terça-feira, 31 de agosto de 2021

Novo teste PCR detecta o coronavírus e outros três tipos de vírus

A pandemia do coronavírus fez surgirem testes rápidos para detectar a doença, mas a semelhança dos sintomas com outros problemas respiratórios trouxe a necessidade de ter diagnósticos mais certeiros. Um novo PCR, já disponível em laboratórios privados, é capaz de distinguir entre os vírus influenza A e B (principais causadores da gripe), o Vírus Sincicial Respiratório (VSR) e também o Sars-CoV-2, responsável pela Covid-19. 

Esse teste vem atender a algumas necessidades. “A primeira é que o quadro clínico dos pacientes com síndromes respiratórias são muito semelhantes, com febre, tosse, espirro, coriza. Há poucas diferenças, como a perda de olfato e paladar da Covid-19″, explica Gustavo Campana, patologista clínico e diretor médico da Dasa.

“De imediato, pensamos sempre na pandemia. Mas ter uma resposta mais completa muda bastante a conduta do médico em relação ao tratamento e ao tipo de isolamento necessário, principalmente em casos de internação”, completa o patologista.

A novidade ainda dá maior proteção a crianças e idosos, que podem desenvolver formas graves de outras síndromes respiratórias e precisam ser acompanhados de perto.

“Se a gente imaginar um idoso já vacinado, por exemplo, cai a probabilidade de ser Covid-19, mas ele pode estar com outra infecção que seja tão preocupante como a do coronavírus”, afirma Hélio Magarinos Torres Filho, patologista, diretor médico do Richet Medicina & Diagnóstico e diretor da área de análises clínicas da Rede D’Or São Luiz, de São Paulo.

Nas crianças, a maior preocupação é o Vírus Sincicial Respiratório (VSR), mais comum até os dois anos de idade. Ele é o grande causador de bronquiolite nessa faixa etária. Muitas vezes, o pequeno precisa ser internado para tratar da doença. 

Como o teste é feito?

O exame é parecido com o PCR convencional da Covid-19. Colhe-se a secreção do nariz com um cotonete, e o resultado sai em até 48 horas. Ele pode ser realizado em crianças e adultos. A maior diferença é que ele é indicado apenas para pessoas que estão com sintomas. O valor é um pouco mais alto que o da versão mais simples e ainda não está disponível em farmácias.

“O PCR do coronavírus também é útil em assintomáticos, porque a ideia é controlar a pandemia, então a pessoa faz porque precisa viajar ou trabalhar e não pode correr o risco de transmitir a doença”, explica o diretor da Dasa.

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Já existem exames que detectam mais de 20 tipos de vírus, mas eles são caros e demorados. “Contar só com esse tipo de análise é como recorrer um canhão para atingir uma mosca. Já o novo teste foca nos quatro vírus de alta prevalência, ou seja, os que mais circulam”, observa o diretor médico da Dasa.

O PCR turbinado é benéfico somente a pacientes sintomáticos para excluir um quadro mais grave de uma dessas doenças. “Mesmo em tempos de pré-pandemia, infecções virais sempre foram gatilho de internações e sabemos ainda que as pessoas com comorbidade acabam ficando mais tempo no hospital”, avalia Campana. Fora que o quadro pode progredir, transformando-se, por exemplo, em uma pneumonia.

O pedido do exame deve sempre partir de um médico. “O indivíduo pode até ir ao laboratório e fazê-lo por conta própria, mas ele vai precisar da análise de um profissional de qualquer maneira. Por isso não tem como o médico ficar de fora”, afirma Campana.

Legado da pandemia

Após o susto de conviver com a Covid-19, o mundo está repensando a maneira como se faz diagnósticos. Para Campana, passou a ser mais importante investir em vigilância epidemiológica – conjunto de ações para detectar a incidência de um vírus em um população.

“Precisamos, a partir de agora, saber o que está circulando, onde, em quais grupos e como cuidar. Esse é um dos legados da pandemia”, defende o diretor da Dasa.

 

 

 

 


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Entrevista: “A alimentação tem papel importante na recuperação pós-Covid”

A médica Maria de Lourdes Teixeira da Silva sabe bem como fica o corpo depois da Covid-19. No ano passado, precisou de 15 dias de internação para lidar com a forma grave da doença, mas levou alguns meses para superar totalmente o quadro, hoje chamado de pós-Covid.

“Me recuperei devagarzinho, mas tive muita sensação de fadiga e uma queda de cabelo horrível”, relembra a diretora do GANEP Nutrição Humana. Ela não está sozinha: estudos revelam que uma em cada três pessoas que contraem o coronavírus podem apresentar alguma queixa a longo prazo.

Em um bate-papo com VEJA SAÚDE, Maria de Lourdes conta como a alimentação pode auxiliar quem está nesse processo. Confira!

VEJA SAÚDE: Qual é o papel da alimentação na recuperação da Covid-19?

Maria de Lourdes: A alimentação tem um papel importante para esses pacientes. Em primeiro lugar, é sempre uma oportunidade para corrigir hábitos alimentares. Muitos já não comiam corretamente, e sabemos que a obesidade aumenta o risco de quadros mais graves de Covid-19, que, por sua vez, estão associados a possíveis complicações de longo prazo. Então, é uma chance de colocar a casa em ordem.

Além disso, essa é uma doença que pode trazer perdas importantes de nutrientes e de massa muscular. Então, todos os indivíduos devem ser orientados a buscar uma alimentação saudável e fazer ajustes individuais, baseados nos acometimentos que tiveram.

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Quais são os principais ajustes a serem feitos?

Varia muito conforme o grau de severidade da infecção. Para quem teve formas leves, ao invés de focar em nutrientes específicos, prefiro falar em padrão alimentar saudável. Essa é a base para tudo, e a necessidade de suplementação deve ser avaliada individualmente.

Pessoas que perderam muito músculo deverão aumentar o aporte de proteínas, até com suplementos, se for o caso. Indivíduos internados por longos períodos, que desenvolveram feridas na pele, podem adicionar alimentos com propriedades cicatrizantes, com nutrientes como vitamina C, zinco, ômega 3 e arginina.

Quem teve o paladar afetado pode treinar esse sentido com alimentos picantes. E, de maneira geral, todos se beneficiam de uma boa hidratação e de consumo adequado de fibras, uma vez que os remédios que costumam acompanhar a internação podem desequilibrar a microbiota intestinal.

E que padrão alimentar saudável é esse?

A conhecida dieta mediterrânea, que inclui itens com propriedades anti-inflamatórias, antioxidantes e antitrombóticas. É um cardápio composto por alimentos naturais: frutas, legumes, verduras frescas, boas gorduras, em especial do azeite de oliva, peixes, grãos integrais, laticínios e ovos.

LEIA TAMBÉM: Uma dieta mediterrânea adaptada para os brasileiros

Diversos estudos já demonstraram que pessoas que adotam esse padrão têm menos infartos e outras doenças cardíacas, além de menor risco de desenvolver distúrbios neurodegenerativas e outros problemas. Pesquisadores também defendem que ela pode ajudar na recuperação da Covid, o que faz sentido, considerando suas vantagens.

E quando é necessário usar suplementos nutricionais?

Em geral, os pacientes que ficaram internados devem garantir o consumo adequado de proteínas para repor a massa muscular perdida. Alguns chegam a perder mais de 10 quilos no período de hospitalização, e não dá para apenas comer mais por conta própria sem levar em consideração o teor nutricional do cardápio.

Se as boas fontes proteicas não fizerem parte do hábito alimentar desses pacientes, pode ser necessário suplementar. Vale dizer que a alimentação e suplementação não resolvem o problema sozinhas: é preciso realizar um trabalho de fisioterapia e reabilitação física para recuperar os músculos.

Em casos mais severos da doença, também pode haver desnutrição e, nesse caso, é importante repor vitaminas e minerais. Mas é preciso que isso seja feito com a orientação do nutricionista, e conhecendo as deficiências daquela pessoa em específico.

