“Você vai morrer cedo se continuar assim.” Esse foi o “conselho” que o empresário e publicitário Nizan Guanaes, de 64 anos, ouviu de seu médico, o cardiologista Roberto Kalil, em 2011. Cinco anos antes, pesando cerca de 140 quilos, ele tinha se submetido a uma cirurgia bariátrica. Fazer a operação, admite hoje, foi um erro. Não pelo procedimento em si, indicado para tratar casos graves de obesidade. Mas porque ele não teve preparação antes nem supervisão depois.
Feita a cirurgia, Nizan voltou a comer demais. Numa única tarde, devorou nove donuts. Pior: passou a fumar muito e a beber mais ainda. Só não virou alcoólatra, costuma dizer, porque não gosta de álcool. E, como ele tem histórico de morte por infarto na família — o pai morreu do coração aos 45 —, o cardiologista sugeriu que procurasse o psiquiatra Arthur Guerra, especialista em dependência química.
Nizan procurou Guerra na esperança de encontrar paz e um remédio para dormir. Mas, contrariando suas expectativas, o médico não prescreveu medicamentos e ainda suspendeu os antigos.
Em vez de calmante, receitou triatlo. Isso mesmo: triatlo! Propôs a Nizan que, a exemplo dele, atleta amador, praticasse a modalidade esportiva que concilia 3,8 km de natação, 180 km de ciclismo e 42,1 km de corrida. “Nem a pau, Juvenal!” foi a primeira coisa que passou pela cabeça do publicitário. O mais curioso é que Guerra também precisou de um “puxão de orelha” para mudar de vida e ser feliz.
A bronca, no caso, veio do filho. Em 2006, ele reclamou que o pai, então com 52 anos, precisava cuidar mais de seu condicionamento físico. De médico sedentário, Guerra virou médico triatleta. Perdeu peso, ganhou autoestima. Nizan também. De “quase alcoólatra” virou “quase atleta”. Hoje pesando 96 quilos, já correu três maratonas em apenas um ano e dois meses.
Juntos, Guerra e Nizan acabam de lançar Você Aguenta Ser Feliz? — Como Cuidar da Saúde Mental e Física para Ter Qualidade de Vida, pela Editora Sextante (clique aqui para comprar).
“Cuidar da saúde mental é como andar de bicicleta. Exige esforço e movimento constantes. Se parar de pedalar, a bicicleta tomba”, ensina Guerra, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP). “Posso até ajudá-lo a subir na bicicleta, mas quem mantém o ritmo das pedaladas e o controle do guidão é você.”
Nizan completa: “Se é para correr atrás da felicidade, que seja de tênis”, brinca o CEO da N Ideias, empresa de consultoria em comunicação. E arremata: “Só eu sei quanto sofri correndo atrás dessa tal felicidade. Nessa ultramaratona chamada vida, não tem linha de chegada. Ser feliz é uma decisão cotidiana e uma conquista diária”.
Definir o que é felicidade é daquelas missões quase impossíveis. Para Antônio Houaiss (1915-1999), autor do dicionário que leva seu sobrenome, é o “estado de uma consciência plenamente satisfeita”. Já a escritora Adriana Falcão traduz como “um agora sem nenhuma pressa”.
Mas e a ciência, o que tem a dizer sobre essa tal felicidade? O professor de pós-graduação em Psicologia Positiva da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) Gustavo Arns pega emprestada uma definição do psicólogo israelense Tal Ben-Shahar. “Felicidade é a combinação de cinco elementos: bem-estar físico, emocional, intelectual, relacional e espiritual”, sintetiza o Ph.D. pela Universidade Harvard, nos Estados Unidos, onde leciona há mais de 20 anos.
E isso tem tudo a ver com saúde! “A felicidade fortalece nosso sistema imunológico. Isso não significa que você não vai ficar doente. Significa que ficará doente com menos frequência e, quando isso acontecer, vai se recuperar mais rapidamente”, explica Ben-Sharar, autor do livro Seja Mais Feliz, Aconteça o Que Acontecer, da Editora Principium (clique aqui para comprar).
