela que muitos pacientes conseguiram medicamentos pagando do próprio bolso ou após entrar com uma ação judicial.

“O Brasil não acompanha a evolução da tecnologia, mas iniciativas como o Estatuto do Câncer e um projeto de lei que pede pela químio oral são a esperança para mudar esse cenário”, analisa o oncologista.

A quimioterapia oral é indicada para alguns casos de câncer, como de pulmão, rins, próstata, entre outros.

O transplante de medula óssea é outra saída tanto para as leucemias agudas quanto para as crônicas. Contudo, só é indicado em situações específicas – como quando o paciente não responde bem ao tratamento convencional. Entenda como ele funciona aqui.

Continua após a publicidade

Leucemia: o que é, causas, sintomas, diagnóstico e tratamento Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br

Epidermólise bolhosa: doença rara ganha protocolo; implementá-lo é desafio

A data escolhida para celebrar os pacientes raros é 29 de fevereiro, um dia que também é raro. Nos anos não bissextos, a comemoração acontece no 28 de fevereiro. É essencial falar e dar visibilidade a esses indivíduos. Quanto mais se conhece a diversidade humana, mais somos capazes de conviver e lidar com as diferenças. Um diagnóstico raro não é o fim de uma vida.

No mundo, estima-se que aproximadamente 300 milhões de pessoas tenham doenças raras – no Brasil, são cerca de 13 milhões. Precisamos entender as dificuldades desse grupo, mas, acima de tudo, procurar desenvolver políticas públicas voltadas a essas doenças.

A epidermólise bolhosa

Trata-se de um exemplo de doença genética, rara e ainda sem cura, com diferentes tipos de severidade. No geral, a pele do paciente é tão fina que qualquer tipo de contato já é capaz de provocar lesões. Como as crianças já nascem com a epidermólise bolhosa (EB), a fase de recém-nascido acaba sendo especialmente crítica.

Em dezembro de 2021, após longo e extenso trabalho, a Conitec/Ministério da Saúde aprovou o PCDT – Protocolo de Diretrizes Clínicas para a Epidermólise Bolhosa. Sem dúvidas, é um avanço sem precedentes para uma doença rara no Brasil, em especial para a epidermólise bolhosa.

De forma prática, ele estabelece o que podemos chamar de um guia de conduta para o tratamento dos pacientes com essa doença. Em um país de extensão continental, e com tanta disparidade socioeconômica, isso é um ato de respeito às pessoas e famílias com EB.

+ Leia também: Teste do pezinho agora é ampliado

Importante salientar que não falamos de uma padronização. Afinal, defendemos veementemente que cada pessoa com EB requer um tratamento específico, já que ele deve levar em conta questões como evolução clínica, tipo da doença, severidade, adaptação ao material usado, entre outras.

Ou seja, não se trata de ter todos os medicamentos para todas as pessoas com EB, e sim aquilo que for necessário para cada indivíduo.

Continua após a publicidade

O tratamento da epidermólise bolhosa não se baseia em um único medicamento de alto custo. Na verdade, ele depende de curativos especiais de uso constante e diário, além de manejo das bolhas e feridas.

Assim, ter os materiais e medicamentos na quantidade e qualidade especificadas e na hora certa são os fatores de sucesso para a conduta nessa doença.

Compartilhe essa matéria via:

Dificuldades na implementação do protocolo

A principal é fazer as diretrizes chegarem nas pontas, isto é, nos estados e municípios. As pessoas com EB não devem se deslocar em busca do tratamento, e sim o tratamento chegar nas cidades em que elas vivem.

Como destacado, trata-se de uma conduta diária para melhoria de qualidade de vida desses pacientes. Porém, como o protocolo foi aprovado recentemente, as cidades ainda não sabem direito como agir.

Em paralelo, muitas famílias estão procurando seus direitos nas unidades de atendimento e, claramente, não estão sendo atendidas. Tanto por causa do desconhecimento dos agentes públicos sobre o assunto como também pela falta de um processo de acolhimento aos casos raros – problema crônico para vários pacientes, não somente para aqueles que sofrem com a EB.

Precisamos romper a burocracia dos processos novos e garantir a alocação de recursos da saúde para doenças raras. Esse é o grande desafio que temos pela frente em relação ao tratamento da epidermólise bolhosa e de tantos outros quadros.

*Leandro Rossi é administrador de empresas e presidente da Debra Brasil, sociedade civil sem fins lucrativos que integra a rede da Debra International, principal entidade global no tratamento da epidermólise bolhosa

Continua após a publicidade

Epidermólise bolhosa: doença rara ganha protocolo; implementá-lo é desafio Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br

domingo, 27 de fevereiro de 2022

Depressão em idosos piorou em tempos de pandemia

Já se passaram quase dois anos desde que a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou a pandemia de Covid-19, em 11 de março de 2020.

Desde então, enfrentamos diversas batalhas, mas algo se manteve como uma constante: a vulnerabilidade das pessoas mais idosas frente não apenas à doença em si, mas também aos seus impactos socioeconômicos.

Segundo dados da última Pesquisa Nacional de Saúde, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2019, a população entre os 60 e 64 anos já era considerada a mais afetada pela depressão — para ter ideia, ela atinge 13% dos idosos.

Dentre os principais motivos para isso podemos citar o temido abandono familiar bem como os sentimentos de inutilidade e falta de propósito que a aposentadoria pode ocasionar.

Com a pandemia, o cenário apenas piorou. Isolamento social, medo, luto, estigma e insegurança (inclusive alimentar e econômica) fizeram com que muitos idosos tivessem a saúde mental afetada, trazendo à tona mais casos de depressão e ansiedade.

+ LEIA TAMBÉM: Idosos que mantém cérebro ativo podem adiar em cinco anos o Alzheimer

Por isso, é importante estar atento aos sintomas. Mudanças no comportamento do idoso podem ser um sinal de alerta. Além de bagunçar o sono e o apetite, a depressão é capaz de levar a alterações cognitivas, como dificuldade de raciocínio, perda de memória e falta de concentração.

Desânimo e tristeza, dor no corpo, acessos de raiva, sentimento de culpa e autodesvalorização, apatia e pensamentos negativos também merecem um olhar atento.