+ Será que você anda desnutrido? Veja os sinais da condição e como resolver

Como foi a sua experiência com a fase aguda da doença e com o pós-Covid?

Eu tive que ficar internada por conta da baixa saturação de oxigênio no sangue, cheguei a ter 75% [o ideal é acima de 95%]. Fiquei 15 dias hospitalizada, dependendo de oxigênio, mas sem precisar entubar. É o que chamamos de forma grave, mas não crítica, porque não precisei de UTI.

Foi difícil, era início da pandemia, todos tinham medo de se aproximar. É uma doença muito solitária, você fica sozinho e não sabe o que vai acontecer. Você tem medo de morrer e acha que a qualquer momento pode piorar.

Depois, eu me recuperei e fui retomando devagarzinho as atividades. Mas tive muito essa sensação de fadiga, que é amplamente descrita, além de  uma queda de cabelo horrível. Cheguei a perder metade dos fios, e isso começou dois, três meses depois da alta.

É interessante falar que tem pessoas que apresentam sequelas pós-Covid, mas não relacionam com a doença, porque os sintomas demoram um pouco para aparecer. Mas é importante estar atento e buscar ajuda.

Uma dieta no estilo da mediterrânea, com peixes, vegetais, oleaginosas e azeite, pode auxiliar no pós-Covid.Foto: Alex Silva/A2 Estúdio

O que se sabe sobre complicações gastrointestinais do pós-Covid?

O coronavírus se liga nas células que revestem as paredes do intestino, causando uma grande confusão local, e também no fígado. Em especial na fase aguda, as pessoas podem ter náusea, diarreia e outros problemas, antes mesmo dos sintomas respiratórios surgirem.

Quem está nesse grupo provavelmente já teve algum grau de desnutrição logo de cara, ainda que com a forma leve da doença, por conta da dificuldade em manter a alimentação.

E alguns ficam com sequelas das alterações, podendo apresentar diarreia, náusea e intestino preso meses depois. Não são as repercussões mais comuns, vale dizer.

E também pode acontecer de indivíduos que já apresentavam quadros do tipo terem seus sintomas exacerbados. Nesses casos, além das fibras, o consumo de probióticos pode ser uma alternativa interessante.

Então, a desnutrição vem desses problemas na fase aguda?

Sim, não só por comer menos, mas pela maior necessidade calórica.

Quando você tem uma doença infecciosa, o corpo entra num estado de catabolismo ou hipermetabolismo [ou seja, aumenta seu consumo de energia para combater o inimigo], então precisamos de mais calorias, o que acelera o processo de desnutrição. Quanto mais grave a doença, e mais tempo na UTI, maior o risco.

Um padrão alimentar considerado não saudável (rico em ultraprocessados, gorduras saturadas e açúcar) pode atrapalhar?

Pode, porque ele não contempla o que o doente precisa. Nessa fase, a microbiota deve ser recuperada, a massa muscular restabelecida e por aí vai. Isso demanda um aporte adequado de fibras, proteínas e vitaminas, como dissemos.

Um cardápio desequilibrado, baseado em fast-food, tem menos desses nutrientes, então pode atrasar a recuperação. Não é que ele não vai se recuperar, só vai demorar mais para que isso aconteça.

Quem deve procurar um nutricionista depois da Covid-19?

Muitos já saem do hospital com uma orientação feita pela instituição. Agora, casos que não exigiram internação, mas que deixam essa sensação de estar debilitado, exigem orientação específica. Para os casos leves, a dica é seguir um padrão alimentar saudável mesmo e, se não conseguir realizar essas mudanças, será necessário suplementar. Daí também há necessidade de buscar ajuda.

Em geral, todos podem aproveitar esse momento para recuperar o que foi perdido em anos de padrão alimentar ruim. Na verdade, a atenção ao cardápio teria sido importante antes mesmo de se infectar. Se tivéssemos cuidado melhor disso durante os períodos de isolamento social, teríamos impedido muito ganho de peso na pandemia, que acabou por piorar a saúde das pessoas.


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O que não te contam nos livros: amamentar para além da visão romantizada

A chegada da minha segunda filha vai, em breve, me levar novamente para uma nova jornada na amamentação. Ao mesmo tempo, também estou passando por um momento muito único e especial, que é o desmame gentil da primogênita.

A minha pequena Esther, de 2 anos de idade, ainda mama no peito, mesmo com a gravidez! É uma condição que chamamos de lactogestação e, ao contrário do que muitos acreditam, amamentar durante a gestação não é uma contraindicação absoluta. Na maioria das vezes, isso é possível e tem baixo risco – apesar de poucos profissionais apoiarem. A amamentação prolongada tem seus desafios, mas isso é um tema para outro dia…

Agora, Esther tem mamado cada vez menos e, aos poucos, vamos nos conectando de outras maneiras amorosas, o que é realmente muito incrível.
Este momento que estou passando me fez refletir mais uma vez sobre a importância da informação de qualidade para as mulheres que amamentam ou pretendem amamentar.

Quando me tornei mãe, sabia que amamentar não seria fácil nem intuitivo. Apesar de todo o meu conhecimento técnico, e de ter ajudado milhares de mulheres em suas dificuldades, tinha certeza de que precisaria viver minha própria história.

Pude perceber ali, literalmente na pele, o quanto teoria e prática são tão diferentes e como a rede de apoio é essencial. Como diz um famoso provérbio, “é preciso de uma vila inteira para educar uma criança”. Mas me permitam fazer um ajuste: “é preciso de uma vila inteira para que uma mãe consiga amamentar”.

+ LEIA TAMBÉM: O papel vital do pai no apoio à amamentação

Amamentar vai além de uma boca e um peito e, para que realmente possamos fazer diferença na sociedade no que concerne à conscientização da importância da amamentação, é preciso mais. É preciso mais do que citar os inúmeros benefícios do aleitamento e levantar a bandeira do apoio. Quem não defenderia uma causa tão nobre?

É preciso, por exemplo, saber o que fazer quando uma mãe procura um profissional em busca de ajuda. É preciso criar leis que apoiem a amamentação num mercado de trabalho tão competitivo. É preciso mais.

Para que a amamentação aconteça de forma saudável para mamãe e bebê, é preciso olhar além, e não só para a dupla envolvida. Minha experiência diária com mães e bebês mostra o quanto é um momento delicado, de muita doação e, não raro, dificuldades.

Existe uma visão muito romantizada da amamentação. Mulheres plenas, maquiadas e sentadas tranquilas com os bebês no seio. Essa é a expectativa. Mas, quando a realidade chega, vem a percepção de que não é necessariamente tão fácil assim. Por isso, gosto de conversar muito com as gestantes e com as mulheres que estão enfrentando contratempos no aleitamento.

Os profissionais que acompanham a mãe recém-nascida – sim, as mães também nascem com a chegada do bebê – têm um papel fundamental no sucesso do processo. Desde a maternidade, um bom acolhimento e um olhar sensível da equipe fazem toda a diferença naquele início que pode ser tão sombrio e difícil para a mulher.

+ Amamentação pode evitar Covid-19 em bebês

Não basta falar que está tudo bem e que, se precisar, a fórmula resolve. As mães devem ser ouvidas e receber um direcionamento seguro e afetuoso, a partir de uma escuta ativa, sensível e acolhedora. Elas precisam de um olhar amoroso e que transmita: “deixa eu te ajudar!”

Eu sempre digo que o conhecimento é algo poderoso para quem ingressa na maternidade. Muitas mulheres direcionam suas energias, leituras, conversas e aflições para a gestação e para o parto, e não fazem ideia do tamanho do desafio que virá depois. Imaginam apenas que irão colocar o bebê no peito e a mágica acontecerá. Ledo engano.

Por isso, ficam aqui algumas dicas para mães de primeira viagem (ou de segunda, terceira…): empodere-se com informações atualizadas e de fontes confiáveis dos mais diversos assuntos na maternidade, inclusive amamentação.

