As ilhas do Caribe não foram colonizadas uma, mas duas vezes. É o que aponta a maior análise de genoma antigo já realizada na região. A pesquisa publicada na revista Nature sequenciou o genoma de 174 indivíduos que viveram no Caribe entre 3,2 mil e 400 anos atrás – e revelou novas informações sobre o povoamento da região.
As amostras foram coletadas em sítios arqueológicos nas Bahamas, Haiti, República Dominicana, Porto Rico, Curaçao e Venezuela. Pesquisadores da Universidade de Harvard extraíram amostras de DNA das ossadas que estavam preservadas para sequenciá-las.
Antes de chegar às conclusões, vale lembrar no que consiste esse sequenciamento. O nosso DNA é formado pelas bases nitrogenadas adenina, timina, citosina e guanina, abreviadas pelas letras A, T, C e G. Elas estão repetidas 3 bilhões de vezes no genoma de cada indivíduo, formando uma configuração única que determina as diferenças entre as pessoas. Pessoas que pertencem ao mesmo grupo étnico possuem porções do genoma mais semelhantes, sendo possível determinar o grau de parentesco entre os indivíduos.
O novo estudo mapeou o genoma dessas 174 ossadas e comparou o resultado com genomas de outros 89 indígenas que habitaram as ilhas antes da chegada de Cristóvão Colombo. Esses já haviam sido sequenciados anteriormente.
A principal conclusão do estudo é que a migração para o Caribe ocorreu em duas etapas. Os primeiros habitantes da região chegaram há cerca de 6 mil anos. Vestígios arqueológicos mostram que eles utilizavam instrumentos de pedra e ainda não dominavam a cerâmica.
Acontece que as características genéticas desse primeiro povo não foram observadas no genoma dos povos que habitavam o Caribe quando os marinheiros espanhóis chegaram, em 1492. O estudo indica que 98% do povo “original” foi substituído por uma outra linhagem, que chegou na região há 2,5 mil anos.
Os povos desta segunda migração saíram da América do Sul e foram navegando de ilha em ilha pelo Caribe. Eles já dominavam a cerâmica e eram próximos geneticamente dos falantes de línguas Aruaque – como a etnia palicure, que habita o norte do Amapá, e os piapocos, presentes na Venezuela e Colômbia. As análises indicam a proximidade genética entre os caribenhos da segunda onda e esses grupos indígenas.
Os povos de língua aruaque utilizavam rios para transportes de longas distâncias, o que logo pode ter evoluído para o transporte marítimo entre as ilhas. Foi observada uma diminuição drástica da população arcaica após a chegada da população cerâmica – o que indica uma colonização violenta ou a introdução de uma nova doença. Um outro estudo publicado na Science em julho deste ano também corrobora a teoria de duas migrações.
A única exceção observada é a ilha de Cuba. Lá, os indígenas presentes antes da chegada de Colombo descendiam majoritariamente da primeira linhagem de caribenhos. A maior parte dos indígenas do Caribe, seja da primeira ou da segunda onda migratória, foram dizimados após a colonização espanhola.
No entanto, ainda é possível encontrar parte de seu DNA nas populações atuais, o que significa que alguns deles deixaram descendentes. O grupo de pesquisadores calcula que 14% do genoma dos habitantes de Porto Rico descende dos povos da segunda onda migratória. Nos atuais cubanos, esse valor cai para 4%.
Outra novidade do estudo é apontar que provavelmente existiam menos indivíduos no Caribe do que o indicado nos registros europeus. Os relatos da época de Colombo apontavam 3,5 milhões de indígenas na ilha onde hoje ficam o Haiti e a República Dominicana. No entanto, os modelos matemáticos baseados no novo sequenciamento estimam a presença de alguns milhares de habitantes.
Povoamento do Caribe se deu em duas ondas migratórias, indica análise de DNA Publicado primeiro em https://super.abril.com.br/feed
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