Continua após a publicidade

Caso identifique desajustes assim, não hesite em procurar ajuda profissional. Além de conversar com um geriatra, a terapia com psicólogos especializados em idosos pode ser bem indicada. A depressão é uma doença séria, mas que pode ser tratada.

Como prevenir e tratar a depressão em idosos?

Manter hábitos saudáveis é fundamental tanto para a saúde física como para a mental. É essencial que o idoso tenha uma alimentação rica em nutrientes, com boas gorduras, proteínas, vegetais.

Compartilhe essa matéria via:

Ainda tem que ter muita água para estar sempre bem hidratado. Tomar sol e produzir vitamina D é outra dica valiosa – por isso, incentive o idoso a se expor ao sol diariamente, por pelo menos 15 minutos, mas evitando o horário das 10 às 16 horas.

Ser uma pessoa ativa também pode ajudar. Estimule a realização de atividades físicas mesmo dentro de casa. Fora isso, apresente a ele algum hobby, como palavras-cruzadas, jogos ou leitura. Esses estímulos auxiliam a preservar a cognição.

Mas é preciso pensar também na questão emocional: procure estar presente. Ainda que não seja possível fisicamente, utilize videochamadas e telefonemas.

A velhice realmente traz seus desafios. Só que, assim como a pandemia, eles podem ser superados.

Continua após a publicidade

Depressão em idosos piorou em tempos de pandemia Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

Zoom: lá do fundo para o mundo

Diante de uma longa pandemia viral e uma gripe fora de época, os sistemas imune e respiratório de muitos cidadãos não tiveram férias nem tréguas. Haja muco para ajudar a limpar as vias aéreas!

E, se não bastasse, ainda vêm as bactérias oportunistas, como as que aparecem nesta amostra de escarro da imagem. Emprego não falta, pelo menos para nossas defesas.

+ 5 mililitros de muco são suficientes para um teste de cultura de escarro, que avalia infecções respiratórias.

+ 20 bilhões de partículas estranhas (poluentes, pólen, micróbios…) são inaladas, em média, por alguém que mora num centro urbano.

Continua após a publicidade

Zoom: lá do fundo para o mundo Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br

Fibromialgia: onde estamos e para onde escolhemos ir

A fibromialgia é uma síndrome que se caracteriza por dor crônica difusa ou migratória pelo corpo, acompanhada de um conjunto de distúrbios funcionais. A conversa com o médico e o exame físico são a base para o diagnóstico e a avaliação de sua gravidade − não há exames subsidiários específicos até o momento.

O problema não tem causa definida, mas depende de fatores físicos, emocionais, genéticos, hormonais, infecciosos, traumáticos, entre outros.

Frente a uma variedade de estímulos, experiências e lesões, o sistema nervoso pode formar e reorganizar conexões entre os neurônios, no cérebro e na medula espinhal, alterando os mecanismos de estímulo ou supressão da dor.

É isso que está por trás da chamada nociplástica, um mecanismo que, explicando de modo simplificado, eleva a percepção das dores sem que haja danos nos tecidos ou ativação dos receptores no local. 

A avaliação médica compreensiva é fundamental, enquanto os exames complementares servem para diferenciar o quadro de outras enfermidades ou para investigar doenças coexistentes, que atuam como desencadeantes, agravantes ou perpetuantes da dor.

+ Leia também: A fisioterapia no controle das dores da fibromialgia

Sabemos que a coleta e a interpretação dos dados dos pacientes podem ser desafiadoras nesse contexto, mas deixar de diagnosticar a fibromialgia ou atribuir qualquer queixa a um mero rótulo são falhas com várias consequências negativas. Daí a importância de consultar um profissional com a devida formação na ciência das dores.

Um vasto repertório de queixas costuma ser relatado por quem convive com a fibromialgia. Elenco algumas delas:

  • Indisposição
  • Sono não restaurador
  • Ansiedade e depressão
  • Constipação e diarreia
  • Intolerância a ruídos altos, baixas temperaturas e luz ou cheiro intenso
  • Dificuldade de concentração e memória
  • Desequilíbrio físico
  • Bexiga irritável
  • Bruxismo

Diante disso, os pacientes comumente passam por vários médicos e exames, cultivando medos e frustrações. O receio de que uma doença grave venha trazer sequelas ou ameaça à vida também se vê com frequência, por isso é importante esclarecer prontamente que a fibromialgia não oferece esses riscos.

Compartilhe essa matéria via:

A identificação do contexto familiar, social e laboral, bem como das demandas, expectativas e conflitos que a pessoa vivencia, é crucial para planejar o tratamento.

Continua após a publicidade

Sintomas que se arrastam por anos, perdas e rejeições provocam crenças distorcidas e comportamentos que reduzem a capacidade de enfrentamento da condição.

Vários “tratamentos mágicos” proliferam sem evidência científica, causando atrasos, gastos e decepções.

Quanto mais precoce for o diagnóstico, seguido de uma abordagem ampla e individualizada, maiores as chances de diminuir ou interromper o sofrimento. Isso mostra a relevância da parceria entre o paciente, seu médico e outros profissionais da saúde envolvidos.

O tratamento não farmacológico é indispensável; sem ele, o progresso é limitado e fugaz. Os exercícios físicos são eficientes contra diversas queixas e devem ser orientados conforme a aptidão física, com progressão suave e segurança, tornando-se um hábito. Atividades de lazer, higiene do sono, apoio da rede sociofamiliar e suporte psicológico também fazem diferença.

+ Leia também: Vem aí um colchão ideal para quem tem fibromialgia

Poucos medicamentos são aprovados especificamente (em bula) para fibromialgia, mas várias drogas – entre antidepressivos, anticonvulsivantes, relaxantes musculares, analgésicos e outros – podem ser estrategicamente associadas para enfrentar o quadro.

Certamente, há demandas não atendidas na fibromialgia, como medidas mais objetivas da gravidade dos casos e medicações mais efetivas. Mas precisamos fazer bom uso das soluções e alternativas já disponíveis e distinguir os papéis de cada uma delas nessa empreitada.

A sociedade como um todo deve romper os preconceitos diante das pessoas com qualquer tipo de dor crônica e expandir sua capacidade de acolhimento. Valorizar a assistência à saúde de qualidade passa por reconhecer os recursos humanos e investir neles. 

Os pacientes, por sua vez, devem se empenhar no autoconhecimento e nas mudanças no estilo de vida. E os profissionais precisam enxergar o convite oferecido pela fibromialgia para serem mais inteiros e humanos ao lidar com o sofrimento do outro. Dessa maneira todos sairemos melhores.

