terça-feira, 18 de julho de 2023

Mais de 400 mil crianças brasileiras não tomaram vacinas básicas em 2022

A pandemia de Covid-19 impactou o funcionamento dos serviços de imunização infantil de rotina, levando a quedas significativas nas coberturas vacinais em todo o mundo.

Agora, os esforços dos países para contornar este retrocesso histórico apresentam seus primeiros frutos.

É o que apontam dados inéditos divulgados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) nesta terça-feira, 18. Em 2022, foram alcançadas por ações de vacinação 4 milhões de crianças a mais em comparação com o ano anterior.

Os indicadores globais representam avanços, mas destacam a necessidade de investimento contínuo na recuperação, atualização e fortalecimento dos sistemas.

No ano passado, 20,5 milhões de meninos e meninas do mundo deixaram de receber uma ou mais vacinas nos serviços de rotina. Em 2021, foram 24,4 milhões.

O número mais recente é superior ainda aos 18,4 milhões que deixaram de ser imunizados em 2019, período anterior às interrupções ocasionadas pela pandemia. A queda generalizada nas coberturas começou a se acentuar por volta de 2016.

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Crianças “zero-dose”

Os pesquisadores da OMS e do Unicef utilizam a vacina contra difteria, tétano e coqueluche (DTP ou tríplice bacteriana) como indicador global de cobertura.

“Globalmente, a DTP é a primeira fórmula dada à criança. Quando isso não acontece, supõe-se, a partir de um cálculo matemático muito preciso, que ela não tomou nenhuma outra vacina”, explica Luciana Phebo, chefe de saúde do Unicef no Brasil.

Cerca de 14 milhões de crianças não receberam nenhuma dose da DTP. Portanto, são classificadas como “zero-dose”. Esse número representa uma melhoria em relação aos 18,1 milhões de crianças nessa situação em 2021.

No país, o número de crianças que não receberam nenhuma dose da DTP caiu de 710 mil para 430 mil entre 2021 e 2022.

A cobertura da DTP, administrada pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI) como vacina pentavalente, avançou 5 pontos percentuais, chegando a 84%. Para a vacina contra a poliomielite, o número avançou 6 pontos, entre 2021 e 2022, chegando a 77%.

Hesitação vacinal

A cultura da vacinação faz parte dos hábitos do brasileiro desde os primeiros momentos da vida. No entanto, o país enfrenta quedas acentuadas nas coberturas desde 2016, que atingiram os níveis mais baixos da história nos últimos anos.

A hesitação vacinal (atraso ou recusa em tomar as vacinas) é atribuída a causas multifatoriais, incluindo a circulação de informações falsas recebidas por meio das redes sociais, mudanças em sistemas de informação, dificuldade de acesso aos serviços de saúde, crescimento de movimentos antivacinas e a perda da percepção de risco das doenças preveníveis pela imunização.

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A chefe do Unicef explica que a eliminação de males como o sarampo, por exemplo, obtida com amplo esforço coletivo, fez com que pais e responsáveis deixassem de perceber a necessidade e importância do imunizante.

“Parece estranho, mas o sucesso da estratégia é um dos motivos de diminuição da procura pelos postos. Só que chegamos nesse momento, em que as pessoas não conhecem ninguém que tenha tido sarampo ou adquirido poliomielite, justamente porque a vacina funciona”, afirma Luciana.

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Em 2022, 20,5 milhões de crianças deixaram de receber uma ou mais vacinas por meio dos serviços de imunização de rotinaFoto: Cristine Rochol/PMPA/Divulgação
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Cenário brasileiro

A ampliação das coberturas vacinais no país é considerada uma das prioridades do Ministério da Saúde sob a gestão de Nísia Trindade.

Na segunda-feira (17), a ministra anunciou a destinação de mais de R$ 151 milhões a estados e municípios para incentivar as ações de multivacinação de crianças e adolescentes.

“Essa é uma ação inédita, que traz um diferencial estratégico para a retomada das altas coberturas. A situação atual expõe nossa população ao risco de desenvolver doenças já controladas, como a poliomielite e o sarampo, que podem causar sequelas importantes e levar ao óbito”, afirma a Secretária de Vigilância em Saúde e Ambiente, do Ministério da Saúde, Ethel Maciel.

+ Leia também: O que é a poliomielite e por que ela preocupa tanto?

Segundo o ministério, a transferência dos recursos vai acontecer em duas etapas. A primeira, com 60% do valor total, e a segunda após o fechamento das ações de planejamento. Do total, R$ 13 milhões serão destinados aos estados e R$ 138 milhões para os municípios.

“O relatório publicado pelo Unicef traz um aspecto importante, que é a relação das baixas coberturas com a condição socioeconômica da população, demonstrando que as parcelas com menores condições também apresentam menor adesão à vacinação”, afirma Ethel.

“Por isso, atrelar o recebimento do Bolsa Família e dos demais benefícios sociais do governo à atualização da caderneta de vacinação é uma ação fundamental para que nosso Programa Nacional de Imunizações possa novamente ser referência mundial”, completa.

A medida havia sido abandonada pelo governo, mas foi retomada na gestão Lula.

Progresso desigual

A região das Américas é atualmente uma das piores do mundo no contexto da cobertura vacinal, de acordo com a OMS.

Em abril, Jarbas Barbosa, diretor da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), entidade vinculada à OMS, alertou que o risco de surtos de doenças evitáveis com a vacinação nas Américas atingiu o nível mais alto em 30 anos.

De acordo com o Unicef, as primeiras etapas da recuperação não ocorreram de forma igualitária no mundo, com a melhoria concentrada em alguns países.

O progresso em nações com recursos e grandes populações de bebês, como Índia e Indonésia, mascara uma recuperação mais lenta ou até mesmo declínios contínuos na maioria dos países de baixa renda, especialmente na vacinação contra o sarampo.

Dos 73 países que registraram quedas significativas na cobertura durante a pandemia, apenas 15 se recuperaram aos níveis pré-pandemia, 24 estão a caminho da recuperação, enquanto 34 estagnaram ou continuaram em declínio.

+ Leia também: O sarampo voltou. O que está por trás disso?

O sarampo, uma das mais contagiosas doenças infecciosas que podem ser prevenidas por vacina, está entre as recuperações mais lentas. Segundo o Unicef, mais de 35,2 milhões de crianças estão em risco de infecção.

No Brasil, a cobertura para o sarampo chegou a 81% – melhores que a cifra de 73% em 2021, mas ainda aquém dos 91% em 2019.

“Até que mais países corrijam essas lacunas, as crianças em todo o mundo permanecerão em risco de morrer de doenças que podemos evitar. Vírus como o sarampo não reconhecem fronteiras”, afirmou Catherine Russell, diretora-executiva do Unicef, em comunicado.

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