Imaginem uma bomba d´água, construída justamente para a finalidade de levar o recurso a uma série de famílias, mas que, por algum defeito, não consegue cumprir a tarefa com eficiência. O resultado será o abastecimento irregular das casas. O coração é essa “bomba” e um dos “defeitos” é a insuficiência cardíaca (IC), uma síndrome clínica que impossibilita o órgão de bombear sangue suficiente para todas as necessidades do corpo.
A insuficiência cardíaca é classificada como doença secundária, uma vez que é consequência de outras patologias prévias, como doenças arteriais coronarianas (infarto), hipertensão, fibrilação atrial, doença renal, doença pulmonar crônica, miocardite, obesidade, doença de chagas e distúrbios da tireoide.
A gravidade da insuficiência cardíaca se traduz em números: mesmo com a tecnologia dos medicamentos, que já comprovaram redução de óbitos e estabilização do quadro, ela afeta mais de 23 milhões de pessoas no mundo.
Após cinco anos de diagnóstico, a sobrevida é de apenas 35%, ou 17,4% em pacientes acima dos 85 anos. Dependendo das características, estima-se que até 80% dos homens e 70% das mulheres morram em até oito anos.
No Brasil, é uma das principais causas de óbito, e é a primeira responsável por internação após os 65 anos.
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Além da caixinha de remédios
Muito embora os remédios sejam condição sine qua non para controlar a insuficiência cardíaca, cuidados com a alimentação, com dietas prescritas caso a caso, contribuem para minimizar sintomas e melhorar a qualidade de vida, uma vez que a doença não tem cura.
Quando falamos em insuficiência cardíaca avançada, duas orientações dietéticas ficam no topo da lista: o controle do consumo de sal e também de líquidos.
A recomendação para o consumo saudável de sal, segundo a OMS, é de uma colher de chá por dia (5 gramas) para a população em geral, mas pode chegar a apenas 2 gramas diários quando a patologia está fora de controle.
Estudos comprovam que a intervenção conduzida por nutricionista, com restrição de sódio de 2 a 3 gramas/dia, melhora, inclusive, o inchaço de membros inferiores, sintoma comum entre os pacientes.
Um padrão alimentar saudável, com a adoção de dietas como a DASH ou Mediterrânea, ricas em antioxidantes e potássio, é indicada para atingir a restrição de sódio sem comprometer a qualidade nutricional.
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Já em relação aos líquidos, os internados por desequilíbrio da doença devem consumir só de 800 a 1 500 ml ao dia.
Entretanto, para manter o conforto do paciente, cabe ao nutricionista encontrar um caminho para adequar essa quantidade de líquido permitida às preferências para matar a sede: águas, sucos, chás, caldos e frutas suculentas. Tudo entra na contagem do dia.
E nem pensar em bebidas alcóolicas, que desidratam ainda mais e, em excesso, prejudicam a função cardíaca.
Nunca é demais lembrar que o tabagismo – que piora as condições cardiovasculares – deve ser extinto por todos.
A obesidade e o excesso de peso estão associados a diversas comorbidades, como hipertensão, dislipidemias e diabetes, que aumentam o risco de problemas cardiovasculares. Além disso, estão relacionados a alterações hemodinâmicas e anatômicas capazes de contribuir para o desenvolvimento da insuficiência cardíaca.
Por isso, o controle do peso e dos fatores de risco, por meio da adoção de hábitos de vida saudáveis, é fundamental para a prevenção do quadro.
Mas, atenção: a necessidade de emagrecimento para pessoas desse grupo deve ser cuidadosamente avaliada pela equipe multidisciplinar.
Condições associadas
Além das alterações cardíacas, certas condições clínicas podem estar ligadas à insuficiência cardíaca.
A anemia é um exemplo: ela leva ao agravamento do quadro cardíaco e se associa a um pior prognóstico do paciente. Para o tratamento, recomenda-se alimentação rica em ferro, ácido fólico, vitamina B12 e vitamina C. Não raro também será necessária a reposição intravenosa de ferro.
O mesmo acontece com a insuficiência renal. A falha cardíaca em si pode prejudicar os rins – e as altas doses de diuréticos ministrados durante a hospitalização pioram ainda mais o cenário.
Porém, as equipes de nutrição não recomendam restrição proteica severa, como normalmente é indicado para quem tem insuficiência renal, devido alto risco de desnutrição dos hospitalizados por insuficiência cardíaca. Mas o consumo deve ser orientado para que não haja sobrecarga aos rins.
A fibrilação atrial, um tipo de arritmia comum nos pacientes com insuficiência cardíaca, leva ao aumento do risco de complicações tromboembólicas, como o AVC isquêmico, e vai requerer anticoagulantes via oral.
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Nesse caso, o acompanhamento nutricional é essencial, uma vez que o consumo de alimentos contendo vitamina K (como óleos vegetais e folhas verdes escuras) interfere no efeito de alguns anticoagulantes.
Já entre os alimentos bem-vindos, estudos nutricionais apontam a utilização do ômega 3 – ele é encontrado em peixes como o salmão, atum, sardinha, sementes e castanhas. Em pacientes com insuficiência cardíaca, a suplementação com essa gordura proporcionou um pequeno benefício, com redução de mortes e hospitalizações por causas cardiovasculares.
Trabalhos assim apontam para uma direção: a nutrição é cada vez mais uma ferramenta com a qual a medicina deve contar para melhorar as condições gerais dos pacientes, mesmo quando o assunto é uma doença grave, como a insuficiência cardíaca.
O Departamento de Nutrição da SOCESP elaborou um e-book sobre o tema, que faz parte de uma coletânea de livros gratuitos que estão sendo disponibilizados com o objetivo de fornecer mais conhecimento e qualidade de vida à população. Para acessá-lo, clique aqui.
*Juliana Kato é nutricionista e diretora executiva do Departamento de Nutrição da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (SOCESP) e Luciene de Oliveira é nutricionista e diretora científica do Departamento de Nutrição da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (SOCESP)
Alimentação é aliada no controle da insuficiência cardíaca Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br
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