* Marcos Renato de Assis é reumatologista, doutor em reabilitação pela Unifesp e membro da Sociedade Paulista de Reumatologia (SPR)

Continua após a publicidade

Fibromialgia: onde estamos e para onde escolhemos ir Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br

Terapia revolucionária contra o câncer é aprovada no Brasil

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a primeira terapia CAR-T no Brasil. Trata-se de uma técnica inovadora, que reprograma as células do sistema imune para que elas sejam capazes de detectar e destruir o câncer

A terapia, já em uso há algum tempo na Europa e nos Estados Unidos, será trazida ao Brasil pela farmacêutica Novartis. É considerada revolucionária não apenas pelo seu modo de ação, que explicaremos mais abaixo, mas também pelo alto índice de sucesso – em alguns casos, até 50% dos pacientes são curados

“Ela oferece uma esperança para tipos de câncer sanguíneos agressivos, que não responderam a outros tratamentos, em um cenário onde a expectativa de vida é de meses”, aponta o onco-hematologista Jayr Schmidt Filho, líder do Centro de Referência de Neoplasias Hematológicas do A.C. Camargo Cancer Center, em São Paulo.

Por aqui, será indicada para dois tumores sanguíneos: leucemia linfoblástica de células B entre crianças e adultos de até 25 anos; e linfoma difuso de grandes células B entre adultos.

Em ambos os cenários, funcionará como uma terceira linha de tratamento – ou seja, quando dois outros métodos, como quimioterapia e transplante de medula, já falharam. 

+ Leia também: Os principais avanços no tratamento de leucemias, linfomas…

Mas a expectativa é que, com o tempo, a abordagem comece a ser usada mais cedo. “As terapias disponíveis hoje contra essas doenças não são tão boas, então se espera que, em breve, essa indicação não seja só para casos avançados, mas também para os mais iniciais”, aponta o hematologista Marco Aurélio Salvino, professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA)

O problema é o preço. Embora o valor ainda não esteja estabelecido por aqui, lá fora o tratamento sai por cerca de 300 mil dólares.

Ou seja, estamos falando provavelmente de milhões de reais por indivíduo tratado no Brasil. “A CAR-T é inovadora, curativa, mas a sustentabilidade será um grande desafio para as operadoras de saúde e para o sistema público”, comenta Schmidt. 

Como a CAR-T funciona 

O método é considerado uma mistura de terapia celular (como as de células-tronco), imunoterapia (pois usa as defesas do próprio corpo) e terapia gênica (que envolve algum tipo de interferência no código genético). “Chamamos de droga viva”, resume Salvino. 

Nesse esquema, os linfócitos T, células que fazem parte do nosso sistema imunológico, são extraídos do corpo e passam por um processo de engenharia genética por meio de um vetor viral. 

Traduzindo: um vírus criado em laboratório, incapaz de provocar doenças, viaja até o núcleo da célula e insere uma nova informação no DNA. É como um manual de fabricação para que a célula instale um detector em sua superfície, capaz de reconhecer os linfócitos B, a linhagem de células atingidas pelo câncer.

+ Leia também: A revolução genética

A célula “turbinada” é, então, devolvida ao corpo do paciente. “A partir daí, passa a atacar as células doentes quase instantaneamente ”, aponta Schmidt. O esquema funciona bem, por isso anima tanto os médicos.

Continua após a publicidade

“Além do fato de apresentar uma taxa de eficácia muito superior em casos refratários, a CAR-T tem um potencial de ser um tratamento menos tóxico, pois usa as células da própria pessoa, diferente da quimioterapia, por exemplo”, destaca Salvino. 

Compartilhe essa matéria via:

Mas há alguns cuidados – até por conta disso a aplicação ocorrerá em centros que passarem por uma qualificação complexa. Um dos pontos principais é que, justamente por gerar uma resposta imune tão rápida, pode acontecer uma tempestade inflamatória como a da Covid-19.

“Existe ainda o risco de alterações neurológicas, mas são eventos manejáveis e transitórios. Só é necessário ter uma equipe bem treinada para atender esse paciente. Em outros países, ela é aplicada desde 2017 de maneira segura, com protocolos bem claros de tratamento”, pontua Schmidt. 

Logística delicada 

Para que todo o processo dê certo, a célula é retirada em um esquema parecido com o de uma hemodiálise. Os linfócitos T são separados enquanto o sangue passa por uma máquina e as células extraídas são congeladas.

Dos centros brasileiros, elas vão para fábricas na Europa ou nos Estados Unidos, onde são preparadas e recongeladas. O vai e volta demora cerca de um mês, mas a aplicação em si é rápida: basta uma sessão de infusão intravenosa e pronto. Depois, são mais alguns dias de internação para acompanhar possíveis reações adversas

Enquanto espera por suas células turbinadas, a pessoa pode precisar de quimioterapia para conter o avanço da doença – o quadro costuma evoluir rapidamente. 

+ Leia também: A jornada de quem tem leucemia

O CAR-T brasileiro 

O tratamento ainda não passou pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED). Mas, dada a sua complexidade, deve chegar ao país na casa dos milhões de reais, como as outras terapias gênicas.

A Novartis não tem planos de fazer a manipulação das células aqui, mas o Brasil tem a sua própria tecnologia CAR-T, desenvolvida no Centro de Terapia Celular da Universidade de São Paulo (CTC-USP), em Ribeirão Preto/SP. A produção nacional é mais barata pois não depende de alguns processos da indústria. 

Em 2019, os pesquisadores de lá chegaram a curar um homem de 61 anos com linfoma em fase terminal. O laboratório foi reformado e os estudos de fase 1 e fase 2, que testam segurança e eficácia, estão em andamento. 

Mas, para que uma versão brasileira mais acessível seja viável, será preciso pular o muro da academia. “Eles têm toda a expertise, mas em âmbito experimental, dificilmente uma universidade consegue fazer isso em larga escala”, comenta Schmidt. 

Ou seja, depende do interesse tanto da indústria quanto do governo. É bom trazer esse debate à tona. Com a chegada de mais e mais terapias gênicas revolucionárias (mas que custam milhões de reais) para doenças raras, precisamos pensar em como fazer para que mais pessoas se beneficiem delas. 