A primeira vez que Arns ouviu falar da ciência da felicidade foi em 2014, quando, por acaso, assistiu a uma palestra do israelense em São Paulo. Coincidência ou não, felicidade vem do latim felicitas e quer dizer “sorte”, “ventura”, “fortuna”…
“A felicidade é uma habilidade. E, como tal, pode ser aprendida, desenvolvida e praticada”, revela o idealizador do Congresso Internacional da Felicidade, que está em sua quinta edição. “Assim como aprender um idioma novo ou tocar um instrumento musical, ser feliz leva tempo e dá trabalho”, avisa Arns. E aí, bora ser feliz?
Uma pesquisa rápida no sistema de busca de uma grande livraria revela que há 500 e poucos livros com a palavra “felicidade” no título. Se acrescentar o verbete “feliz” à apuração, o resultado pula para 1,3 mil — de clássicos da filosofia a best-sellers de religião.
Uma dessas obras é a recém-lançada História da Felicidade, da Editora Contexto (clique aqui para comprar), do inglês Peter N. Stearns. O historiador esmiúça o tema desde os primórdios da civilização, quando nossos antepassados sobreviviam da caça e da coleta e não tinham muito tempo para pensar sobre o que os deixava felizes, até os dias de hoje, quando a maioria de nós parece não pensar em outra coisa a não ser esbanjar felicidade nas redes sociais.
“No início do século 21, qualquer pessoa que posasse para uma selfie tinha o cuidado de esboçar um sorriso. Parecer feliz passou a ser mais importante do que nunca”, observa o professor.
“Algumas sociedades incentivaram mais o sorriso do que outras. Já se especulou que o sorriso mais famoso do Renascimento era misterioso porque a Monalisa estava se esforçando para não mostrar seus dentes amarelos ou ausentes”, relata Stearns, referindo-se à obra-prima do pintor italiano Leonardo da Vinci (1452-1519).
O conceito de felicidade, concordam os estudiosos, mudou ao longo do tempo. Para os gregos, era sinônimo de virtude. Para os romanos, prazer. Para os cristãos, salvação.
Foram os iluministas que, no século 18, fizeram uma revolução ao dizer que, mais do que uma recompensa dos céus ou um golpe de sorte, a felicidade era um direito do homem. “Há apenas um dever: o de sermos felizes”, sintetizou o filósofo francês Denis Diderot (1713-1784), um dos pais do Iluminismo.
“Se você acredita que deveria ser feliz e, no entanto, não é, pode sentir-se triste ou infeliz. E mais: se a felicidade é algo natural, que deveria acontecer por si só, você pode achar que ser feliz é fácil. Não é. Requer prática. Como o jogador de basquete treina seu arremesso e o de golfe, sua tacada”, compara o historiador americano Darrin M. McMahon, autor de Felicidade — Uma História (Editora Globo).
Um assunto tão subjetivo como esse não aguça só a curiosidade de historiadores e psicólogos. Atiça a de economistas também. Caso de David Blanchflower, professor da Faculdade Dartmouth, nos EUA, autor de uma pesquisa realizada em 134 países que constatou que a maioria das pessoas tende a ser mais feliz no início da vida adulta, lá pelos 20 anos, e na maturidade, depois dos 50.
A mesma investigação descobriu que os cidadãos se sentem mais infelizes por volta dos 47 e 48 anos. “Se tiverem boa saúde, estabilidade financeira e segurança afetiva, os mais velhos podem ser tão felizes quanto os mais jovens”, afirma a antropóloga Mirian Goldenberg, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e autora de Liberdade, Felicidade e Foda-Se! — As Perguntas e as Respostas para Viver Mais Feliz, da Editora Planeta (clique aqui para comprar).