Tenha uma conversa franca com os profissionais que estarão por perto neste momento. Não basta receber apoio: é necessário contar com pessoas capacitadas, que saibam conduzir a amamentação, e que realmente ouçam as queixas e dores da mãe e ajudem a resolver a questão de forma assertiva.

Quando uma mulher chega com o relato de que não consegue amamentar porque está com dor, ela não quer uma desculpa nem um tapinha nas costas dizendo que vai ficar tudo bem. Muito menos uma solução simplista de que a fórmula vai resolver todos os problemas e só assim o bebê vai se desenvolver bem. Essa mulher está pedindo ajuda. Ela precisa de conhecimento e orientação. Ela precisa de amparo e proteção na sua decisão de amamentar.

+ O que acontece na infância não fica na infância 

Existem muitos profissionais capacitados, atualizados e preparados para atender essas demandas. Grupos de apoio por todo o Brasil são importantíssimos nesta jornada, além das consultoras de amamentação que, por estarem na linha de frente da questão, têm conhecimento para ajudar essa mãe de verdade.

Na prática do consultório já me deparei com muitas histórias. Já vi mães chegarem desesperadas, exaustas e com medo. Mas, com paciência, diálogo e troca de informações vamos desmistificando a amamentação e entendendo, juntas, qual o melhor caminho a seguir.

Nem sempre é fácil. Nem sempre é possível. Mas, é sim, um direito da mulher ter acesso a um cuidado apurado durante todo o percurso. Amparar uma mãe é dever da sociedade.

Quando me tornei mãe e me deparei com as dificuldades e com pensamentos de que aquilo parecia mais uma tortura, entendi realmente como é importante não idealizar o momento. Acredito cada vez mais que, uma vez bem informadas, as mães poderão encarar o desafio com mais tranquilidade, menos culpa e cientes da importância da rede de apoio e de que o seu desejo de dar o peito deve ser respeitado e validado.

O leite materno é vida e amamentar, reforço, vai muito além de uma boca e um peito. É um ato de amor, doação, proteção e sacrifício. Que possamos, a partir de agora, ser parte da solução.


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A variante C.1.2 não é uma ameaça imediata. Mas é sintoma de um problema bem maior

Descoberta na África do Sul, ela reúne mutações das variantes Alfa, Beta, Gama e Delta. Mas ainda é rara. O maior perigo não é a C.1.2 em si, é o que ela representa: o abandono vacinal dos países mais pobres. Entenda por que isso coloca o mundo inteiro em risco.   

Sabe qual parcela da população, na África do Sul, foi totalmente vacinada contra a Covid até agora? 9,94%. É um índice incrivelmente baixo, sete ou oito vezes menor que o dos países ricos – e faz até o Brasil, onde 28,3% das pessoas já completaram a imunização, parecer um exemplo. No continente africano como um todo, a situação é pior ainda: só 2,5% da população está totalmente vacinada. Dois e meio. Fique com esse número na cabeça. 

Como você talvez tenha ouvido falar, foi descoberta uma nova variante do coronavírus, a C.1.2, na África do Sul. Ela foi detectada pela primeira vez em maio, mas só ganhou as manchetes ontem, quando cientistas africanos publicaram um estudo sobre essa variante. Ela tem 14 mutações na proteína spike, incluindo a N501Y, que aumenta a transmissibilidade do vírus e é o grande destaque da variante Alfa, a mutação E484K, que está presente nas variantes Beta e Gama e também, em parte das amostras, apresenta a alteração T478K, uma das mais críticas da variante Delta.  

Em suma: a C.1.2 reúne “greatest hits” de outras variantes. Ela também introduz algumas novas mutações, que em tese poderiam reduzir a eficácia das vacinas – mas isso ainda não foi testado. A boa notícia é que, na prática, a C.1.2 não está se espalhando rápido: ela foi encontrada em 2% das amostras analisadas na África do Sul em julho. É um crescimento em relação a maio (0,2%) e junho (1,6%), mas ainda não representa um problema. Tanto que a C.1.2 não é considerada uma “variante de preocupação” pela OMS – e por isso ainda não ganhou uma letra grega. 

A evolução do coronavírus não é uma linha reta, em que as variantes se sucedem de forma lógica e ordenada. Elas competem entre si – e uma variante que parece mais apta do que as outras nem sempre se torna dominante. As mutações também podem deixar o vírus melhor numa coisa, mas pior em outra: uma nova cepa pode se tornar mais contagiosa e ao mesmo tempo mais vulnerável ao sistema imunológico, por exemplo. Então é bem possível, ao contrário do que dizem as notícias mais alarmistas, que a C.1.2 simplesmente desapareça, ou fique limitada a poucos casos. 

Mas ela é sintoma de algo bem maior e mais preocupante: a propagação descontrolada do coronavírus nos países mais pobres. Quanto mais gente ele infecta, mais mutações sofre, e maior a probabilidade de que surjam alterações vantajosas para o vírus. E maior o risco de que, eventualmente, ele se torne resistente às vacinas atuais – o que colocaria o mundo inteiro em risco, incluindo as nações mais imunizadas. 

A África tem condições de adquirir 25 milhões de doses por mês, muito aquém do necessário para cobrir seu 1,3 bilhão de habitantes num prazo minimamente razoável. Deixá-los entregues à própria sorte, e doar vacinas em quantidades meramente simbólicas (a França enviou 10 milhões, o Reino Unido 3 milhões e os EUA prometeram 25 milhões), não é só uma demonstração de egoísmo dos países ricos: também é uma péssima estratégia epidemiológica.


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Fake news colocam a saúde em risco – saiba como se blindar

É agridoce para o jornalista de saúde escrever sobre notícias falsas. Por um lado, há a oportunidade preciosa de explicar ao leitor por que elas são tão perigosas. Por outro, paira na mente o dilema de que as semanas de pesquisa, entrevistas e elaboração dos textos pouco adiantarão para mudar a cabeça de quem já foi contaminado por elas.

Afinal, basta uma linha desmentindo a utilidade de determinado remédio no tratamento da Covid-19 ou alertando sobre a real gravidade da doença e pronto: perde-se qualquer oportunidade de diálogo e o sujeito se volta a fontes que, embora suspeitas, dizem o que ele gostaria de ouvir.

Charlatanismo e alegações enganosas não são novidade na área da saúde. Há séculos, falsas curas são promovidas mediante situações dramáticas feito epidemias ou como alternativas ao tratamento de doenças difíceis de controlar.

A equipe de VEJA SAÚDE, no decorrer de suas quase quatro décadas de vida, já dissecou várias dessas lendas: do protocolo de limpeza do fígado com vinagre de maçã ao mito de que chazinho cura gripe. O que mudou é que, com a internet e as redes sociais, elas não motivam apenas escolhas individuais ruins, mas se tornaram uma questão de saúde pública.

“Muita gente ainda acredita que o coronavírus é inofensivo, que existe tratamento para ele, e, por isso, se expõe mais ao risco de se infectar. Podemos dizer que estamos enfrentando duas epidemias, a de Covid-19 e a da desinformação”, diz o infectologista Gerson Salvador, da Universidade de São Paulo (USP).

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Não à toa, a própria Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou um estado de infodemia, um fenômeno novo, mas que já se formava antes da chegada do Sars-CoV-2. Ela é definida como o excesso de informação e, especialmente, de desinformação e de teorias conspiratórias que circulam nas redes sobre o coronavírus, prejudicando a passagem de orientações embasadas pela ciência e, assim, o próprio controle do vírus.

Além disso, como consequências negativas, a OMS e as entidades de psiquiatria destacam o aumento da ansiedade e da sensação de insegurança por causa da boataria.

Para citar um exemplo, um trabalho com cerca de 25 mil estudantes chineses, publicado no International Journal of Environmental Research and Public Health, constatou que os jovens mais suscetíveis a cair em fake news também se sentiam mais ansiosos e relatavam piora no bem-estar mental.