Continua após a publicidade

Terapia revolucionária contra o câncer é aprovada no Brasil Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br

Comprometimento cardiovascular não contraindica vacina da Covid-19

Sim, a vacina contra o coronavírus já foi associada à miocardite, uma inflamação no coração. Mas, apesar disso, as pessoas devem se imunizar. A explicação é simples: a incidência dessa consequência indesejável é extremamente baixa e infinitamente menos relevante do que a miocardite provocada pela própria Covid-19.

Para ter ideia, estudos recentes apontaram que, em Israel, onde mais de 5 milhões de indivíduos foram imunizados, somente 62 tiveram miocardite (0,001%), com dois casos fatais. Na Dinamarca, 3,5 milhões receberam o imunizante, e 48 pessoas evoluíram com miocardite, com zero mortes.

Como se vê, além de ser um evento raro, a maior parte dos pacientes diagnosticados com miocardite por conta da vacina evolui de maneira satisfatória, com remissão espontânea.

Mas, sem dúvida, casos de miocardite derivados da vacinação precisam ser estudados mais profundamente. E já existe um empenho da comunidade científica em identificar os principais mecanismos por trás disso — o objetivo é modificar e atenuar efeitos adversos.

Compartilhe essa matéria via:

Não se vacinar representa um perigo maior

Quem opta por não tomar as doses recomendadas corre o risco de ser infectado pelo Sars-CoV-2 e enfrentar problemas cardíacos.

A literatura já indica que entre 7 e 10% das pessoas que pegam Covid-19 sofrem algum grau de acometimento do coração, sendo a maior parte totalmente assintomática ou com sintomas leves.

Porém, quando ocorrem as manifestações moderadas ou graves da Covid-19, esses percentuais sobem para 30 e 40%, e são representados por quadros como arritmias, rompimento das placas de aterosclerose levando ao infarto, miocardite ou pericardite.

Em estudo da Universidade de Ohio (EUA), atletas infectados pelo coronavírus que manifestaram as formas leve ou assintomática foram avaliados antes que retomassem suas atividades esportivas. Os pesquisadores observaram que 15% apresentavam alguma alteração sugestiva de miocardite na ressonância magnética do coração.

+ LEIA TAMBÉM: A Covid longa na era da Ômicron e dos vacinados

Por conta de evidências como essas, clubes de futebol no Brasil já estão avaliando jogadores que positivaram para Covid-19 com o objetivo de diagnosticar possíveis sequelas cardiovasculares antes da liberação para voltarem aos treinos físicos.

Continua após a publicidade

Vale lembrar que o mal súbito de causas cardiológicas (cardiopatias genéticas, alterações estruturais do coração, etc.) e extra cardíacas (embolia pulmonar, ruptura de aneurisma, etc.) continuam fazendo suas vítimas independentemente da Covid-19.

É para todo mundo

A polêmica no começo do ano sobre a vacinação girou em torno da imunização de crianças e adolescentes. Mais uma vez, a posição da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp) é pelo “sim”.

No Brasil, dos poucos pacientes que tiveram reação com a vacina, 11% estavam na faixa etária de 12 a 17 anos e cerca de 40% entre 18 e 44 anos.

Em relação às crianças, a publicação de dados é heterogênea, mas o acometimento cardiovascular ainda é muito baixo e, reforço, infinitamente menor do que o prejuízo cardíaco ocasionado pela própria infecção.

+ LEIA TAMBÉM: Miocardite e vacinas da Pfizer e da Moderna: entenda a relação

E, assim como em qualquer faixa etária, na maioria dos casos crianças com miocardite pela vacina também evoluem satisfatoriamente, com cura espontânea.

Entretanto, não podemos afirmar que é impossível uma criança vacinada falecer após evoluir com miocardite aguda na forma grave. Mas, mais uma vez, a incidência é ínfima e menor que o risco oferecido pela própria doença.

Na outra ponta, estão os idosos que, assim como outros grupos etários, eventualmente podem apresentar comprometimento cardíaco pós-vacinação.

Mas aqui também cabe a relação custo x benefício: o sistema imunológico dos mais idosos pode apresentar falhas, mesmo diante da variante Ômicron, que parece provocar infecções menos graves.

Por isso, quando avaliamos as estatísticas sobre o que a doença causa versus a proteção das vacinas, não há dúvidas sobre a recomendação das doses para todos.

*Felix Ramires é cardiologista, diretor científico da SOCESP – Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo, professor livre docente da Faculdade de Medicina da USP e coordenador do Núcleo de Ensino e Pesquisa em Miocardiopatias do Incor

Continua após a publicidade

Comprometimento cardiovascular não contraindica vacina da Covid-19 Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

Violência obstétrica: o que é e como prevenir

O tema violência obstétrica ganhou os holofotes recentemente, depois que a influenciadora digital Shantal Verdelho teve um áudio sobre seu parto vazado nas redes sociais. Nele, a mulher relata uma série de abusos cometidos pelo médico Renato Kalil, como xingamentos e tentativa de realização da episiotomia – procedimento cirúrgico que consiste em um corte no períneo, entre o ânus e a vagina.

Entre especialistas, no entanto, a conversa já é antiga. Segundo dados da pesquisa Nascer no Brasil, coordenada pela Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP-Fiocruz), apenas metade das mulheres dá à luz de acordo com as boas práticas obstétricas.

Ainda se constatou que a chance de parir sem intervenções médicas no Brasil é de apenas 5%. Esses dados foram tirados de entrevistas com 23 940 puérperas, no biênio 2011/2012.

Os números assustam, já que o parto é um ato biológico, feito para dar certo, e a interferência médica deve ser a menor possível.

Mas o que configura, de fato, esse tipo de agressão e como a mulher pode se proteger?

+ LEIA TAMBÉM: Parto vaginal: desmistificando tabus e medos

Afinal, o que é a violência obstétrica?

Atos que causem dor, dano ou sofrimento desnecessário à mulher no período de gestação e no pós-parto estão dentro desse espectro, segundo documento divulgado pela Rede Feminista de Ginecologistas e Obstetras.

Um tratamento desrespeitoso também entra nessa lista. E ele pode vir de qualquer outro profissional envolvido no parto, não só por parte do obstetra.