De fato, parece existir uma “curva da felicidade”, como documentam estudos feitos inclusive no país. Coordenadora da pesquisa Corpo, Envelhecimento e Felicidade, que abrange mais de 5 mil homens e mulheres de 18 a 98 anos, Mirian conta que as brasileiras na faixa de 40 a 50 anos são as mais infelizes hoje.
Na visão da professora, isso acontece porque lhes falta tudo: tempo, liberdade, reconhecimento… A boa notícia é que, depois da quinta década de vida, as coisas tendem a melhorar.
“A escritora francesa Simone de Beauvoir dizia que ‘ninguém nasce mulher: torna-se mulher’. Já eu digo: ninguém nasce feliz: torna-se feliz. E isso acontece quando aprendemos a dizer ‘não’, nos tornamos donas do próprio tempo e ligamos o ‘foda-se’, isto é, quando nos libertamos dos preconceitos associados ao envelhecimento”, reflete Mirian.
Outro economista que escreveu seu nome na história da felicidade é o americano Richard Easterlin, professor da Universidade do Sul da Califórnia. Em 1974, ele criou uma teoria — conhecida como Paradoxo de Easterlin — que afirma que o dinheiro traz felicidade, sim. Mas só até certo valor.
“Acima dos 75 mil dólares por ano [o equivalente a 33 mil reais mensais], ganhar mais dinheiro não torna ninguém mais feliz”, conta a psicóloga Laurie Santos, pesquisadora da Universidade Yale (EUA), evocando o tal paradoxo e citando um montante calculado pelos economistas Daniel Kahneman e Angus Deaton, ganhadores do Prêmio Nobel de Economia em 2010.
No Brasil e outros países da América Latina, a conta ajustada ao padrão de vida daria em torno de 15 mil reais por mês. Convenhamos que não é pouco, e uma minoria tem acesso a essa soma por aqui.
“Mas um dos erros mais comuns é presumir que dinheiro é determinante para ser feliz. Fazer amigos, praticar a gentileza e demonstrar gratidão são meios mais eficazes de alcançar o bem-estar”, resume Laurie.
Em seu perfil no LinkedIn, Nizan Guanaes afirma que a “régua” da N Ideias é a felicidade. E dá um exemplo: “Se temos tempo de colocar filhos e netos na cama, estamos fazendo certo”.
Nem sempre foi assim. Houve um tempo, não muito distante, em que o então publicitário não tinha tempo para nada. Trabalhava pela manhã, à tarde e à noite. E aos sábados, domingos e feriados também. Para aguentar o tranco, tomava incontáveis xícaras de café e mais de 20 latas de refrigerante por dia. Quando chegava a noite, mal conseguia pegar no sono.
“Todo mundo fala que tem um sonho na vida. Mas quem não dorme não sonha”, adverte. O empresário tem razão quando diz que pessoas felizes rendem mais. São, em média, 31% mais produtivas, segundo pesquisa publicada pela Harvard Business Review.
A qualidade de vida impacta também a criatividade. Um trabalhador feliz é três vezes mais criativo. O levantamento revela ainda que empresas que priorizam o bem-estar dos funcionários derrubam as taxas de demissão em 55% e as de burnout, a síndrome do esgotamento profissional, em 125%.
Outro estudo, feito pelo instituto Gallup, demonstrou que companhias com colaboradores felizes reduzem pela metade o número de acidentes laborais.
“As pessoas são felizes no trabalho quando o que elas fazem tem significado e desafia suas capacidades. E também quando se sentem reconhecidas e valorizadas”, destaca Renata Rivetti, diretora da Reconnect Happiness at Work, especializada em felicidade corporativa.
“Em caso de insatisfação, você tem que se perguntar: está infeliz no ambiente onde trabalha ou com o trabalho que faz? É possível encontrar ambientes mais saudáveis e líderes mais empáticos. Não é fácil, mas é possível”, assegura.
Não deveríamos menosprezar o status de bem-estar no emprego, afinal ele transborda para a vida pessoal e familiar. E não pense que a insatisfação sempre é evidente. Um sinal frequente de descontentamento com o trabalho é um fenômeno rotulado em inglês como quiet quitting, ou “desistência silenciosa”.