O grau de conhecimento e o acesso à informação de qualidade surtiram efeito oposto: ajudaram a responder positivamente ao estado de crise e a adotar mudanças de comportamento necessárias para lidar com ele.

Só que separar o joio do trigo está cada vez mais difícil, inclusive para profissionais de saúde formados e pessoas bem-intencionadas. “A desinformação está superando a informação”, sentencia Cláudia Galhardi, pesquisadora da Fiocruz que coordena o projeto Eu Fiscalizo, um aplicativo que recebe denúncias de conteúdos duvidosos e as desmitifica.

Durante a pesquisa para esta reportagem, ficou claro que as fake news se espalham como um vírus, sem que tenhamos mecanismos de defesa estruturados contra elas. Infectado, o indivíduo pode contaminar dezenas e até centenas de outras pessoas com o apertar de uma tecla.

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Vivendo nessa sedutora e confortável bolha, onde não existe perigo e as soluções para as coisas são mais simples, a vítima passa não só a correr risco como a colocar outras pessoas em perigo. “Hoje nos preocupa especialmente a repercussão que as mentiras sobre as vacinas da Covid-19 podem ter na adesão aos imunizantes em geral”, explica Cláudia, que vem notando ataques intensos e infundados às doses.

Não é uma exclusividade do Brasil, mas somos especialmente vulneráveis. Em 2018, um levantamento do Instituto Ipsos já mostrava que o país era o que mais caía em lorotas. Mais de 60% dos brasileiros respondentes afirmaram ter acreditado em fake news. Foi o índice mais alto entre as 27 nacionalidades incluídas no levantamento — a média global era de 48%.

“E, para piorar, aqui a desinformação embasa políticas públicas”, critica Natalia Pasternak, presidente do Instituto Questão de Ciência (IQC), criado há três anos com o intuito de reverter esse quadro.

Para isso, contudo, é preciso encarar o problema como uma doença democrática, que pode atingir qualquer um e contra a qual existe tratamento e, melhor ainda, medidas preventivas. Portanto, sem pedras na mão, vamos aprender juntos a espantar essa assombração.

Como se espalha uma fake news

Uma notícia enganosa é, antes de tudo, uma solução simples frente aos inexoráveis fatos da vida real. “Quanto mais frágeis estamos, econômica e mentalmente, mais suscetíveis ficamos, por isso ela é tão contagiante numa pandemia”, explica o psiquiatra Cláudio Martins, vice-presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).

Fora isso, a notícia fajuta costuma ser contada de um jeito apelativo para despertar uma emoção tão intensa que nos leva a passar a coisa adiante, sem pensar muito a respeito. Afinal, diante do (falso) alerta de que a população mundial está sendo enganada por inimigos invisíveis, quem não gostaria de avisar seus entes queridos?

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“As pesquisas de teoria da informação também dizem que notícias falsas têm um tom de novidade maior e atraem mais nosso interesse”, aponta Laís Junqueira, gerente de Qualidade, Segurança do Paciente e Inovação da Elsevier, empresa de informação analítica.

“Quando juntamos isso à busca humana por um senso de ordem em meio ao caos, um vírus que atinge a todos, e o fato de que vivemos na era das redes sociais, com facilidade de receber e repassar mensagens, temos um ambiente perfeito para elas se proliferarem”, complementa.

A vida digital é um aspecto fundamental dessa história. Ora, nas redes sociais os anunciantes entram com o dinheiro e nós com a atenção. Quanto mais tempo online, melhor. Os algoritmos (códigos que regem as plataformas) entregam na linha do tempo conteúdos personalizados, que reforçam ou atacam com agressividade nossas crenças e, logo, têm alto potencial de compartilhamento.

É o chamado conteúdo viral — eis a metáfora patológica mais uma vez — em formato multimídia, que surge como alternativa à imprensa, antes “dona da verdade” e agora alvo de uma crise de credibilidade. Ora, no Facebook, no YouTube e no WhatsApp, todos são potenciais produtores e replicadores de conteúdo.

Segundo uma pesquisa realizada pela agência Reuters, 67% dos brasileiros afirmam se informar pelas redes sociais, e só 51% confiam na mídia tradicional. Mas essa é uma baita pegadinha.

“A desinformação nas plataformas digitais não é uma anomalia, é a base estruturante. E esse modelo é intuitivo porque transmite a ideia de que a pessoa é quem vai aferir a verdade, quando, na realidade, as instituições de confiança só foram trocadas por outros atores. Assim, para o usuário, tudo faz sentido, e uma coisa confirma a outra”, analisa a antropóloga Letícia Cesarino, professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que estuda o fenômeno nas redes.

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Em resumo, elas se disseminam mais ou menos assim:

  1. A origem: Especialistas em produção de conteúdo (empresas ou pessoas físicas) montam imagens, áudios e trechos de vídeo baseados em informações duvidosas.
  2. O disfarce: Para que não seja possível rastrear a fonte original e, assim, encontrar culpados, a “notícia” pode passar por centrais que camuflam o endereço eletrônico.
  3. Os influenciadores: O boato passa a circular em ecossistemas de desinformação (grupos fechados, canais, redes sociais mais invisíveis) e é promovido por influenciadores.
  4. A vítima perfeita: O usuário final, alheio aos passos anteriores da jornada, recebe o conteúdo que reforça suas crenças de uma fonte que julga confiável, como um amigo ou familiar.

As motivações por trás

Para que alguém inventaria que uma cura milagrosa existe ou que vacinas são arriscadas? No segundo caso, já se sabe que, fora do país, a indústria de tratamentos alternativos é uma das interessadas na difamação. “Por aqui, o uso da ivermectina foi defendido mesmo sem evidências científicas com anúncios pagos por uma das fabricantes do medicamento”, aponta Salvador.

E nem sempre há más intenções por trás. As notícias falsas são só a faceta mais maquiavélica de um grande ruído de comunicação, que passa pelo grande volume de notícias produzidas e engloba ainda erros honestos, nossa relação viciante com os smartphones e a própria velocidade da ciência, que engatou a quinta marcha na pandemia.

“Apenas sobre Covid-19 temos mais de 252 mil artigos científicos em nossos bancos de dados. Um médico demoraria 35 anos para ler só o que saiu até agora, fora o que seria publicado nesse tempo”, conta Laís.

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A solução é tão complexa quanto o tamanho do problema. Além da melhor regulamentação das redes por governos e por elas próprias, um dos pontos principais é a alfabetização científica e o ensino do pensamento crítico. Quebrar vieses que nos prejudicam e acreditar na ciência não é nada simples — pelo contrário, é contraintuitivo.

“Mostramos muito das maravilhas dela, mas pouco sobre como compreender seus meandros”, avalia Natalia. “Nossa principal lição foi a importância de sair dos muros da universidade e conversar com a população”, concorda Cláudia.

Iniciativas bacanas têm feito essa ponte, inclusive vacinando a população, por meio do contato controlado com pequenas doses de desinformação. “Colocamos os idosos para produzirem suas próprias notícias falsas para que eles vejam como é fácil fazer isso”, conta Kamila Rios Rodrigues, professora do Instituto de Ciências Matemáticas da USP, que passou a coordenar cursos na área para os mais velhos.

Para superar a era em que a verdade virou questão de opinião, precisamos aprender a navegar em meio às incertezas, sem achar indelicado questionar crenças furadas. “Falar a verdade não deveria ser ofensivo para os outros”, crava Natalia.

E a verdade é esta: mentiras podem matar mesmo quem não acredita nelas. Ao crer que é melhor não se vacinar, você contribui para o prolongamento da pandemia. Ao ser convencido de que máscaras fazem mal, espalha o vírus. Ao parar um tratamento prescrito, podem vir complicações. Claro, a ciência não é perfeita — o jornalismo, muito menos. Mas é com dúvidas, diálogos e transparência que se constrói o conhecimento. E salvamos vidas!