“A violência obstétrica pode ser física, psicológica ou verbal, e também inclui negligência, discriminação ou condutas excessivas ou não recomendadas, muitas vezes prejudiciais e sem embasamento em evidências científicas recentes e atualizadas”, descreve a médica ginecologista e obstetra Anna Beatriz Herief, da Casa Pitanga, no Rio de Janeiro.

Dentro disso, a especialista ressalta que é primordial ter a consciência de que essa situação não é caracterizada somente por uma agressão clara ou absurda, como bater ou xingar. Ela pode ser bastante sutil, inclusive.

“Essas práticas submetem mulheres a protocolos e rotinas rígidas que são muitas vezes desnecessários, desrespeitam seus corpos e seus ritmos naturais, impedindo-as de exercer seu protagonismo”, resume Herief.

O ginecologista e obstreta Paulo Noronha, do Espaço Mãe, em São Paulo, entende ainda que uma agressão pode ser considerada “tudo aquilo que acontece no corpo de uma pessoa grávida sem o consentimento dela, seja no parto normal ou na cesárea”.

“E isso só ocorre porque falamos de corpos femininos, independentemente do gênero com o qual a pessoa se identifica, pois a medicina ainda é muito machista”, pontua o médico.

Compartilhe essa matéria via:

O parto em trajetória invertida

As mulheres nasceram com o dom de parir, algo que todo médico concorda. Trata-se de um processo que tende a acontecer naturalmente. Mas é fato que, em alguns casos, há riscos de complicações. Nesses cenários, ainda bem, dá para contar com os modernos recursos da medicina, como a cesárea.

Ocorre que, nas últimas décadas, essa linha de raciocínio se inverteu, e as intervenções cirúrgicas passaram a ser regra, e não a exceção. “O parto começou a ser medicalizado, centrado no médico e no ambiente hospitalar”, resume Herief.

Só que, quando escolhida sem prescrição adequada, a própria cesárea pode ser considerada uma violência obstétrica. Agora, perceba: o Brasil está em segundo lugar no ranking mundial de cesarianas, com 55% do total de partos sendo feitos de forma cirúrgica. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), esse índice não deveria passar de 15%.

“As taxas de cesárea são muito altas, o que mostra que somos retógrados. Além dessas técnicas desnecessárias durante o parto, a comunicação no consultório com os pais ainda é violenta”, avalia o obstetra Wagner Hernandez, de São Paulo.

“Mas as mulheres passaram a ter mais informação e notaram que havia algo de errado nessa história”, analisa Herief.

Parto humanizado como meta

Para a obstetra da Casa Pitanga, toda mulher deveria ter acesso a um parto humanizado. Ele é baseado em três premissas básicas: respeito à fisiologia do parto, base em evidências científicas e protagonismo da mulher. Ou seja, não faz sentido encará-lo como moda.

+ LEIA TAMBÉM: A visão brasileira sobre o parto humanizado está desajustada

“Esqueça a ideia de que parto humanizado precisa de banheira, luzinhas no teto, música ou quaisquer outros elementos que você tenha visto em lindos vídeos produzidos. O parto pode até contemplar tudo isso, mas o que fará dele verdadeiramente humanizado é ter essa base firme, verdadeira e respeitosa”, crava Herief.

Quando há sinais de complicações e necessidade de intervenções, também existe um jeito certo de realizá-las.

“A média de duração de um trabalho de parto é de 12 horas”, conta Daniela Nogueira, ginecologista e obstetra da Clínica First e do Hospital Municipal Dr. Fernando Pires da Rocha, em São Paulo. “Ao chegar em dez centimetros de dilatação, esperamos até duas horas e, aí, se o bebê não nascer, é preciso intervir de alguma maneira”, explica.

Mas isso, segundo Nogueira, deve ser feito a partir de conversas com a gestante. Estimulá-la, usando sempre palavras positivas, também é essencial.

Para Herief, nenhuma mulher vai questionar uma intervenção médica realmente imprescindível e conduzida de forma respeitosa, como uma cesariana.

“Agora, ela pode, sim, recusar certos procedimentos, como a episiotomia, que é uma mutilação perineal sem a menor evidência de necessidade, ou a manobra de Kristeller, que é absurda”, defende. Essa manobra, só para constar, envolve aplicar uma forte pressão externa (com mãos, punhos e antebraço) na parte superior do útero da grávida, na tentativa de forçar a saída do bebê.

+ LEIA TAMBÉM: Cesáreas ainda dominam a cena dos partos: precisamos reverter isso

A prevenção começa na consulta

Segundo Noronha, o ponto de partida para a gestante garantir seu protagonismo e se blindar contra a violência obstétrica é ter sua voz ouvida.

“Não é preciso ter medo de questionar o médico. Ele não é detentor de toda a verdade. Quando a mulher pergunta, consegue perceber o que quer e o que não deseja na gestação”, declara.

Fora isso, fica mais fácil entender, por exemplo, o que pode acontecer durante o parto, quando intervenções são realmente necessárias e quais as indicações de uma cesariana. Mas, de acordo com o médico, esse diálogo sincero e baseado em ciência está em falta nos consultórios.

Continua após a publicidade

Aliás, se os encontros com o médico vão na contramão, trazendo desconforto, é bom mudar de rumo. Ouvir piadas e grosserias é um sinal que não deve ser ignorado. E não é preciso temer a troca de profissional. “A relação médico-paciente não pode ser abusiva”, afirma Noronha.

Como a mulher está em uma situação mais vulnerável, contar com um acompanhante pode ajudar a detectar situações suspeitas.

Plano de parto: mais um aliado

“Nele, a mulher basicamente desenha como deseja seu parto. No fim das contas, é um documento que ela usa para se proteger da violência obstétrica. Embora não funcione como documento jurídico, ele deixa a gestante menos suscetível às decisões da equipe médica”, descreve Herief.

Para elaborá-lo, dá para se basear nas conversas tidas com o médico ao longo da gestação. Mas também há alguns modelos prontos que podem ser encontrados online. Veja um exemplo aqui.

Troca de experiências com outras gestantes nas redes sociais, busca por livros e rodas de conversas são outros recursos que abastecem a mulher de informações e a deixam mais preparada para a hora do parto.

Ocorrências que podem configurar violência obstétrica

Veja alguns exemplos:

+ Exigência de jejum ou restrição da dieta na hora do parto

É importante que, durante o trabalho de parto, a gestante esteja forte e tenha energia. A recomendação é que faça uma dieta leve.

