1. Coronavírus: de “gripezinha” a maior pandemia desde a gripe espanhola
Desde a detecção do primeiro caso de infecção pelo coronavírus (Sars-CoV-2) no fim de 2019, foram registrados 75 milhões de pessoas com Covid-19 e mais de 1,5 milhão de mortes. No Brasil, são 7 milhões de infectados e quase 190 mil óbitos até o dia 21 de dezembro.
Números assim contrastam com o descaso com o qual a pandemia foi tratada por parte considerável da sociedade brasileira. E a Covid-19 aproveitou a negligência para provocar estragos. O desleixo com os cuidados no fim de ano e o aumento de novos casos e mortes é prova disso. Mesmo com uma subnotificação nacional de casos considerável, estamos no top 20 de maior número de mortes por milhão de habitantes.
Precisamos retornar para 1918 se quisermos encontrar outra pandemia tão devastadora. Na época, a gripe espanhola deixou um saldo de 500 milhões de infectados e 17 a 50 milhões de óbitos (os números são tão díspares porque, na época, o monitoramento era mais difícil).
2. Pane no sistema de saúde
Com o foco dos profissionais da saúde voltado ao combate ao coronavírus e com o colapso de redes de atendimento hospitalar, outras enfermidades também foram afetadas.
Uma pesquisa da Johnson & Johnson Medical Devices (JJMD), em parceria com a IPSOS, aponta que o diagnóstico de novos casos de câncer caiu cerca de 70% nos primeiros meses da pandemia no Brasil, por exemplo. E isso, claro, não ocorreu porque os tumores magicamente foram menos incidentes em 2020. Na realidade, a quantidade de pessoas se consultando e fazendo exames caiu — e isso vai cobrar seu preço lá na frente, quando cânceres em estágio mais avançado começarem a pipocar.
Além disso, parte dos brasileiros que apresentaram sintomas de infarto e acidente vascular cerebral (AVC) adiaram a busca por ajuda médica ou simplesmente não procuraram. Daí porque as mortes por doenças cardiovasculares em casa aumentaram.
3. Como ficou nossa saúde durante o isolamento
A necessidade de ficar em casa para quebrar a cadeia de transmissão do Sars-CoV-2 obrigou a população a adaptar seu estilo de vida. Um levantamento da Fundação Instituto de Administração (FIA), realizada em abril com 139 empresas no nosso país, revela que 46% adotou o modelo de home office na quarentena.
E a vida profissional não foi a única afetada. O maior tempo passado em casa interferiu na alimentação. A partir de certos experimentos, dá para inferir que mulheres e pessoas com mais dinheiro passaram a comer melhor, enquanto homens e gente mais pobre começou a abusar de itens pouco saudáveis.
O bem-estar mental, claro, também foi comprometido. Sinais de ansiedade e depressão se multiplicaram.
4. Telemedicina chegando pra ficar
Ela existia por aqui desde 2002, mas com um uso limitado a situações de emergência e emissão de laudos. Ou de maneira mais informal, via WhatsApp, por exemplo.
Entretanto, em março de 2020, o Conselho Federal de Medicina (CFM) a liberou para ser utilizada de forma abrangente enquanto a pandemia durar.
O número de atendimentos à distância cresceu bastante nesse período. Eles auxiliaram não apenas no combate à Covid-19, mas também amparando os pacientes com outras condições, o que evitou idas desnecessárias a consultórios e hospitais.
Tudo indica que essa ferramenta permaneça entre nós após o fim do surto de coronavírus.
5. A corrida das vacinas para Covid-19
Em 2020, cientistas do mundo todo se uniram em prol de uma causa: criar uma vacina eficaz e segura contra o novo coronavírus. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), até outubro, mais de 190 candidatas estavam em desenvolvimento.
Entre elas, dez se encontram nas fases avançadas das pesquisas, sendo que as criadas pelos laboratórios Pfizer/BioNTech e pela Moderna foram recentemente liberadas para uso emergencial em alguns países.
O tempo entre a descoberta de um agente infeccioso e a liberação de uma vacina nunca foi tão rápido, o que não significa que as doses contra a Covid-19 são inseguras! Até o momento, o imunizante que liderava esse ranking era o do sarampo, que levou dez anos para ser produzido e disponibilizado. Já a criação da Pfizer/BioNTech demorou dez meses.
Além disso, as opções da Pfizer/BioNTech e da Moderna são as primeiras “vacinas genéticas”, assim por dizer. Elas utilizam apenas o RNA do vírus para despertar a imunidade do organismo. E nem precisamos dizer que elas não mexem com o nosso DNA (nem conseguem chegar a ele, pra falar a verdade).
6. O fracasso da cloroquina
Na busca por um tratamento específico para a Covid-19, a hidroxicloroquina e a cloroquina despontaram como grandes concorrentes devido aos resultados de um pequeno estudo francês. Só que rapidamente cientistas independentes notaram que o experimento havia sido muito malconduzido.
Depois dele, os estudos com a metodologia necessária para averiguar a eficácia de um remédio qualquer descobriram que a cloroquina e a hidroxicloroquina não funcionam contra a Covid-19 (apesar de serem úteis diante da malária e de certas doenças reumatológicas).
A OMS, inclusive, suspendeu os testes com essas moléculas ao observar a ineficácia e o surgimento de certos efeitos colaterais em pacientes com coronavírus. A insistência em utilizar esses medicamentos, especialmente como parte de um tratamento precoce (o que também carece de evidência), virou um símbolo da politização negativa da ciência da saúde.
Mas esse não foi o único remédio colocado no posto de salvador da pátria. Ivermectina, nitazoxanida e azitromicina têm sido empregadas até como forma de prevenir a Covid-19, principalmente no Brasil, ainda que sem evidências.