Por que acreditamos nelas?

Falta de treinamento: Ninguém nasce sabendo avaliar conteúdos nas redes ou flagrar estudos ruins. Mesmo em cursos universitários, como medicina e enfermagem, o método científico é pouco ensinado.

Preocupação genuína: Se você recebe uma notícia escabrosa, que pode colocar em risco seu modo de vida ou suas liberdades, a tendência é querer alertar as pessoas que ama para protegê-las ou sensibilizá-las.

Tribalismo: Compartilhar uma notícia é também uma maneira de interagir socialmente e buscar reconhecimento entre os pares. É a famosa bolha, pronta a aplaudir (ou reprimir) pensamentos.

O prazer de ter razão: Se o conteúdo diz o que você pensa, a probabilidade de não só acreditar nele, mas passá-lo adiante, é maior. Quebrar o tal viés de confirmação é um desafio até para os mais renomados intelectuais.

Exposição incessante: Os nazistas diziam que uma mentira repetida mil vezes vira verdade. As redes de desinformação disparam “fatos” a toque de caixa, que reforçam argumentos e formam uma narrativa aparentemente lógica.

Vulnerabilidade pessoal: Situações ruins na vida e traços de personalidade e comportamento, como egocentrismo, paranoia e mania de perseguição, podem tornar o sujeito mais suscetível a acreditar em teorias conspiratórias.

+ Como a segurança e a eficácia das vacinas são avaliadas após a aprovação

Como identificar fake news e se proteger delas

1) Pare e pense
Ao deparar com um conteúdo, por mais sedutor e urgente que ele pareça, tome alguns minutos para analisar se aquilo pode ser verdade ou merece ser passado adiante.

2) Cheque a fonte
Se o texto cita a Fiocruz e uma nova vacina, por exemplo, digite no buscador “Fiocruz + nova vacina” e veja se há registros no site oficial da instituição ou nos principais veículos de imprensa.

3) ATENÇÃO!!!
Exclamações, letras capitulares e outros recursos que visam tornar o texto mais apelativo, como adjetivos e ameaças, são um sinal de que sua origem é suspeita.

4) Será que foi isso mesmo?
Algumas frases, mesmo que tenham sido ditas, acabam sendo retiradas do contexto original. Podem ser antigas ou se referirem a outro assunto.

5) Converse com seu médico
Embora ele também seja vulnerável à desinformação, o profissional pode (e deve) ser a ponte entre paciente e orientações de qualidade.

6) Denuncie
No YouTube, no Facebook e no Instagram, dá para marcar posts como falsos. O WhatsApp permite denunciar apenas o contato e os grupos que os disseminam.

7) Não leve gato por lebre
Alguns sites se parecem muito com portais de notícias, mas pouco têm de jornalísticos. Eles podem, inclusive, ter nomes parecidos, com uma letra ou palavra diferente, e o mesmo layout.

8) Redes sociais
São locais onde a desinformação prospera e é bonificada. Não as tome como única fonte de notícias, mesmo com os perfis verificados. O selinho aumenta a credibilidade, mas ainda pede cautela.

9) Compartilhe verdades
Como são mais chatinhas e envolvem muitas vezes banhos de água fria, as notícias reais são menos compartilhadas. Se você se interessa pelo assunto, pode ser um paladino a serviço delas.

10) Fale conosco
VEJA SAÚDE mantém o blog É Verdade Ou Fake News?, onde esclarece mitos enviados pelos leitores. Quando topar com um, mande uma mensagem para nossas redes sociais. Estamos a postos!

As mentiras que fizeram estrago na pandemia

Mesmo já tendo sido desmentidas, algumas ainda sobrevivem, como zumbis.

Só uma gripezinha: No início da pandemia, tentou–se minimizar a doença.

Todos devem pegar Covid-19: A imunidade coletiva só é atingida com segurança com vacina.

Lockdown provoca suicídio: Estudos já desmentiram essa relação. Não há causa e efeito.

Isolamento não funciona: Ele é uma das principais medidas de prevenção da Covid-19.

Álcool em gel apaga digitais: Essa fez sucesso no começo da pandemia, mas é 100% falsa.

Perigo só para idosos: Um jeito preconceituoso de atenuar a gravidade. Nada a ver.

Máscaras causam câncer de pulmão: O acessório não causa déficit de oxigênio e nos defende do vírus.

Elas afetam a respiração: Podem até ser desconfortáveis, mas não impedem a saída de gás carbônico.

Vacinas ainda estão em testes: Não procede! Os estudos necessários para amparar a aprovação já foram concluídos.

Vacinas alteram o DNA: Nem as novas vacinas de RNA interagem com nosso genoma.

Medir a temperatura na testa é perigoso: Outra alegação sem pé nem cabeça. Tanto faz o local!

Kit Covid funciona: Cloroquina, ivermectina e afins não passaram nos testes da ciência.

Por fim, alguns números sobre a infodemia…

+ 41% das notícias falsas sobre Covid-19 analisadas pela Fiocruz vieram do WhatsApp

+ 70% a mais é a probabilidade de alguém compartilhar uma mentira no Twitter

+ 67% dos brasileiros se informam pelas redes sociais e só 51% confiam na imprensa


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segunda-feira, 30 de agosto de 2021

Fóssil “perfeito” de pterossauro brasileiro revela novas informações sobre a espécie

Um dos fósseis de pterossauro mais completos já encontrado é brasileiro. Desde 2016, pesquisadores do Brasil e Portugal estudam um espécime de Tupandactylus navigans, que viveu há 110 milhões de anos. Agora, o estudo que descreve e analisa o fóssil foi publicado no periódico PLOS One. O pterossauro ainda vem com uma história curiosa: ele quase foi contrabandeado para fora do país.

Tudo começou com uma operação policial em 2013, que pretendia enfrentar uma quadrilha internacional especializada em contrabando de fósseis e pedras semipreciosas. Os policiais impediram, no Porto de Santos (SP), a exportação ilegal de três mil peças, que provavelmente seriam vendidas para museus ou coleções particulares do exterior. Entre as peças, estavam rochas calcárias extraídas da Bacia do Araripe, na região Nordeste do Brasil. Elas possuíam restos mortais e impressões bem conservadas de seres vivos que habitaram o planeta há milhões de anos. Os itens foram entregues à Universidade de São Paulo (USP), que iniciaram a pesquisa com o fóssil três anos depois.

A espécie Tupandactylus navigans foi descrita em 2003, por pesquisadores europeus, a partir de dois crânios. No entanto, essa é a primeira vez que é possível estudar um fóssil tão “excepcionalmente bem preservado”, diz Victor Beccari, autor principal do estudo.

O fóssil pertence a um indivíduo adulto de quase um metro de altura, que possui bico e garras. Até os tecidos moles, como órgãos internos, estão em bom estado. Ao contrário de ossos e garras, eles não costumam ser preservados no processo de fossilização, por serem delicados. Nesse fóssil de pterossauro, os tecidos moles preservados foram as cristas do animal – uma na mandíbula e outra na cabeça.

O fóssil revela que esta espécie de pterossauro provavelmente não voava longas distâncias por conta de sua grande crista.Victor Beccari/Reprodução

 

Descobertas inéditas

Como os estudos anteriores partiram de crânios da espécie, os pesquisadores se depararam com um corpo inédito para analisar. Primeiro, os pesquisadores visualizaram e analisaram o fóssil, descrevendo osso por osso e comparando o material com outros estudos já publicados para entender a anatomia do pterossauro.

Em seguida, eles fizeram uma tomografia do fóssil e trabalharam com as imagens de raio-x para obter um modelo 3D do animal e observar estruturas que estavam dentro da rocha. Então, eles continuaram a descrição anatômica para entender melhor como as proporções dos ossos se correlacionam com o hábito de vida do bicho, disse Beccari à Super.