“Há risco de vômito durante o parto, mas, em momento algum, ela precisa ficar com o estômago totalmente vazio. Por isso, não faz sentido deixá-la sem comer”, diz Luciano Curuci, ginecologista e presidente do Colégio Médico de Acupuntura do Estado de São Paulo (CMAeSP).

Segundo o obstetra Wagner Hernandez, de São Paulo, o que pode ser combinado é o jejum para cesáreas eletivas (aquelas feitas com hora marcada), considerando que a gestante permanecerá deitada de barriga para cima.

+ LEIA TAMBÉM: O parto também é uma questão de ciência

+ Uso de ocitocina sem indicação médica

Esse hormônio sintético é conhecido por estimular as contrações, mas não deve ser aplicado de forma rotineira. Ainda assim, foi utilizado em 36% dos partos entre 2011 e 2012, segundo dados da pesquisa Nascer no Brasil.

“O médico acompanha a evolução do parto com base em vários detalhes, como dilatação, altura da posição fetal e contagem de contrações. Se houver uma estagnação nesses índices, o uso da ocitocina pode ser um caminho”, ensina Curuci.

+ Realização da episiotomia

É um procedimento cirúrgico que consiste em uma incisão no períneo para ampliar o canal vaginal e, assim, acelerar a saída do bebê. É um recurso agressivo e sujeito a várias complicações. Tanto o Ministério da Saúde como a Organização Mundial da Saúde pedem para que ele seja evitado.

A episiotomia só deveria ser colocada em prática em situações extremas – quando, por exemplo, o feto corre risco de vida.

Infelizmente, porém, a realidade é outra: naquele levantamento da Fiocruz, 54% das brasileiras citaram ter passado por essa experiência em seus partos.

+ Obrigar a mulher a ficar na posição de litotomia (ou ginecológica)

É aquela que a gente costuma ver em filmes: a grávida fica deitada com as pernas erguidas, flexionadas e apoiadas em um suporte metálico (conhecido como perneira).

Noronha explica que há algumas circunstâncias em que essa posição até pode ser solicitada, como após a aplicação de anestesia. “Mas o ideal é garantir a movimentação livre da mãe”, avisa.

A cada passo, ela vai buscando um jeito mais confortável de se posicionar, sempre acompanhada e monitorada de perto pela equipe.

+ Fazer a aminiotomia

É o ato de romper a bolsa amniótica com a ajuda de uma ferramenta médica. Existem indicações específicas e o momento certo para recorrer a essa técnica, caso ela seja extremamente inevitável.

“É mais saudável que a bolsa se rompa naturalmente, porque o líquido amniótico protege o bebê. Quando isso acontece antes do esperado, seja de forma espontânea ou forçada, há risco de infecção bacteriana”, informa Curuci.

+ Utilização do fórceps

Semelhante a uma colher, esse instrumento é usado para apreender a cabeça da criança e tirá-la do canal de parto.

“Ele pode ser empregado em partos muito prolongados e que começam a ser perigosos para a vida do bebê, com risco de hipóxia cerebral [falta de oxigenação no cérebro]”, observa Curuci.

Como se vê, não deve, portanto, ser uma prática corriqueira. É essencial que exista uma indicação clara de benefício.

+ Leia também: Violência obstétrica: a violação dos direitos reprodutivos das mulheres

Outros procedimentos condenáveis

  • Tricotomia: não há necessidade alguma de se incentivar a depilação dos pelos pubianos antes do parto
  • Enemas: a lavagem intestinal já serviu para evitar evacuação na hora do parto, que é um movimento natural do processo
  • Toques vaginais sem consentimento em consultas ou no dia do parto
  • Negar anestésico para mães com dor
  • Negar a presença de acompanhante durante todo o processo – isso é, inclusive, garantido por uma lei federal
  • Falta de privacidade durante o parto
  • Violência física ou verbal, com ameaças, gritos, piadas e tapas
  • Omissão de informações, desconsideração das opiniões padrões e valores culturais da mulher e parturientes e divulgação pública de informações que possam infantilizá-la ou prejudicá-la
  • Impedir o contato pele a pele da mãe com o bebê e a amamentação na primeira hora de vida (caso seja um nascimento sem intercorrências) e/ou separá-los por protocolo
  • “Ponto do marido”: procedimento em que é dado um ponto na vagina para deixá-la mais fechada após o parto
Continua após a publicidade

Violência obstétrica: o que é e como prevenir Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br

Asteroide extinguiu os dinossauros na primavera do Hemisfério Norte

Há 66 milhões de anos, o impacto de um asteroide na península de Yucatán, no México, varreu os dinossauros da face da Terra – e três quartos de todas as espécies que existiam por aqui. Mas o evento pode ter sido especialmente catastrófico para animais do Hemisfério Norte. Eles morreram assistindo ao desabrochar das flores, na primavera.

A hipótese é de uma equipe internacional de cientistas que analisou fósseis de peixes mortos no momento do impacto e encontrou indícios de que ele aconteceu durante a primavera boreal. As descobertas foram publicadas na revista Nature.

Os fósseis estudados, de peixes-espátula e esturjões, foram encontrados no sítio fossilífero Tanis, localizado no estado norte-americano da Dakota do Norte, na formação geológica de Hell Creek. Tanis é um lugar importante para a paleontologia, pois reúne vítimas diretas do impacto e mostra como o evento afetou a vida no planeta.

Acredita-se que a colisão gerou um tsunami que misturou e soterrou todas as criaturas que viviam por lá – que morreram em menos de uma hora. Os fósseis encontrados em Tanis são bem preservados, e os peixes ainda guardam, em suas guelras, pequenas esferas de vidro originárias da rocha espacial que caíram do céu após o impacto.

Fóssil de peixe-espátula encontrado no sítio de Tanis (Estados Unidos) e analisado no estudo.Uppsala University/Divulgação

Os cientistas estudaram os ossos dos peixes a fim de identificar ciclos sazonais de crescimento (mais ou menos como acontece com anéis de troncos de árvores), além de rastrear mudanças anuais na densidade e no volume das células ósseas.

Continua após a publicidade

O prato favorito dos peixes era zooplâncton. A abundância desses seres microscópicos varia de acordo com a estação do ano. Pensando nisso, os pesquisadores estudaram mudanças nos isótopos de carbono de um dos peixes. Esses isótopos revelam o padrão de alimentação dos peixes – e logo, a abundância de zooplâncton no ambiente.

