É progressivo o número de ações voltadas à educação e à cidadania digital de crianças e adolescentes. Porém, pouco se discute que, em um mundo cada vez mais conectado, a vulnerabilidade dos mais jovens ganha proporções preocupantes nesse contexto.
É urgente buscar caminhos para ajudar as novas gerações a desfrutar dos avanços tecnológicos de forma mais saudável, segura e consciente. Se o assunto já exigia atenção antes da pandemia, agora se torna mais desafiador, sobretudo por não haver um consenso a nortear os pais frente aos dilemas do uso de telas.
O filósofo americano Jordan Shapiro é uma das vozes que defendem que o contato das crianças com o celular deve se dar ainda na infância, sob o argumento de que é mais fácil ensinar a elas hábitos digitais adequados. Já o neurocientista francês Michel Desmurget, autor de A Fábrica de Cretinos Digitais (Vestígio), afirma que os dispositivos eletrônicos estão afetando negativamente o desenvolvimento neurológico de crianças e adolescentes.
A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) vem alertando que o uso precoce e prolongado, assim como a não observância à classificação etária de jogos e aplicativos, tem gerado dificuldades de socialização, além de problemas físicos como má postura, dores de cabeça, disfunções auditivas e visuais…
Sejamos sinceros: a pandemia não deixou apenas o público infantojuvenil mais próximo das tecnologias; mudou a relação de todos nós com elas. Só que uma hora a conta chega.
Estamos pagando caro por tanta conectividade, quando a tela se torna o principal meio de entreter, trabalhar e socializar. É desse ponto que precisamos partir se quisermos retomar o controle do nosso tempo e ensinar os jovens a usufruir de seus dispositivos e tudo o que eles oferecem com maior consciência, segurança e responsabilidade.
Precisamos, como familiares e professores, reavaliar nossa relação com as telas e trazer à memória tudo que sabíamos e fazíamos antes do período de isolamento, renunciando a alguns hábitos e impondo limites a esse “novo normal”.
Não é fácil. Quando estamos envolvidos com games ou redes sociais, nosso cérebro libera dopamina, associando essas experiências a uma recompensa. Assim perdemos a noção do tempo, e, se é difícil para um adulto parar, imagine para uma criança ou adolescente.
Sozinhos, eles não alcançam um equilíbrio e ficam abduzidos e até vulneráveis a crimes cibernéticos.
Não são poucos os especialistas que apelam a pais e professores para rever nossa dependência das telas e questionam quão conectados estamos de verdade aos mais novos.
Educar uma criança é um dos papéis mais sublimes e difíceis que existem. Ainda mais após uma pandemia: fizemos o possível para poupar os jovens diante das restrições, mas chegou a hora de colocar as coisas em seu devido lugar.
Coragem, pais! Coragem, professores! Não contem com a perspectiva de os avanços tecnológicos retroagirem ou os gigantes da tecnologia desistirem.
Não proíbam, mas expliquem e direcionem — hoje temos ferramentas e métodos para nos ajudar nisso. Não é ser contra eles e as telas, mas com
eles, para que aprendam a tirar o melhor proveito delas.
* Alessandra Borelli é advogada dedicada ao direito digital e à proteção de dados, palestrante e autora do livro Crianças e Adolescentes no Mundo Digital (Autêntica)
Crianças e Adolescentes no Mundo Digital (Autêntica)
Os jovens no mundo digital: é hora de acertar as contas Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br
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