Acreditava-se que o pescoço do pterossauro seria curto e com tendões ossificados entre as vértebras, para resistir ao vento no voo. Mas nada disso foi encontrado no fóssil. O pescoço longo e a crista de mais de 40 centímetros atrapalhariam voos de longas distâncias. Além disso, as pernas do animal são mais compridas do que o esperado, e as asas mais curtas. 

“Com isso, a gente acredita que esse animal passava grande parte do tempo no chão, procurando alimento, e voava apenas para fugir de predadores ou para distâncias curtas. E ele usaria a crista para atrair companheiros para acasalar”, afirma Beccari. Segundo o pesquisador, um bom análogo atual é o pavão – cuja cauda, tão grande quanto a crista do pterossauro, dificulta o voo e é usada para atrair companheiros.

O que falta descobrir

O trabalho também abriu espaço para novas perguntas. “Há um grande debate sobre se esse animal e outra espécie brasileira (Tupandactylus imperator) seriam, na verdade, a mesma espécie. Isso acontece porque, até antes do nosso estudo, só eram conhecidos crânios de ambos os animais”, afirma Beccari. 

Segundo o pesquisador, a única diferença visível está relacionada com a crista, que pode variar bastante entre um macho e uma fêmea. “Precisamos olhar o resto do esqueleto desses animais e comparar, para ter certeza que são duas espécies diferentes ou não. Mas, para isso, ainda precisamos de um esqueleto completo de Tupandactylus imperator”, explica. 

Outra questão está relacionada à alimentação do pterossauro. Os pesquisadores acreditam que ele comia frutos, pinhões, sementes e outros tipos de material vegetal duro – mas isso ainda não está bem estabelecido.

Por último, existe a incógnita do voo: embora as descobertas feitas agora indiquem que o pterossauro não fazia voos de longas distâncias, ainda não dá para bater o martelo. 

“Queremos testar [a partir de estudos biomecânicos] como o voo desse animal era impactado pela crista, para ter certeza de que ela seria uma desvantagem aerodinâmica. Apesar das evidências anatômicas sugerirem que sim, podemos estar errados e só vamos saber com novos dados matemáticos”, explica Beccari.

Os pesquisadores ainda pretendem estudar a coloração da crista em detalhe, procurando moléculas, como melanina, que podem estar preservadas no fóssil.


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Metabolismo só começa a desacelerar após os 60 anos, diz estudo

Aquela dificuldade em perder gordura abdominal ou emagrecer não é culpa da chegada aos 30 anos, como se diz por aí. Segundo um estudo publicado pela revista Science, o funcionamento do metabolismo se mantém quase o mesmo entre os 20 e 60 anos.

“Acreditava-se que, por volta da meia-idade, as pessoas tinham a tendência de ganhar peso devido a uma redução do gasto energético basal, aquele que usamos para nos manter vivos. Esse estudo aponta que estávamos errados”, explica William Festuccia, professor do departamento de fisiologia do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB-USP).

Para chegar a esse resultado, pesquisadores do Pennington Biomedical Research Center (PB), nos Estados Unidos, analisaram a queima média de calorias durante o dia a dia de cerca de 6 mil pessoas, entre nascidos há uma semana até indivíduos com 95 anos, de 29 países diferentes.

Segundo comunicado divulgado pela instituição, a maior parte de estudos anteriores avaliava o gasto de energia a partir de funções como respirar, fazer a digestão e bombear o sangue. Só que essas tarefas vitais representam de 50 a 70% das calorias queimadas durante o dia. Ou seja, os trabalhos não levavam em conta atividades como lavar louça, movimentar-se e até pensar.

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“Nesse trabalho, para medir o gasto energético foi utilizado um método em que a água é marcada com hidrogênio e oxigênio. O participante consome o líquido e os pesquisadores acompanham a velocidade de eliminação dessas substâncias pelo corpo através do exame de urina”, ensina Festuccia.

Considerada padrão-ouro de avaliação de gasto calórico, essa técnica já é utilizada desde os anos 1980, mas os cientistas afirmam que nunca houve oportunidade de fazer um estudo com essa grandiosidade.

Após as análises, os experts notaram que o pico de metabólico é atingido pelos bebês. Para ter ideia, com um ano, eles queimam calorias 50% mais rápido para o tamanho do seu corpo do que os adultos.

Depois disso, o metabolismo desacelera em aproximadamente 3% anualmente até os 20 anos. Aliás, uma das surpresas foi que as necessidades calóricas não dispararam na adolescência, como prega o senso comum. Após os 60, a queda seria de apenas 0,7% ao ano.

Em resumo, daria para dividir as fases da vida de acordo com o metabolismo assim:

  • Pico de gasto calórico do nascimento até um ano de vida
  • Uma desaceleração suave até os 20 anos
  • Estabilidade dos 20 aos 60
  • Um declínio permanente, com quedas anuais. Por volta dos 90 anos, a capacidade metabólica fica 26% menor em comparação à da meia-idade

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Como se vê, não é correto chamar o metabolismo de “lento”. “Dizer isso é afirmar que existe uma redução da velocidade metabólica, e isso não acontece. As reações enzimáticas continuam as mesmas, e não diminuem com o envelhecimento. O que muda é a discrepância entre os que se come e a quantidade de energia que se perde ao longo dos anos”, esclarece Festuccia.

Na prática, se o metabolismo não tem culpa no cartório, precisamos olhar com mais cautela para os nossos hábitos, como a alimentação. “A quantidade e densidade calóricas são as principais preocupações. É preciso atenção especial a itens que são ricos em gordura saturadas, que possuem mais calorias por cada grama de alimento”, conta Festuccia. Alguns exemplos: carne vermelha e processada, salgadinhos, biscoitos recheados, sorvete e pratos prontos.

Sem falar na prática de atividade física, outro aspecto fundamental na perda e manutenção do peso. Ela deve acompanhar o indivíduo por todas as etapas da vida.

Outros dados ainda devem ser extraídos da pesquisa. “A íntegra do estudo tem uma quantidade monstruosa de informações e ainda não deu tempo de os especialistas olharem tudo com cuidado. Vai demorar um pouco para digerir 100%. Há associações de gasto energético com cada tecido do corpo, e com base em adolescência, gravidez e menopausa”, comenta o professor do ICB.


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Vítimas do Vesúvio tinham dietas diferentes de acordo com o sexo, revela análise

O ano 79 d.C. ficou marcado na história da Itália pela erupção do Monte Vesúvio. Ele devastou as cidades de Pompeia, Herculano e outros assentamentos da região. O gás e as cinzas expelidas pelo vulcão, junto ao calor intenso, mataram toda a população. A cidade de Herculano, localizada a oito quilômetros do vulcão, foi enterrada por pela 23 metros de fuligem.

Apesar da tragédia para os moradores da época, esse último detalhe facilita o trabalho dos pesquisadores de hoje. O soterramento permitiu que os corpos ficassem bem preservados, possibilitando pesquisas detalhadas sobre a população que vivia ali. A mais recente delas, publicada no periódico Science Advances, identificou os alimentos consumidos pela população – e mostrou que as comidas que iam no prato dos homens não eram as mesmas ingeridas pelas mulheres.

A dieta dos homens consistia em 50% mais proteína de frutos do mar do que a das mulheres, além de ser mais rica em diferentes tipos de grãos. Enquanto isso, as mulheres comiam mais carnes provenientes de animais terrestres, ovos, laticínios, frutas e vegetais locais. De maneira geral, a pesquisa indica que a dieta dos homens era mais diversificada que a das mulheres.

Os cientistas também notaram que, no geral, os herculanos consumiam grandes quantidades de azeite de oliva. O óleo foi responsável por pelo menos 12% das calorias consumidas pelas vítimas analisadas. A observação vai condiz com outros registros históricos, atestando que o azeite de oliva não era apenas um condimento, mas também um ingrediente cotidiano.

Para chegar à conclusão, uma equipe de pesquisadores da Universidade de York, na Inglaterra, analisou ossadas de 17 vítimas do Vesúvio, sendo 11 homens e 6 mulheres. Os pesquisadores reconhecem que é preciso analisar mais amostras para fazer uma avaliação mais completa da dieta da região.

