Não tem jeito. Se o assunto é colesterol, lá está ele, no centro das atenções. Nem é à toa, afinal o ovo se destaca no ranking dos alimentos que oferecem a substância. Foi justamente a enorme quantidade, encontrada na gema, que o botou no banco dos réus, nos idos de 1970, quando a ciência apontava essa gordura como uma das maiores culpadas por males do coração.
Passadas décadas, assistimos à sua redenção, graças a uma coleção de estudos que o livrou da pecha de inimigo das artérias. Justiça feita, ele vive dias de glória, sobretudo entre a turma que pega pesado nas academias e, diga-se, é tão fã que acaba extrapolando no consumo.
São muitos os motivos para ovacioná-lo – perdão pelo trocadilho infame. O ovo está envolvido até em crenças, nas simbologias de antigos egípcios, gregos e indianos.
“Mitos de criação dos quatro cantos do mundo foram inspirados pela erupção da vida que sai de uma casca uniforme e inerte”, descreve Harold McGee no livro Comida & Cozinha – Ciência e Cultura da Culinária, da Editora Martins Fontes (clique aqui para comprar*). “Sempre foi um dos principais símbolos da origem enigmática dos animais, dos seres humanos, dos deuses, da Terra e de todo o universo.”
Clara e gema nutritivas
Voltando ao plano terrestre, o ovo tem sido enaltecido pelo conjunto de nutrientes. Sua gema oferece luteína e zeaxantina, uma dupla de pigmentos da família dos carotenoides que trabalha em prol da saúde dos olhos.
Também está repleta de colina, uma das integrantes do complexo B cada vez mais famosa por auxiliar na consolidação da memória. Trata-se de uma vitamina essencial para a síntese do neurotransmissor acetilcolina, um regulador do aprendizado no córtex cerebral.
Modelos experimentais indicam que a deficiência de colina pode afetar a atividade mitocondrial das células no cérebro, num desarranjo que repercute negativamente na cognição.
O alimento é ainda uma das melhores fontes proteicas e ajuda a manter os músculos fortes, bem como a integridade dos tecidos. Um dos destaques, nesse sentido, atende pelo nome de albumina, a eleita pelos malhadores.
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Em todas as culinárias
Cientistas explicam que a proteína do ovo é mais bem aproveitada quando passa por algum meio de cocção. Tanto a gema, mas, sobretudo, a clara oferecem uma verdadeira sopa de aminoácidos – pedacinhos proteicos – e alguns deles são fabricados pela natureza com a função exclusiva de proteger o embrião em desenvolvimento. Por isso não são digeríveis no organismo humano. Entretanto, quando submetidos às altas temperaturas, os aminoácidos se modificam e passam, então, a ser absorvidos no nosso aparelho digestivo.
Seja omelete, estalado, mexido, cozido, na panqueca, o ovo é dos ingredientes mais práticos e acessíveis e nessas versões nem é preciso muito traquejo culinário, não há segredo.
Indispensável em bolos, tortas, suflês e tantas outras receitas, ele interfere com a consistência, tornando as preparações mais aeradas.
Marca presença em pratos sofisticados nas cozinhas do todo o mundo, mas, seu papel de maior destaque, é na doçaria portuguesa.
Conta-se que, antigamente, nos conventos de lá, boa parte das claras era utilizada para engomar tecidos, as gemas que sobravam iam parar nos tachos junto de quilos de açúcar. Assim as monjas criaram delícias chamadas doces conventuais, caso da barriga de freira, do pastel de Santa Clara, do toucinho do céu, entre tantas para comer rezando.
Voltando ao Brasil, a trilha para essa coluna é O Ovo, baião do alagoano Hermeto Pascoal, composto nos idos de 1967. Entre instrumentos como zambumba, violão, triângulo e, claro, flauta, o ritmo alegre faz um bem danado.
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