“Encontrada a cura para o câncer!” Não há como não se emocionar com uma notícia dessas, tanto para quem lê quanto para quem escreve.
O problema é que câncer é uma palavra genérica demais e refere-se a uma grande família de doenças que têm como base a multiplicação descontrolada das células. Células anormais que podem acabar dominando uma região do corpo, migrar e colonizar outras áreas.
Cada tipo de câncer (ou, para usar a denominação técnica, neoplasia) é diferente em suas causas, prognóstico e tratamento. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), se juntarmos essas doenças no mesmo pacote, teremos a principal causa de morte na humanidade, ao lado dos problemas cardiovasculares.
Foram 10 milhões de óbitos em 2020, influenciados por fatores de risco como tabaco, álcool, excesso de exposição solar e, lá vêm eles, vírus.
Foi lá em 1908 que apareceu a primeira notícia de um vírus causando a enfermidade, quando dois pesquisadores dinamarqueses mostraram que um câncer do sangue de galinhas era provocado por um agente infeccioso e que o câncer podia ser transmitido experimentalmente de uma ave para outra.
Chamado de vírus da leucose aviária, o micróbio em questão é um retrovírus, da mesma família do vírus HIV da aids. Os retrovírus são muito bons em enxertar o genoma deles no dos seus hospedeiros e aí fica bem difícil se livrar deles.
Em 1964, foi um grande golpe o achado do primeiro vírus cancerígeno em humanos, o Epstein-Barr. Ele foi associado ao linfoma de Burkitt (todos esses nomes aí são em homenagem a cientistas envolvidos nas descobertas). O Epstein-Barr é um herpesvírus, da mesma família do outro herpervírus que dá feridas nos lábios em humanos.
Um truque especial dos herpesvírus é que eles conseguem estacionar o genoma deles no núcleo das células, mas sem se intrometer no genoma como os retrovírus. O DNA deles fica em forma circular e bem quietinho, até que a imunidade caia e ele saia da dormência.
Dali a pouco veio nova revelação. Mais um grupo viral acusado de causar câncer, os papilomavírus. Seu nome vem do latim papillo (mamilo, por causa do formato das lesões) e oma (neoplasia). Esses vírus de DNA, caso do HPV, causam desde verrugas até o câncer de colo do útero, e, como você deve saber, é transmitido sexualmente.
Por fim, os vírus das hepatites B e C, já tratados por aqui, também podem levar ao câncer, desta vez no fígado, se não forem contidos a tempo.
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Seja qual for o vírus cancerígeno ou oncovírus, como são mais propriamente denominados, esses micro-organismos acabam desregulando o ciclo de vida normal das células, que passam a se reproduzir descontroladamente.
Isso compromete o tecido ou órgão afetado (pode ser o sangue, o fígado, o útero…), que não consegue mais fazer seu trabalho direito.
O câncer causado por vírus então se diferencia de outros porque é transmissível e alguns podem levar muito tempo para se manifestar até que sejam detectados. E é bom que se diga que outros micróbios podem causar tumores, como a bactéria Helicobacter pylori, por trás do câncer estomacal.
O primordial para o sucesso no tratamento de um câncer é diagnosticar quanto antes. Tumores nas mamas, na próstata ou no colo do útero podem ser flagrados precocemente com exames largamente disponíveis, por exemplo.
E hoje contamos com medicamentos cada vez mais capazes de matar as células cancerosas sem tantos estragos nas células saudáveis. Claro que isso envolve desafios, a começar pelo acesso célere aos melhores exames e terapias na rede pública.
Mas, para boa parte dos cânceres causados por vírus, temos outra saída, a vacinação. Temos imunizantes contra HPV e contra hepatite B eficientes, seguros e fornecidos pelo Ministério da Saúde. Em se tratando de câncer, ninguém deve duvidar de que prevenir é sempre melhor do que remediar.
O que os vírus têm a ver com o câncer? Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br
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