Dependendo dos alimentos que uma pessoa come, seus ossos e dentes absorvem isótopos de nitrogênio e carbono, que são produzidos pelas plantas e passados para animais de acordo com sua posição na cadeia alimentar. Você pode adquiri-los diretamente da planta, ingerindo uma maçã, ou pode comer a carne do boi que comeu a planta. Dessa forma, a proporção entre esses isótopos são um tipo de impressão digital da comida. No estudo, os cientistas buscaram por estas assinaturas para identificar os hábitos alimentares da população.

Ainda não é possível afirmar os motivos que levaram homens e mulheres a terem dietas diferentes, mas os pesquisadores têm algumas hipóteses. Não se sabe se homens e mulheres comiam juntos; se sim, é possível que possível que a divisão de dietas fosse cultural, como uma “regra” não escrita que diz o que cada sexo deve comer.

Também é possível que homens e mulheres fizessem as refeições separados. Geralmente são os homens que se envolvem na pesca e atividades marítimas, então pode ser que eles comessem parte do que pescaram. Outra hipótese diz que os homens provavelmente ocupavam posições mais privilegiadas na sociedade – e por isso podiam consumir produtos caros, como peixe fresco. Boa parte da população de Herculano foi escravizada, mas os homens poderiam ser libertos antes das mulheres. Isso pode ter permitido o acesso a uma dieta mais diversificada ao longo da vida.


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Cápsula de flutuação para domar o estresse

Um jeito high-tech de boiar nas águas do Mar Morto sem precisar viajar para o Oriente Médio. É assim que dá para definir as cápsulas de flutuação já oferecidas por algumas clínicas e spas brasileiros. Segundo Mariela Silveira, diretora médica do Kurotel, em Gramado (RS), um dos estabelecimentos que contam com a tecnologia, já existem estudos comprovando seus efeitos no bem-estar físico e mental.

“Um trabalho piloto mostrou que pessoas submetidas ao tanque apresentavam menores indicadores de estresse, depressão, ansiedade e dores, além de melhores níveis de otimismo e qualidade do sono, quando comparadas ao grupo controle”, diz.

A médica explica que uma sessão já traz relaxamento, mas, para que os benefícios sejam sustentados, é necessário ter continuidade nos banhos flutuantes.

Boiar… e relaxar

Diretora do Kurotel resume o que contempla uma sessão na cápsula

A água: ela simula as condições do Mar Morto. Para isso, tem 500 kg de sal Epson, rico em magnésio.

A temperatura: deve estar em 35,5 °C. O protocolo prevê sessões individuais de 30 minutos.

A sessão: são dez minutos com música relaxante, 15 com isolamento sensorial e cinco para retornar da experiência.

Efeitos: a atividade induz relaxamento muscular e melhoras momentâneas na pressão e no sono.

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O que mostram os estudos

Reações fisiológicas: elas são comparáveis às de outras técnicas de relaxamento. A flutuação propicia a redução nos níveis de adrenalina e cortisol (os hormônios do estresse) e a liberação de neurotransmissores como endorfinas.

Vantagens na prática: a regulação do sistema nervoso faz baixar a pressão arterial e a frequência cardíaca e otimiza o fluxo sanguíneo para as extremidades do corpo. O resultado geral: menos estresse e ansiedade e melhor controle das dores.


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Esporte é remédio no tratamento da esclerose múltipla

A campanha Agosto Laranja foi criada para instruir e dar visibilidade à esclerose múltipla, doença ainda estigmatizada e erroneamente relacionada a idosos. A maior parcela de pessoas afetadas por essa condição é jovem, entre 20 e 40 anos, e principalmente formada por mulheres.

A esclerose múltipla é uma doença autoimune que afeta a camada que recobre os neurônios — por isso, fazendo uma analogia com a fiação elétrica, é conhecida como “a doença do fio desencapado”.

Os sintomas são múltiplos – daí seu nome – e podem englobar alteração de visão, equilíbrio e força na marcha, por exemplo. A manifestação mais comum, porém invisível, é a fadiga, um cansaço injustificável, como se a energia não chegasse, o que limita muito as funções mais comuns do dia a dia.

No Brasil, a esclerose múltipla entra no rol de doenças raras e graves, mas é importante desmistificar a ideia de que o paciente com a condição não pode fazer esforço. Há mais de quatro décadas, felizmente, os cientistas estudam os benefícios do exercício físico para portadores da doença.

Pesquisas demonstram que exercitar-se com regularidade melhora a qualidade de vida e a fadiga, além de amenizar os sintomas e diminuir as sequelas. Também indicam que a atividade física, em qualquer intensidade, é segura nesse contexto — não causa novos surtos, por exemplo. Ou seja, o exercício pode e deve fazer parte do tratamento.

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Eu mesmo experimentei esse benefício, já que, além de médica, convivo como paciente com a doença. Posso dizer que conheci o exercício aos 30 anos e meu esporte, o triathlon, aos 33.

Antes disso, a esclerose múltipla me fez enfrentar sintomas fortes, como perda da sensibilidade de todo o corpo, da força das mãos e da visão de ambos os olhos em dois surtos distintos, o que me impedia de trabalhar como anestesista. Senti receio de que minha juventude estava acabando e quis fazer algo marcante: decidi entrar no Exército, em homenagem ao meu avô.

No primeiro dia de treinamento, eu não tinha força nem para fazer um coque no cabelo. No teste de admissão, 45 dias depois do início, saí de lá correndo 2 km e fazendo 22 flexões. Continuei correndo e vi que a regularidade fazia eu me sentir melhor.

Aprendi a nadar, a pedalar e comecei a me interessar cada vez mais pela Medicina do Exercício e do Esporte. Fiz pós-graduação nessa especialidade e me reinventei. Atualmente, atuo com prevenção e reabilitação através do exercício, incluindo pessoas com esclerose múltipla.

É incrível fazer parte de tantos relatos transformadores de pacientes e de desconhecidos que tiveram a oportunidade de entrar em contato com a minha história. E é difícil imaginar como seria a evolução da minha doença se eu não fizesse exercícios diários.

+ Caminhada é opção prática, barata e eficaz contra o sedentarismo

Quando não treino com frequência, minha função motora já piora e a fadiga aparece. O esporte faz parte do meu tratamento, assim como um comprimido. Esse é o entendimento da Medicina do Esporte que tento passar para os meus pacientes. O exercício é tão primordial para nossa saúde quanto é a insulina na vida de alguém com diabetes.

Hoje sou atleta de paraciclismo e sigo uma rotina intensa de treinos, que inclui corrida na água, natação, ciclismo, musculação e fisioterapia.

A prática de esportes é indicada em qualquer fase da doença e deve ser associada a todas as outras frentes do tratamento. O tipo de atividade, a frequência e a intensidade serão estabelecidos em conjunto entre paciente e a equipe de saúde que o acompanha, lembrando que o prazer é essencial para realmente nos engajarmos.

* Christiane Prado é médica do Laboratório de Performance Humana da Casa de Saúde São José, no Rio de Janeiro


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domingo, 29 de agosto de 2021

Leishmaniose: como combater a doença que afeta os cães e a gente

O Agosto Verde é o período de conscientização sobre a leishmaniose visceral, uma doença grave, presente no Brasil e a segunda enfermidade causada por parasitas que mais causa mortes no mundo. Embora tenhamos regiões endêmicas para a moléstia, como Norte, Nordeste, Centro-Oeste e o interior de São Paulo, sabemos que ela vem se dispersando territorialmente ao longo dos anos e hoje temos casos reportados em todo o país.