7. A evolução no tratamento da Covid-19
As notícias negativas do item anterior não descartam as evoluções que observamos na luta contra essa enfermidade. Os profissionais da saúde aprenderam estratégias mais viáveis para impedir o agravamento da doença. A adesão a essas medidas, que vai do acompanhamento com o oxímetro a um ajuste no momento certo de intubar o paciente, tem salvado vidas.
Fora isso, estudos comprovaram que a dexametasona, um tipo de corticoide, reduz o risco de morte em casos graves de Covid-19. Por outro lado, esse remédio não é uma boa em pessoas com quadros leves.
O emprego de anticoagulantes, que evitam tromboses disparadas pelo novo vírus, também tem beneficiado os enfermos.
8. Infodemia e notícias falsas na maior pandemia do século
A exposição a um número excessivo de informações — verdadeiras ou não — ganhou o nome de infodemia. E essa encrenca pode abalar a qualidade de vida, mesmo se as notícias acompanhadas não forem falsas.
Agora, em caso de fake news, os estragos são gigantescos. Quem acreditava que vestir máscaras fazia mal expôs a si próprio e aos outros. O mesmo vale para balelas que foram ditas sobre álcool gel, isolamento social, vacinas etc.
Um estudo da Avaaz ouviu 2 002 brasileiros em abril. Resultado: 94% haviam visto no mínimo uma notícia falsa sobre o Sars-CoV-2. E 73% dos entrevistados acreditavam que pelo menos uma dessas informações era real ou provavelmente verdadeira.
9. Queda nos índices de vacinação
Nem só de Covid-19 viveu 2020. Apesar da ansiedade pelo começo da vacinação contra o coronavírus, nunca nos imunizamos tão pouco frente a outras infecções. Um estudo de várias entidades mostrou que, entre os países avaliados, 73% sofreram algum tipo de suspensão ou restrição em seus programas de imunização em maio.
Esse cenário, que afetará principalmente as crianças, já vinha se arrastando há algum tempo no Brasil. Outro levantamento descobriu que, em 2019, a cobertura de dez imunizantes aplicados em bebês de até 1 ano ficou abaixo do recomendado.
10. Escetamina é aprovada no Brasil
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberou a utilização do cloridrato de escetamina, primeiro remédio aplicado via spray nasal para tratar a depressão resistente. E a via de uso é a questão menos importante aqui. O fato é que, após décadas sem grandes novidades, surge um antidepressivo com grande capacidade de atenuar até mesmo os casos mais complexos da doença.
Mesmo sendo considerada a maior novidade no combate a essa doença em muitos anos, a droga (da farmacêutica Janssen) só pode ser administrada em ambientes hospitalares, e com restrições. Isso porque provoca efeitos colaterais como sensação de dissociação do próprio corpo — e há o risco de abuso.
11. Mais um paciente curado do aids
Um brasileiro foi o quarto felizardo no mundo a se livrar do HIV. Ele alcançou esse feito durante um estudo realizado pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) com outros 29 pacientes soropositivos.
Com a terapia recebida na investigação, sua carga viral foi zerada e, após doze meses, não havia sinais da infecção. Os experts ainda estão acompanhando o caso (e os outros enfermos não tiveram a mesma sorte), porém a notícia renovou as esperanças na busca de uma cura contra a aids.
12. O novo modelo de rótulo para alimentos industrializados
Após quase seis anos, a Anvisa enfim divulgou as novas normas para rotulagem de bebidas e alimentos industrializados no Brasil. Ficou decidido que as embalagens de produtos que apresentarem alta quantidade de açúcar, sódio e gordura saturada deverão ter um símbolo de lupa estampado.
Além disso, a tabela nutricional vai precisar informar o teor de açúcar adicionado, um dado que não é obrigatório no padrão atual. As empresas têm até dois anos para se adequar à nova regra (o que foi considerado um tempo muito grande por associações de defesa ao consumidor).
13. Tendência de alimentação plant based
Em 2020, o brasileiro reduziu o consumo de carne. Foi o que revelou um levantamento encomendado pelo The Good Food Institute (GFI) e realizado pelo Ibope. Metade dos 2 mil participantes diminuíram a ingestão de carnes nos últimos 12 meses.
O lançamento de diferentes marcas de hambúrguer vegetal — e a incorporação deles em redes de fast food — reforça a tendência da alimentação plant based. Ao mesmo tempo, ilustra como itens sem origem animal também podem ser pouco saudáveis.
14. Revogação da restrição de doação de sangue por homossexuais
Em julho, a Anvisa eliminou uma determinação que impedia a doação de sangue por homens que tivessem feito sexo com homens nos 12 meses anteriores. A mudança aconteceu após julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), no qual foi concluído que a restrição era inconstitucional.
As diretrizes do Ministério da Saúde foram atualizadas e, desde então, homens homossexuais estão liberados para doar sangue sem preconceito.
15. Aprovação da primeira terapia gênica
Para finalizar, uma notícia do presente, mas com ares de futuro. Pela primeira vez, uma terapia gênica está disponível em solo verde e amarelo.
Desenvolvida pelo laboratório Novartis, a novidade trata a Distrofia Hereditária da Retina (DHR), um problema de origem genética que provoca perda de visão em crianças e adolescentes.
A ideia é introduzir genes saudáveis no organismo para corrigir os defeituosos que estão por trás de algumas enfermidades. Esse feito inédito representa um avanço enorme na luta contra doenças raras — ora, é possível vislumbrar a cura com esses tratamentos. Por outro lado, o preço da terapia gênica é proibitivo.
Retrospectiva 2020: 15 fatos que marcaram a saúde (não tem só Covid-19!) Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br
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