Cansado da labuta e da escassez de reconhecimento, o sujeito não quer pedir as contas ou ser demitido. Então vai levando… “Quiet quitting é cumprir os requisitos mínimos e não dedicar mais tempo, esforço ou entusiasmo do que o absolutamente necessário ao trabalhar. Só que essa falta de engajamento, de vigor, dedicação e absorção pode sinalizar infelicidade”, avisa Carla Furtado, diretora do Instituto Feliciência.
Criar um ambiente prazeroso não é nenhuma tarefa de Hércules. Autor do livro A Ciência da Felicidade: Escolhas Surpreendentes Que Garantem Seu Sucesso, da Faro Editorial (clique aqui para comprar), Luiz Gaziri aponta caminhos: o pagamento de bons salários fixos, e não apenas de bônus e comissões, que geram insegurança financeira; a criação de metas em equipe, e não individuais, que estimulam demais a competição; a concessão de prêmios imateriais, como viagens, e não materiais, como celulares, que produzem satisfação, mas não felicidade…
“As pessoas acham que só serão felizes quando forem bem-sucedidas. A felicidade não é consequência do sucesso, é a causa dele. Quando você está feliz, alcança seus objetivos mais facilmente. O sucesso de amanhã depende da felicidade de hoje”, filosofa o consultor.
Quanto a Nizan Guanaes, mesmo ainda trabalhando de nove a dez horas por dia, ele relata que agora sobra tempo para jantar com a família, ver os netos, encontrar os amigos… Em resumo: sobra tempo para ser feliz.
De 1942 a 1945, o psiquiatra austríaco Viktor Frankl (1905-1997) passou por quatro campos de concentração. Foi preso pelos nazistas por se recusar a praticar eutanásia em pacientes com transtornos mentais.
Mesmo submetido a trabalhos forçados e vivendo em condições desumanas, procurou dar um sentido à sua existência: queria porque queria, tão logo escapasse de lá, reencontrar a mulher, Tilly, que estava grávida e, a exemplo dele, fora mandada para Auschwitz, na Polônia.
“Quando não podemos mais mudar uma situação, somos desafiados a mudar a nós mesmos”, escreveu o autor de Em Busca de Sentido, da Editora Vozes (clique aqui para comprar).
Frankl foi solto em 1945 por soldados americanos. Em pouco tempo, descobriu que Tilly não tinha tido a mesma sorte. Ela morreu no campo de concentração de Bergen-Belsen, na Alemanha, aos 24 anos. Seus pais, Gabriel e Elsa, também não conseguiram sobreviver. O psiquiatra morreu em 1997, aos 92.
O nome de Viktor Frankl é citado por médicos e psicólogos que estudam como alcançar uma vida mais feliz e saudável. É daqueles exemplos incontornáveis. “Precisamos encontrar um sentido para nossa existência”, sublinha o reumatologista Marcelo Schafranski, autor do livro Medicina da Felicidade — Um Médico Explica o Que É Felicidade e Mostra os Caminhos Científicos para Alcançá-la, da Editora Matrix (clique aqui para comprar).
E esse sentido pode residir no aqui e agora ou em um futuro não tão distante. “Frankl observou que, nos campos de concentração, detentos que almejavam passar o Natal em casa com a família, por mais improvável que fosse, tinham mais chance de sobreviver. Há casos de pacientes que, apesar de terem sido diagnosticados com doenças crônicas ou incuráveis, conseguem ser felizes por terem encontrado um sentido para sua vida”, conta o professor da Universidade Estadual de Ponta Grossa, no Paraná.