Segundo os pesquisadores, todas as variações sazonais estudadas indicam que os peixes morreram na primavera, antes da estação de alimentação chegar ao clímax.

Isso significa que o impacto do asteroide teria acontecido em estágios de vida sensíveis dos organismos do Hemisfério Norte: o início dos ciclos reprodutivos. Isso pode ter contribuído para taxas de extinção maiores entre esses animais.

Compartilhe essa matéria via:

O estudo indica que, por outro lado, o evento teria sido menos catastrófico para animais do Hemisfério Sul, que se preparavam para o inverno. Isso porque, segundo a teoria principal sobre o evento de extinção, após a intensa onda de calor desencadeada pelo impacto do asteroide, uma grande nuvem de detritos bloqueou parte da luz solar e deixou o planeta na escuridão.

“Para ser capaz de combater aquele inverno nuclear, primeiro você tinha que sobreviver ao impacto”, afirma a pesquisadora Melanie During, autora principal do estudo, ao jornal The Guardian. “Qualquer coisa no Hemisfério Sul que já estivesse abrigado tinha uma chance muito maior de sobreviver.”

“Esta descoberta crucial ajudará a descobrir por que a maioria dos dinossauros morreu, enquanto as aves e os primeiros mamíferos conseguiram escapar da extinção”, afirma em comunicado.

Continua após a publicidade

Asteroide extinguiu os dinossauros na primavera do Hemisfério Norte Publicado primeiro em https://super.abril.com.br/feed

Comer rápido pode elevar o risco de diabetes

Com base em um banco de dados de mais de 15 mil homens de 40 a 74 anos, cientistas japoneses categorizaram esses indivíduos de acordo com a velocidade com que se alimentavam. Em cinco anos, 620 desenvolveram diabetes.

Cruzando as informações, os estudiosos repararam que os comedores mais acelerados corriam um risco 35% maior de encarar a doença.

Para a endocrinologista Tarissa Petry, do Centro de Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (SP), trata-se de um achado que dá o que pensar, mas ainda não conclusivo.

“É que os próprios voluntários relatavam se comiam rápido ou não”, nota, frisando que nem sempre essa percepção é fidedigna. “O ideal, agora, é realizar uma pesquisa mais controlada, em que o tempo da alimentação seja de fato cronometrado”, argumenta.

+ Leia também: Alerta máximo para o diabetes

A teoria faz sentido

Embora a pesquisa não permita cravar que comer rápido provoca diabetes, Tarissa reconhece que há hipóteses plausíveis para associar a pressa à mesa à maior propensão à doença.

“Acredita-se que quem come rápido demora mais para sentir saciedade. Aí, acaba ingerindo um volume maior do que precisa”, raciocina a endocrinologista.

Esse é um processo que facilita o ganho de peso e, se houver predisposição, sobe o risco de o diabetes tipo 2 aparecer.

Continua após a publicidade
Compartilhe essa matéria via:

Treino para desacelerar

Atitudes que ajudam a ter mais calma diante dos alimentos:

+ Apoie os talheres à mesa a cada garfada

+ Do aroma à textura, saboreie o prato

+ Nada de celular ou TV enquanto está comendo

+ Reserve uns 30 minutos para ficar à mesa

+ Comece a refeição pela salada

+ Recorra a talheres menores

Continua após a publicidade

Comer rápido pode elevar o risco de diabetes Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br

4 mapas que ajudam a entender o que está acontecendo na Ucrânia

Na madrugada desta quinta-feira (24), o presidente da Rússia, Vladimir Putin, anunciou em um discurso de TV que daria início a uma operação militar na Ucrânia. Nas horas seguintes, foram registradas explosões não só nas áreas separatistas, mas também na capital do país, Kiev, e na segunda maior cidade ucraniana, Kharkiv.

Comboios russos invadiram a Ucrânia de todas as direções. Um deles entrou via Belarus (aliada da Rússia) ao norte; outro veio pelo sul, via Crimeia (península ucraniana anexada pela Rússia em 2014). O aeroporto de Kiev foi bombardeado e, logo depois, o governou fechou o espaço aéreo do país para voos civis:

Voos civis foram impedidos de passar pelo espaço aéreo ucraniano. Na imagem, “KBP” é a sigla do Aeroporto Internacional de Kiev.FlightAware/Reprodução

Com os ataques, o pânico tomou conta do país. Enquanto há congestionamento para fugir de Kiev, outras pessoas buscam abrigo em estações de metrô. Há longas filas também em supermercados, postos de gasolina e bancos, para o saque de dinheiro em espécie.

A Ucrânia é um país de 44 milhões de habitantes não muito maior que Minas Gerais. Fértil, é um dos maiores exportadores de grãos do mundo (é o 3º de trigo; de milho, o 4°). A quarta maior colônia de ucranianos e descendentes vive aqui no Brasil (são 600 mil pessoas; a maioria no Paraná).

Mas, afinal: o que explica o conflito separatista que se estende por lá há oito anos – e que já matou 14 mil pessoas? Quais os  motivos por trás da intervenção da Rússia, que apoia rebeldes separatistas, deslocou 150 mil soldados para a fronteira com a Ucrânia e iniciou a invasão ao país?


Os mapas a seguir fornecem informações para compreender melhor toda essa situação. Há detalhes na formação de ambos os países, da língua às alianças militares, que ajudam a entender a conturbada relação entre eles. Confira:

Mil anos de história

Rússia e Ucrânia compartilham o mesmo berço: Kievan Rus, o primeiro estado eslavo. “Rus” (que depois seria usado para batizar “Rússia” e “Belarus”, outra nação descendente daí) era o nome do povo, essencialmente formado por comerciantes que saíram do Mar Báltico, na Escandinávia, atravessaram as florestas da Europa Oriental e se fixaram nas terras férteis da atual Ucrânia. Kiev, capital do estado, foi estabelecida no século 9.

Em 988, o grão-príncipe de Kiev, Vladimir I, escolheu o cristianismo ortodoxo como a religião oficial do estado e foi batizado na cidade de Quersoneso, na península da Crimeia.