A leishmaniose afeta tanto cães como humanos, mas a boa notícia é que podemos preveni-la. A principal forma de contrair a infecção é por meio da picada do mosquito-palha (Lutzomyia longipalpis). Isso quer dizer que o cão não é o culpado, pois ele não é transmissor e, sim, apenas o maior reservatório da doença. Em geral, o mosquito pica o animal infectado e, posteriormente, pica outro cachorro ou humano, transmitindo o protozoário causador do problema.

A doença é séria e pode causar, nos animais, uma diversidade de sintomas, como vômitos, diarreia, apatia, lesões de pele (principalmente em focinho, face e pontas das orelhas), sangramentos (principalmente nasais), aumento do abdômen e crescimento exagerado das unhas.

tratamento, com a melhora dos sinais clínicos, mas não existe uma cura, isto é, um jeito de eliminar totalmente o parasita do organismo. Daí que o cachorro pode continuar sendo um reservatório da enfermidade.

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É por isso que ressaltamos tanto o papel da prevenção. Quando falamos de leishmaniose, é importante abordarmos o conceito de “Saúde Única”, que interliga saúde humana, animal e ambiental. Dessa forma, podemos destacar duas frentes de prevenção. A primeiro é o controle do vetor.

Algumas medidas são essenciais nesse sentido, como usar inseticidas no ambiente, evitar passear com o cão ao crepúsculo e à noite, quando o mosquito é mais ativo, colocar telas nas janelas e portas e manter o ambiente sempre limpo, pois a proliferação do vetor acontece com a abundância de matéria orgânica (folhas, frutos em decomposição, fezes de animais e lixo acumulado).

A segunda frente de prevenção são os cuidados com o cão, que incluem o uso de produtos como coleiras inseticidas e repelentes e a manutenção da vacinação contra a doença. Vale lembrar que os produtos tópicos, como as coleiras inseticidas e repelentes, ainda são os meios mais eficazes de prevenir o problema. Estudos realizados no Brasil e em outros países comprovam que, em uma região onde a população canina faz uso dessas coleiras, há redução também nos casos humanos de leishmaniose.

Outro ponto importante é que, ao notar qualquer sintoma relacionado à doença, o tutor deve levar o animal para uma consulta veterinária, uma vez que os casos tratados precocemente têm mais chances de sobrevivência. Por fim, mantenha as visitas periódicas ao veterinário, pois essa é a melhor forma de zelar pela saúde do seu animal e da sua família.

* Silvana Badra é veterinária e gerente de produto pet da MSD Saúde Animal


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Cigarro eletrônico coloca o coração dos mais jovens em risco

Ao assistir uma palestra durante o Simpósio Novas Fronteiras na Prevenção Cardiovascular da Mulher, realizado em parceria com o American Heart Association, fiquei chocada com um dado apresentado. Nos últimos dez anos, os eventos cardiovasculares estão aumentando em jovens americanos, apesar dos avanços da medicina.

Quem trazia as informações era a pesquisadora Nanete Wenger, lendária professora emérita da escola de medicina da Universidade Emory, em Atlanta, que dedicou mais de 50 anos a estudar as doenças cardiovasculares em mulheres e foi uma das primeiras cientistas nos Estados Unidos a trazer dados mostrando que esses problemas não são exclusividade dos homens. Agora, o que justificaria esse cenário relacionado aos jovens?

Hábitos pouco saudáveis – como sedentarismo, alimentação ruim e o consumo excessivo de drogas – podem ser alguns dos fatores corroborativos.
Mas há um elemento inusitado, que não pode ser deixado de lado quando analisamos dialeticamente as mortes por doenças cardiovasculares na faixa etária até 40 anos: o galopante apelo do cigarro eletrônico, ou vape. No Brasil, a comercialização é proibida por força de lei – mas, infelizmente, tem quem consiga comprá-lo.

No mercado há aproximadamente 20 anos, o cigarro eletrônico ganhou força no mundo entre 2011 e 2018, quando se registrou uma disparada de cerca de 13 vezes no consumo entre os jovens, passando de 1,5% para 20,8%, justamente na década na qual apurou-se o aumento de mortes nesta faixa etária. Em linguagem coloquial: tem focinho de porco, orelha de porco e, portanto, não deve ser tomada.

De acordo com dados da National Youth Tobacco Survey (NYTS), de 2018, o uso de cigarros eletrônicos entre alunos do ensino fundamental e médio nos Estados Unidos aumentou de forma alarmante, com mais de 3,6 milhões de usuários jovens, tornando-se o produto do tabaco mais utilizado pelos adolescentes daquele país.

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Nesses mesmos anos, entre os alunos do ensino médio que usavam cigarros eletrônicos, a preferência por versões saborizadas cresceu de 60,9% para 67,8%. O fenômeno pode ser atribuído ao apelo do aroma, que eleva a probabilidade de atrair crianças e adolescentes.

Para ter ideia do apelo dessas versões com gosto e aroma, no ano passado, nos Estados Unidos – onde a comercialização dos vapes é legalizada –, foi proibida a venda da maioria dos sabores de cigarros eletrônicos, visando coibir a crescente procura do produto por adolescentes.

Dos males, o maior

À exemplo do que as gerações anteriores viveram com o cigarro de papel, que foi largamente associado ao glamour pela publicidade até o início dos anos de 1990, o vape ganha fama nas redes sociais, principalmente nas mãos de influenciadores digitais, com a falsa proposta de ser uma alternativa menos nociva que o convencional.

Embora a mudança completa de cigarros combustíveis para cigarros eletrônicos possa eventualmente beneficiar a saúde de fumantes adultos viciados, nenhum produto do tabaco – incluindo cigarros eletrônicos – é seguro para jovens.

Isso porque o cérebro dos adolescentes ainda está em desenvolvimento, e a exposição à nicotina pode mudar a maneira como o órgão funciona, levando a uma vida inteira de dependência – e, em alguns casos, causando efeitos duradouros, como aumento da impulsividade e transtornos de humor.

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É comprovado que o cigarro convencional é danoso à saúde, sendo o tabagismo a principal causa de morte evitável no mundo. Fumar compromete a função endotelial e aumenta a liberação de radicais livres de oxigênio, além de acelerar o processo aterosclerótico, mesmo com baixo consumo de cigarros e até entre tabagistas passivos.

Os malefícios causados pelo cigarro eletrônico, porém, são apenas menos conhecidos porque mudam de acordo com a evolução desses dispositivos, que, aliás, sofrem mutações constantes.

Outros produtos químicos inalados pelo fumante de cigarro eletrônico variam de acordo com o modelo do acessório, mas, entre os componentes, destacam-se solventes químicos, compostos orgânicos voláteis e aldeídos, metais pesados, hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, material particulado ultrafino, além de compostos que produzem os sabores.

O cigarro eletrônico não expõe o usuário ao monóxido de carbono, é verdade, uma vez que não há combustão e o aquecimento é feito por bateria. Porém, elementos como a nicotina líquida, principal vilã dos efeitos colaterais ao sistema cardiovascular, está ali, o que fecharia a conta para explicar o número elevado de mortes por doenças cardiovasculares entre o público jovem depois que esse mau hábito virou moda.

A comercialização, importação e propaganda de todos os tipos de dispositivos eletrônicos para fumar são proibidas no Brasil, por meio de uma Resolução da Anvisa (RDC nº 46/2009). Um Projeto de Lei (5087/20) pretende dar força à RDC e proibir, em todo o território nacional, a produção, a importação, a publicidade e a comercialização de cigarros eletrônicos ou outros dispositivos eletrônicos para fumar, incluindo acessórios e refis.

Ambas as medidas são acertadas e os apelos em contrário são um grande desserviço para a saúde pública brasileira. Afinal, assim como acontece com o cigarro convencional, não há um nível considerado seguro para o consumo de cigarro eletrônico. Ao contrário: o seguro é nunca consumir. As informações que a professora Nanete Wenger nos traz reforçam que o Brasil está no caminho certo.

*Jaqueline Ribeiro Scholz é assessora científica da SOCESP e diretora do Programa de Tratamento do Tabagismo do Incor, do Hospital das Clínicas da USP.


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