De tudo o que pesquisou para escrever seu mais novo livro, Rir É Preciso — Descubra a Ciência por Trás do Humor e Aprenda a Usá-lo para Atravessar Períodos Difíceis e Criar Relações Mais Próximas, da Editora Sextante (clique aqui para comprar), o que mais impressionou o psiquiatra Daniel Martins de Barros foi a descoberta do riso como “estratégia de sobrevivência”.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o médico austríaco estimulava outros prisioneiros a tentar ver a vida com mais leveza e bom humor. “Levar a vida muito a sério pode ser um dos tantos erros que a gente comete tentando ser feliz”, diz o professor da Faculdade de Medicina da USP. “Frankl nos ensina que o humor tem efeito anestésico, ajuda a fazer amigos e alivia as tensões do dia a dia”, ressalta.
Se fossem remédios, “ter um propósito” e “viver com humor” seriam prescritos para pacientes infelizes. Outro tratamento é cultivar bons relacionamentos, de acordo com um estudo tocado pela Universidade Harvard desde 1938 com 724 homens americanos — 456 nascidos em bairros pobres de Boston e 268 ex-alunos da famosa universidade, um deles o ex-presidente dos EUA John F. Kennedy (1917-1963).
A cada dois anos, os voluntários respondiam a questionários. A cada cinco, se submetiam a exames médicos. E, a cada dez, compareciam a entrevistas presenciais. Dos 724 participantes, apenas 60 continuam vivos, a maioria na casa dos 90. Passados 75 anos, a que conclusão chegaram os cientistas? Bem, eles poderiam alugar um verso da música Wave, do compositor brasileiro Tom Jobim: “É impossível ser feliz sozinho”.
“Uma vida boa se constrói com bons relacionamentos. Pessoas conectadas socialmente são mais felizes e vivem mais. Mas não é a quantidade de amigos que importa. É a qualidade das relações”, afirma o psiquiatra Robert Waldinger, o atual coordenador da pesquisa, o quarto no cargo desde 1938, na palestra O Que Torna uma Vida Boa? — Lições do Estudo Mais Longo sobre a Felicidade, do TEDx.
No Brasil, a psicóloga carioca Maria Tereza Maldonado chegou a conclusão semelhante. Para escrever Construindo a Felicidade — A Ciência de Ser Feliz Aplicada no Dia a Dia, da Editora Ideias e Letras (clique aqui para comprar), ela entrevistou, no período de dois anos, 190 pessoas, dos 12 aos 96 anos. Aos entrevistados, perguntou: “Há várias maneiras de ser feliz. Qual é a sua?”.
“Fama, dinheiro ou sucesso? Nada disso garante felicidade”, desmitifica a especialista. “Outro mito: ser feliz não é ausência de problemas. A vida de todos nós inclui desafios a serem vencidos e obstáculos a serem superados. Construir felicidade é saber encarar as dificuldades como oportunidades”, ensina Maria Tereza.
As pessoas são felizes porque têm saúde? Ou são saudáveis porque estão felizes? As duas respostas estão corretas, afirma o psicólogo Edgar Cabanas, professor da Universidade Camilo José Cela, na Espanha.
Uma revisão de mais de 160 estudos confirma que pessoas que se declaram felizes tendem a viver mais e melhor. Segundo o coordenador do trabalho, o psicólogo Edward Diener (1946-2021), da Universidade de Illinois (EUA), pessoas ansiosas, deprimidas e pessimistas adoecem mais e sopram menos velinhas. “A felicidade não é uma poção mágica, mas reduz as chances de ficar doente ou morrer jovem”, concluiu.
Do outro lado do Atlântico, uma pesquisa da Universidade de Tilburg, na Holanda, apresentou resultado diferente. Depois de sabatinar 7,4 mil voluntários de 40 países, o psicólogo Egon Dejonckheere desvendou que a busca da felicidade em si pode trazer efeitos colaterais, como estresse, ansiedade e depressão. Culpa de quem? Das redes sociais, entregam os participantes.
“Você olha o Instagram e só tem gente feliz. Realmente, não sei quem são as pessoas que estão sofrendo com a epidemia de depressão, como diz a Organização Mundial da Saúde (OMS). Na minha timeline é que não estão”, ironiza Nizan Guanaes, que já chegou a passar 15 horas por dia conectado. Para bater a meta atual de no máximo sete horas online, o empresário deixa o celular no banheiro quando vai dormir.
