Em 1931, arqueólogos que vasculhavam a entrada da caverna de Marsoulas, no sudoeste da França, encontraram uma concha de molusco de 31 centímetros de tamanho – grande o suficiente para ser segurada por duas mãos adultas. A hipótese inicial era que a ferramenta servia como uma espécie de cálice, usado pelos habitantes da caverna há cerca de 18 mil anos para compartilhar bebidas em grupo durante rituais ou comemorações.
Após oito décadas guardada numa coleção de museu, a tal concha foi analisada de novo por cientistas da Universidade de Toulouse, na França, e do Museu de História Moderna local. E eles descobriram nela uma aplicação muito diferente da imaginada de início.
Em vez de testar quão bem o recipiente servia para guardar líquido, pesquisadores tentaram tirar som da tal concha, como se fosse um tipo de flauta. Deu certo. Ao assoprar na cavidade superior do instrumento, era possível produzir notas musicais.
“É um dos raros exemplos, senão o único, de um instrumento musical do período Paleolítico feito de uma grande concha, e a primeira concha com esse uso descoberta até então”, escrevem os cientistas no estudo que descreve a descoberta, publicado na revista Science Advances na última quinta-feira (10).
Sabe-se que o hábito de transformar pedaços de animais em instrumentos é ainda mais antigo. Outros objetos, como ossos de pássaros e presas de mamute já eram usados para simular flautas há cerca de 40 mil anos, por exemplo.
Assim como esses instrumentos antigos, a tal concha da caverna tem origem animal, mais especificamente de uma lesma marinha da espécie Charonia lampas. Análises químicas e imagens em alta definição da concha, no entanto, mostraram que a casinha do invertebrado foi ligeiramente modificada por humanos para produzir som.
Entre essas modificações, estava um pequeno corte na extremidade pontuda concha, que criava um furo. Nesse buraco, humanos antigos introduziam um osso de pássaro. Fino e oco, ele servia como uma palheta. Era algo parecido com o bocal usado em saxofones: sua função era melhorar o contato da boca do músico com a concha. Perto do abertura, cientistas encontraram resíduos de tipo de resina ou cera de cor marrom, usado, provavelmente, para fixar a palheta improvisada ao instrumento.
Usando uma palheta de metal, um trompetista conseguiu tirar do instrumento frequências muito parecidas com o que hoje convencionamos chamar de dó (C), ré (D) e dó sustenido (C#). Você pode ouvir o som da concha-flauta de 18 mil anos no vídeo abaixo.
A teoria de que a concha era usada como instrumento musical é reforçada, ainda, por outro aspecto curioso. No interior do objeto, cientistas identificaram impressões digitais humanas marcadas num pigmento vermelho. O mesmo pigmento era a base da tinta usada por humanos para fazer as pinturas retratadas na parede da caverna de Marsoulas.
Cientistas “revivem” concha de 18 mil anos que era usada como flauta; ouça Publicado primeiro em https://super.abril.com.br/feed
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