Durante uma expedição na plataforma de gelo Filchner-Ronne, no extremo sul do mar de Weddell, na Antártida, um grupo de geólogos esperava apenas captar amostras de lama do fundo do mar, a fim de estudar o solo local. Eles fizeram um poço no chão e baixaram o instrumento de coleta a cerca de 900 metros de profundidade.
Para os cientistas, era apenas mais um dia de trabalho. Mas algo estranho aconteceu: todas as vezes em que eles mergulhavam o instrumento mar adentro, ele voltava vazio, sem nenhum sedimento sequer.
Eles resolveram, então, olhar as imagens obtidas através da câmera GoPro que descia com o instrumento. Foi quando descobriram algo realmente improvável. A escavação foi feita bem em cima de uma rocha, o que já seria curioso por si só, já que não se espera por uma em solos do tipo. Mas, como se não bastasse, a rocha trazia vida em sua superfície.
A pedra no caminho dos geólogos acabou sendo um presente e tanto para os biólogos da British Antarctic Survey (BAS), que publicaram um estudo detalhando a descoberta na revista científica Frontiers in Marine Science. Entre os animais encontrados, os pesquisadores puderam identificar algumas esponjas e possíveis cracas (um tipo de crustáceo), mas o resto das espécies ainda são desconhecidas.
Mas afinal: como a rocha foi parar em um lugar como esse? Acontece que algumas delas ficam alojadas em grandes pedaços de gelo. Quando esses blocos se soltam da costa, podem levar consigo as pedras para ficar à deriva pelo oceano. Em algum momento, essa pedra acaba se desprendendo – e vai parar no fundo d’água.
O tipo de animal encontrado na rocha torna a descoberta ainda mais inusitada. Afinal, encontrar peixes em ambientes como esse, por exemplo, também seria surpreendente, mas menos incomum. Isso porque estes bichos são capazes de se locomover e procurar por nutrientes em outras áreas, caso necessário. Mas os habitantes da rocha eram animais estacionários, ou seja, incapazes de se locomover.
Ora, como um ser vivo que não se mexe conseguiria viver a quase um quilômetro de profundidade, sem acesso a luz solar, em temperaturas próximas de -2 ºC e com pouca oferta de alimentos? Essas são questões que intrigaram os cientistas.
As esponjas são animais filtradores, o que significa que elas se alimentam apenas com o que chega flutuando em seu espaço. Os cientistas notaram ondulações no sedimento ao redor da rocha, o que indica que uma corrente passa por ali. Mas mesmo se ela for a responsável por levar comida ao animal, o processo não é nada rotineiro. Isso porque a fonte de alimentação mais próxima fica a centenas de quilômetros de distância do local. Seria muita sorte da esponja ter detritos carregando os nutrientes pela corrente até suas proximidades com frequência.
Entender quem são os habitantes daquela pedra e como eles sobrevivem não é tarefa fácil. Só o equipamento dos arqueólogos que estavam no local não dava conta de coletar amostras da rocha para análise, o que abre precedentes para uma segunda missão. No futuro, os cientistas deverão explorar a região com ajuda de um ROV (sigla em inglês para “veículo submarino operado remotamente”), capaz de realizar a coleta.
A plataforma de gelo Filchner-Ronne cobre cerca de 415 mil quilômetros quadrados, mas o mar sob ela só pode ser explorado a partir dos poços abertos no chão. Hoje, essa área de exploração representa mais ou menos a área de uma quadra de tênis. Os cientistas acreditam que possa existir um ecossistema inteiro ainda não explorado na Antártida, com mais pedras como essa abrigando novas espécies que evoluíram para viver em condições extremas.
Espécies desconhecidas são encontradas vivendo sob plataforma de gelo na Antártida Publicado primeiro em https://super.abril.com.br/feed
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