Cabanas acredita que a relação entre saúde e felicidade é uma avenida de mão dupla. “Eu diria que há mais dados a favor da tese que defende que pessoas saudáveis são mais felizes. Elas tendem a se sentir melhor e a ter menos problemas do que as que enfrentam males físicos ou transtornos mentais”, expõe o psicólogo.
Autor do livro Happycracia — Fabricando Cidadãos Felizes, da Ubu Editora (clique aqui para comprar), em parceira com a socióloga franco-israelense Eva Illouz, Cabanas alerta que, embora seja legítimo querer ser feliz, a procura desmedida pela felicidade pode virar fonte de infelicidade. Isso porque ela tropeça na ilusão de que esse sentimento depende única e exclusivamente do indivíduo.
“Partindo desse princípio, se alguém não está feliz, é porque não deu o seu melhor ou não se esforçou o bastante. No fim, sente culpa e frustração por não ter alcançado a felicidade”, esclarece o autor, que criou o termo “happycondríacos” para designar as pessoas que, por mais felizes que estejam, nunca estão satisfeitas e querem sempre um pouco mais.
Há outras “armadilhas”, avisa a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, autora do recém-lançado Felicidade — Ciência e Prática para uma Vida Feliz, da Editora Principium (clique aqui para comprar). Uma delas é acreditar que felicidade é tudo aquilo que os outros postam, curtem ou compartilham nas redes.
A médica brinca que, se as mídias sociais tivessem que ser punidas por divulgar fake news, todas elas, sem exceção, teriam que suspender suas atividades. Ana Beatriz estima que 90% do que é postado ali reflete algum tipo de mentira ou distorção.
“A ditadura da felicidade estabeleceu que quem não é feliz o tempo todo não passa de perdedor ou fracassado. Nada adoece tanto quanto ficar comparando sua vida com a dos outros. Não por acaso, estamos vivendo uma epidemia silenciosa de infelicidade”, lamenta a psiquiatra.
O filósofo Mario Sergio Cortella já disse e repete que, embora seja um desejo permanente, a felicidade é um episódio eventual, não um estado contínuo. Portanto, ninguém consegue, por mais que queira, ser feliz o tempo todo ou para sempre.
Ponderações do gênero estão em pelo menos dois dos seus livros sobre o tema: Felicidade Foi-Se Embora?, da Editora Vozes (clique aqui para comprar), com o religioso Frei Betto e o teólogo Leonardo Boff, e Felicidade: Modos de Usar, da Editora Planeta (clique aqui para comprar), com o historiador Leandro Karnal e o filósofo Luiz Felipe Pondé.
No último, ele conta o episódio em que, durante uma viagem de trabalho a Florianópolis, onde mora sua filha, comprou um presente para a neta, então com 5 anos. Ao abrir o embrulho e deparar com um vestido azul com florzinhas brancas, a menina ficou tão feliz que saiu gritando pela casa e, depois, abriu um sorrisão. “Naquele momento, eu podia morrer. Não queria, mas podia”, confessa o professor e palestrante.
Valorizando momentos assim, também lembramos que vez ou outra é natural ficar infeliz. “Vivências tristes ou melancólicas podem ser contributivas. Mesmo com o ônus do sofrimento, são ocasiões para refletir sobre as causas dos problemas e pensar em alternativas”, afirma Cortella, que acaba de publicar O Tempo e a Vida, da Editora Record (clique aqui para comprar), junto ao físico Marcelo Gleiser.
“A felicidade é um momento de intensa vibração de vida. Quando momentos felizes se ausentam de forma prolongada, vale lembrar o que os antigos diziam: ‘Não há mal que sempre dure, nem bem que nunca se acabe’”, aconselha. E você, já foi feliz hoje?
A ciência da felicidade Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br
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