Os estudos populacionais e a simples observação do entorno evidenciam que as crianças estão cada vez mais acima do peso e expostas precocemente ao que antes era considerado “doença de adulto”, como diabetes tipo 2, hipertensão e colesterol alto.
Hoje, sobretudo em nações de menor renda, a obesidade já coexiste com a desnutrição. No Brasil, os últimos 40 anos foram marcados por um processo de transição nutricional, com o declínio contínuo da desnutrição (a boa notícia) e o aumento progressivo do excesso de peso (a má notícia).
Enquanto a desnutrição ainda afeta mais grupos vulneráveis e bolsões de pobreza, os indicadores de obesidade cresceram em diversas faixas, mas principalmente nos estratos de menor escolaridade. Isso escancara um cenário de insegurança alimentar e nutricional nas camadas menos privilegiadas da população.
A prevalência de obesidade infantil saltou cinco vezes nos últimos 13 anos. Segundo dados do SUS de 2019, 13% das crianças de 5 a 9 anos e 7% dos adolescentes de 12 a 17 anos se encontram obesos. E a pandemia de Covid-19, com todas as suas restrições sociais, só veio acentuar o processo de ganho de peso.
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E a alimentação com isso? O acúmulo de gordura e a persistência da carência de nutrientes são um reflexo da má qualidade da dieta do brasileiro mais jovem. É algo que vai além do peso: o Ministério da Saúde calcula que 20% dos pequenos com menos de 5 anos apresentam anemia por falta de ferro e 17%, déficit de vitamina A.
Nossa situação alimentar é, portanto, complexa, e o enfrentamento dos problemas demanda ações conjuntas de todos os setores da sociedade. O governo deve atuar na atenção básica à saúde — fornecendo orientação e assistência —, promover espaços adequados para a prática de exercícios e esportes, regulamentar alimentos e bebidas (e a respectiva publicidade destinada a crianças) e aprimorar os programas de alimentação escolar.
A escola, aliás, é um excelente ambiente para ensinar e cultivar bons hábitos — até porque parte do tempo e das refeições da criançada acontece ali. A indústria, por sua vez, tem de colaborar com o desenvolvimento de produtos de melhor qualidade nutricional e com uma comunicação clara e responsável com o consumidor.
À família também cabe uma parcela da solução. Os efeitos da rotina e do ambiente doméstico não podem ser subestimados. Daí a importância de organizar a aquisição e o preparo dos alimentos para as refeições principais e os lanches intermediários. Os horários de comer devem ser preestabelecidos e o uso de telas à mesa, desestimulado.
Temos dados robustos de que, quanto maior o número de refeições em família, menor o risco de problemas nutricionais. O horizonte é desafiador, sem dúvida, e as responsabilidades devem ser endereçadas a cada esfera para que ninguém deixe de fazer sua parte. Não existe receita mágica, mas a união de todos esses agentes e ingredientes pode alimentar a transformação. O futuro agradece.
Onde estamos errando na alimentação infantil? Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br
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