Nos últimos anos, os brasileiros se acostumaram a ver campanhas de saúde vinculadas a um determinado mês com uma cor própria, sendo os mais conhecidos pela sua tradição o Outubro Rosa, voltado à a prevenção do câncer de mama, e o Novembro Azul, sobre o câncer de próstata. O mês de setembro foi privilegiado nesse sentido, pois encampa três movimentos coloridos: temos o setembro vermelho, para lembrar da importância de cuidarmos do nosso coração; a cor verde remetendo à doação de órgãos; e a amarela, abordando o suicídio.
Mais recentemente, vimos surgir outra campanha neste mês, só que esta não tem uma cor única e nem por isso é menos importante. Estou falando da conscientização sobre a saúde do adolescente, protagonista da campanha #VemProUro, apresentada pela primeira vez em 2018 pela Sociedade Brasileira de Urologia (SBU).
Essa mobilização nasceu da constatação de que os meninos adolescentes não costumam ir regularmente ao médico nessa fase da vida, contrastando com os cuidados mais abrangentes oferecidos às meninas da mesma idade, que costumam ir rotineiramente ao ginecologista logo que menstruam.
Pesquisas da própria SBU mostram que menos de 4% dos adolescentes do sexo masculino frequentam o consultório dos urologistas, e dados similares foram encontrados pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos.
Neste ano, a SBU conseguiu informações inéditas junto ao Ministério da Saúde mostrando que o acesso de meninos de 16 a 19 anos ao Sistema Único de Saúde (SUS) foi três vezes menor que o das meninas – são 2,1 milhões de garotos ante quase 7 milhões de garotas. Esses números provenientes do governo corroboram definitivamente a constatação de uma menor atenção à saúde dispensada para os jovens do sexo masculino.
Sabemos que a adolescência é um período de intensas transformações hormonais, físicas, emocionais e de dúvidas sobre o corpo e a saúde. O ideal, portanto, é que essa fase seja acompanhada por um profissional habilitado, como hebiatra (médico especialista em adolescência para ambos os sexos), urologista (meninos), ginecologista (meninas) ou ainda qualquer outro médico capacitado a trabalhar as características inerentes a essa etapa da vida.
Em 2021, o foco de atenção da #VemProUro são as infecções sexualmente transmissíveis (ISTs). Em pesquisa realizada pela SBU no ano passado, descobrimos que 44% dos adolescentes não usaram preservativos na primeira relação sexual e que 35% não usam ou raramente usam a camisinha.
Sem o uso regular do preservativo, as ISTs nesse grupo populacional vêm crescendo, inclusive com um aumento alarmante de 65% nas taxas de infecção pelo HIV na faixa etária de 15 a 19 anos de 2009 a 2019, de acordo com o Boletim Epidemiológico HIV/AIDS do Ministério da Saúde de 2020.
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Vale lembrar que infecções como gonorreia e clamídia também recrudesceram e são uma importante causa de infertilidade por prejudicarem a integridade do trato reprodutivo, em especial o feminino. A infecção pela sífilis também se elevou de forma alarmante em todas as faixas etárias e as consequências para a saúde podem ser desastrosas se a doença não for tratada de forma precoce e adequada.
Além dessas ISTs, é imperioso lembrar que o HPV é a infecção mais frequentemente encontrada e, na maioria das vezes, de forma assintomática. Entretanto, suas repercussões podem ser bastante sérias: o vírus está diretamente envolvido com o câncer de colo de útero nas mulheres e é fator de risco para câncer de pênis, de ânus, de boca e de garganta.
Felizmente, o SUS oferece à população de meninas de 9 a 14 anos e de meninos de 11 a 14 anos a vacina contra o HPV, evitando que os subtipos de maior risco para o desenvolvimento de tumores malignos sejam transmitidos via sexual. Apesar da importância da vacinação, a cobertura ainda está longe do ideal, com uma média nacional para segunda dose em 65,8% na população feminina e apenas 35,3% nos adolescentes masculinos.
Apesar de a campanha deste ano focar nas ISTs, a consulta do adolescente com o médico deve ser muito mais ampla e abrangente, visando promover a saúde em todos os pilares e a prevenção de doenças e atitudes de risco que possam ser identificadas, como o uso de substâncias ilícitas ou comportamentos que demonstrem uma inadequação social ou alteração psicológica importante.
Considero o atendimento ao adolescente um verdadeiro desafio para o médico, pois, além do conhecimento técnico necessário, é preciso ter a empatia e o acolhimento para que a relação médico-paciente seja forte o suficiente e a confiança do adolescente, conquistada. É inaceitável que a ida ao médico ocorra apenas na vigência de doenças agudas. Isso dificulta a aquisição do hábito de uma medicina preventiva desde cedo.
Precisamos mudar o fato de que o grande evento médico na vida do homem seja a ida ao urologista ao redor dos 45 anos para a avaliação da próstata, ou ao cardiologista por volta da mesma faixa etária. Chegou o momento de nos conscientizarmos de que precisamos cuidar melhor da saúde dos nossos adolescentes e criarmos definitivamente a cultura da promoção da saúde nessa população.
E você, já levou seu filho adolescente ao médico para uma avaliação rotineira e preventiva?
* Daniel Suslik Zylbersztejn é urologista, idealizador e coordenador da Campanha de Conscientização da Saúde do Adolescente Masculino #VemProUro da Sociedade Brasileira de Urologia
Você já levou seu filho adolescente ao médico? Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br
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