Um estudo recém-divulgado, conduzido por pesquisadores brasileiros, avalia o uso da nitazoxanida contra casos moderados de Covid-19. O vermífugo chegou a integrar o “kit” de tratamento precoce, mas ainda não há dados suficientes para embasar sua aplicação neste contexto.
O novo trabalho, publicado na revista científica E-Clinical Medicine, incluiu 50 indivíduos já internados com sintomas moderados da Covid-19. Eles foram divididos em dois grupos – metade tomando um placebo, metade tomando o comprimido, em dosagem diferente da vendida na farmácia.
Os voluntários que receberam a nitazoxanida tiveram alta mais cedo, em média em seis dias, ante 14 dias de hospitalização no braço do placebo. Houve ainda maior redução da carga viral e de substâncias inflamatórias nos participantes que tomaram o medicamento real.
Os autores destacam que esse estudo é uma prova de conceito – ou seja, uma espécie de teste inicial que diz se o remédio merece ou não investigações mais aprofundadas, em ensaios clínicos maiores. É preciso tanto confirmar os achados em mais gente quanto ter certeza sobre a segurança do medicamento.
“Sabemos, por exemplo, que a hidroxicloroquina não é segura para quem está com Covid-19, assim como a aspirina também não é indicada para quem tem dengue”, explica Ricardo Diaz, professor de infectologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), um dos autores da pesquisa.
O risco de tratamentos não embasados com evidências científicas sólidas é a piora da doença e até a morte.
Limitações do estudo
É cedo para tirar conclusões otimistas por alguns motivos. Primeiro, porque a prova foi feita com poucas pessoas, justamente por ser uma etapa exploratória, para testar um conceito, explica Alexandre Zavascki, infectologista do Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre (RS).
“Uma investigação como essa não busca estabelecer a eficácia de uma medicação, apenas levanta uma primeira hipótese, que deverá a partir daí ser confirmada”, esclarece o médico gaúcho.
Alguns aspectos do protocolo do ensaio dificultam ainda uma análise aprofundada por outros especialistas. A falta de detalhes e informações conflitantes sobre o estado de saúde dos participantes, por exemplo.
“Um dos critérios foi incluir maiores de 18 anos com taxa de saturação de oxigênio menor que 96, população que, além de ser bem abrangente, está em uma faixa que pode configurar Covid-19 grave. O texto, no entanto, informa que os indivíduos manifestaram a doença moderada”, questiona Zavascki.
Fora isso, uma pesquisa maior feita por cientistas brasileiros, com 475 pessoas, não trouxe resultados positivos sobre o uso da nitazoxanida no tratamento da Covid.
O trabalho, publicado no European Respiratory Journal, capitaneado pela cientista Patrícia Rocco, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mostrou que a nitazoxanida diminuiu a carga viral de voluntários com Covid-19, mas não fez diferença na melhora dos sintomas.
“Quando já houve um estudo maior, a possibilidade de ter algo realmente novo em uma pesquisa menor diminui”, completa Alexandre.
A nitazoxanida
Trata-se de um composto utilizado há décadas para tratar diversos tipos de parasitas, como amebas e giárdias, que já foi estudado por sua atividade antiviral. “Evidências preliminares anteriores mostram que ele pode ter ação contra outro vírus, como o ebola, e o influenza, da gripe”, esclarece Diaz.
Testar opções disponíveis é uma estratégia comum da busca por tratamento diante de uma urgência. “Com uma doença nova como a Covid-19, não há tempo de desenvolver medicamentos, então realizamos pesquisas com fármacos já existentes no mercado”, complementa o infectologista.
Que tratamentos já foram aprovados?
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), aprovou o medicamento REGN-COV2 para pessoas com Covid-19 nos primeiros dias dos sintomas e que não foram internadas, mas que possuem risco maior de desenvolver quadros graves. O coquetel contém dois anticorpos monoclonais, casirivimabe e imdevimabe, e é aplicado via infusão intravenosa.
O medicamento remdesivir, da biofarmacêutica americana Gilead Sciences, também foi aprovado pela agência em março deste ano, mas para pessoas internadas recebendo suplementação de oxigênio.
Tratamentos e vacina são aliados
Para os especialistas, a busca por tratamentos contra o coronavírus é importante para superar a pandemia. “A circulação do vírus entre a população só será reduzida com três fatores: a adoção de medidas não farmacológicas (máscaras e distanciamento social), a imunização em massa e a medicação eficaz, que trata o indivíduo e impede que ele transmita a doença”, explica Ricardo.
Por isso, as corridas por imunizantes e drogas ocorrem juntas. “Nenhuma vacina é 100% eficaz, por isso é preciso ter opções terapêuticas para quem se contaminar”, opina o médico Vinicius Blum, gerente executivo de Assuntos Médicos e Pesquisa Clínica da FQM Farma, um dos envolvidos na nova pesquisa.
Resta saber se a nitazoxanida poderá ser parte deste arsenal. “Apesar de ser um estudo pequeno e de ter enfrentado dificuldades, acreditamos que é um bom passo, dentre muitos que ainda precisam ser dados”, avalia Blum, um dos cientistas que assina o trabalho.
A terceira fase da investigação, que deve trazer respostas neste sentido, já começou, com 400 participantes. Ainda não há data prevista para a apresentação dos resultados.
Nitazoxanida contra Covid-19: estudo traz sinais positivos, com limitações Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br
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