O ato de Vladimir é considerado até hoje como um marco religioso tanto pela Ucrânia quanto pela Rússia, onde 67% e 71% da população, respectivamente, é cristã ortodoxa ( Putin já mencionou o batismo do príncipe para defender que “russos e ucranianos são um único povo”).

Nos séculos seguintes, Kievan Rus foi alvo de sucessivas invasões: mongóis (séc. 13), poloneses e lituanos (séc. 16) e russos (séc. 17). Em 1793, o Império Russo conseguiu anexar a parte ocidental da Ucrânia. Foi quando começou o processo de russificação, uma política que proibiu o idioma ucraniano e forçava as pessoas a se converter para a fé ortodoxa russa.

A região sob domínio russo ficou conhecida como “Margem Esquerda”, pois ficava à esquerda do Rio Dniepre, que corta a Ucrânia. A “Margem Direita”, por sua vez, era controlada pela Polônia.

Em 1922, a Ucrânia foi absorvida pela União Soviética e permaneceu assim até 1991, quando ela se dissolveu. A Ucrânia virou uma nação independente, mas fragmentada. Ao longo das décadas, milhões de russos povoaram o leste do país. Resultado: o sentimento de nacionalismo nessa região é bem mais fraco se compararmos com o restante.

<span class="hidden">–</span>Carlos Eduardo Hara/Rafael Battaglia/Superinteressante

Um país dividido

Uma herança da russificação no leste Ucrânia é a quantidade de pessoas dentro do território ucraniano que tem o russo como primeira língua:

<span class="hidden">–</span>Carlos Eduardo Hara/Rafael Battaglia/Superinteressante
Continua após a publicidade

Os dados são do censo ucraniano de 2001 – a fonte de informação mais atual sobre esse assunto. As regiões em azul são a Crimeia, anexada pela Rússia em 2014, e a de Donbas, que engloba Donetsk e Lugansk, cujas áreas controladas por separatistas foram reconhecidas por Putin como regiões autônomas na última segunda (21). Putin argumenta que as ações na região visam, justamente, defender os interesses dos falantes russos que vivem no país.

Outro mapa que ajuda a entender a Ucrânia como um país dividido é o que mostra o resultado das eleições presidenciais de 2010, alguns anos antes do conflito separatista explodir. Observe como ele se assemelha, de certa forma, ao mapa anterior:

<span class="hidden">–</span>VOX/Divulgação

Foi uma eleição apertada. A candidata Yulia Tymoshenko, que defendia a entrada da Ucrânia na União Europeia e na Otan (aliança militar composta por 30 países), obteve 11,6 milhões de votos – 45,5% do total. Já Viktor Yanukovych, que prezava pela aproximação do país com a Rússia, venceu com 12,5 milhões de votos (49%).

Durante o seu mandato, Yanukovych rejeitou um acordo pendente de associação com a União Europeia e se alinhou cada vez mais com a Rússia. Isso levou a uma onda de manifestações que ficou conhecida como Euromaidan, que pedia por mais integração da Ucrânia com a Europa ocidental. 

“Euromaidan” vem do ucraniano “Yevromaidan”. “Maidan” significa “praça” – uma referência a um dos momentos mais emblemáticos do movimento, no qual manifestantes tomaram a Praça da Independência, no coração de Kiev, capital do país. As revoltas começaram em novembro de 2013; em fevereiro de 2014, o parlamento ucraniano removeu Yanukovych da  presidência e ele se exilou na Rússia.

A crise na península da Crimeia foi uma resposta contrária ao Euromaidan organizada por parte da população que discordava da aproximação com a União Europeia e, ao invés disso, prezava pelo alinhamento (e até a união definitiva) com os russos. Em 2014, a Rússia anexou a Crimeia (que possui uma localização estratégica, com saída para o Mar Negro) e, desde então apoia grupos separatistas por lá e na região de Donbas.

Compartilhe essa matéria via:

Panelinha ocidental

A Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) é uma aliança militar formada em 1949 por EUA, Canadá e outros dez países europeus com o objetivo de se proteger do avanço da União Soviética. 

A aliança cresceu após o fim da URSS com a adesão de ex-repúblicas soviéticas, como Estônia, Letônia e Lituânia. Hoje, ela possui 30 membros:

<span class="hidden">–</span>Carlos Eduardo Hara/Rafael Battaglia/Superinteressante

Países membros da Otan precisam seguir o estatuto da organização. E a regra mais importante é o Artigo 5, que estipula o princípio da defesa coletiva: se um país da Otan for atacado, os outros precisam defendê-lo militarmente. Não podem recusar o chamado à guerra.

Além disso, é comum que membros da Otan tenham bases militares americanas: França, Itália, Bélgica e Alemanha, entre outros, abrigam instalações do tipo. E isso é péssimo para a Rússia.

Em 2005, Putin declarou que o fim da União Soviética foi a maior catástrofe geopolítica do século 20, afastando milhões de russos do atual território do país. O presidente, então, se esforça para manter uma zona de influência entre os países próximos. E o avanço da Otan só dificulta as coisas.

Há também um segundo problema. Desde 2018, com a saída de um tratado militar, os EUA podem instalar armas nucleares de médio alcance em bases da Otan. Num conflito hipotético, isso deixaria a Rússia em desvantagem, já que os mísseis americanos atingiriam o país antes mesmo que ele conseguisse esboçar uma resposta.

Os riscos de uma guerra nuclear, claro, são mínimos, mas a situação ajuda a entender a constante situação geopolítica das duas superpotências.

É por isso que, para Moscou, é interessante que os conflitos na Ucrânia perdurem, pois isso trava a entrada do país na Otan – se ele entrasse, o Artigo 5 obrigaria o resto das nações a entrar em guerra com a Rússia, e ninguém tem nada a ganhar com isso. O envio de tropas e o suporte aos separatistas visa impedir uma eventual vitória do exército ucraniano.

Não é a primeira vez que a Rússia faz uma manobra do tipo, vale lembrar. O país apoia movimentos separatistas em outras três ex-repúblicas soviéticas: Azerbaijão, Moldávia e Geórgia (que inclusive foi brevemente invadida pelos russos em 2008). Elas são parceiras da Otan, mas os conflitos, assim como no caso da Ucrânia, empacam a adesão plena à aliança.

Continua após a publicidade

4 mapas que ajudam a entender o que está acontecendo na Ucrânia Publicado primeiro em https://super.abril.com.br/feed