sexta-feira, 18 de novembro de 2022

O peso da perda de peso na remissão do diabetes

No ano passado, após décadas de discussão, a Associação Americana de Diabetes (ADA) validou o uso do termo “remissão” para o diabetes tipo 2. O que isso significa? Muita calma antes de tirar conclusões precipitadas! Remissão não é nem sinônimo de cura nem de reversão da doença.

É como se o diabetes estivesse tão sob controle que aparentemente tivesse desaparecido em um período. E isso tem muito a ver com o peso. Estudos recentes mostram que a eliminação sustentada de cerca de 15% do peso corporal original é capaz de promover a remissão do diabetes tipo 2. Tudo porque, em grande parte das pessoas com o problema, os desarranjos no organismo começam silenciosamente quando elas engordam.

Mas perder 15% do peso é muito? De fato, é! Imagine uma pessoa com 90 quilos eliminando mais de 13 quilos. Só que não pense que é fácil cumprir (e manter) essa meta. A genética humana não foi programada, ao longo dos milênios, para se adaptar à fartura, mas para sobreviver em meio à escassez.

Para o corpo do Homo sapiens, a perda de peso é vista como sinal de perigo. Ocorre que o mundo e os hábitos mudaram, e a oferta de comes e bebes hoje costuma suplantar a demanda de calorias. Junte a alimentação desequilibrada ao sedentarismo e o resultado será o ganho de peso.

O ponto é que não é preciso emagrecer demais para ganhar saúde em troca. Pequenas perdas de peso, desde que sustentadas, já trazem grandes benefícios.

As pesquisas sugerem que cortar ao redor de 10% do peso original melhora o controle da artrose de joelho (a articulação é sobrecarregada pelos quilos extras), gordura no fígado, hipertensão, apneia do sono, níveis elevados de triglicérides no sangue etc.

Uma maneira de atingir a tão sonhada perda de 15% do peso para a remissão do diabetes tipo 2 — algo que propicia outras vantagens para o organismo — é se engajar numa mudança intensiva de estilo de vida. Isso contempla, pelo menos, um padrão alimentar saudável associado à atividade física regular.

Mas não adianta seguir essa rotina só por um tempo. Os hábitos e a perda de peso devem ser sustentados!

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Para cravar a remissão do diabetes, o indivíduo precisa estar sem tomar remédios para o controle da glicemia por pelo menos três meses e estar com o exame de hemoglobina glicada menor que 6,5% — este é uma espécie de dedo-duro da doença, fornecendo uma média da glicose no sangue nos últimos três, quatro meses.

Vários estudos clínicos constataram que, sim, é possível perder mais de 15% do peso com mudanças no estilo de vida. Só que não é fácil. Não é fácil nem mesmo dentro de um programa de pesquisa, com acompanhamento e tudo, que dirá no mundo real!

Outra forma de atingir esse patamar de redução do peso se dá por meio de procedimentos cirúrgicos — realizados via endoscopia, laparoscopia, com suporte de robôs ou a céu aberto. A cirurgia bariátrica ou metabólica chega a promover perdas de peso superiores a 15%, podendo chegar a números próximos a 40%. Quando bem indicadas, elas trazem qualidade de vida e contribuem para a remissão de diversos males, entre eles o diabetes tipo 2.

Há um terceiro caminho para eliminar cerca de 15% do peso original — e, que fique claro, nenhuma via exclui a adoção de hábitos saudáveis. É a prescrição e o uso de medicamentos antiobesidade. São comprimidos ou injeções que modulam o apetite e estimulam o emagrecimento.

Em 2023, teremos o lançamento no Brasil de alguns remédios capazes de promover perdas de peso nunca antes vistas. Um deles é a combinação fixa de dois princípios ativos na mesma pílula, naltrexona com bupropiona. Num seguimento de seis meses, a redução média de peso foi de 8% em pessoas com obesidade.

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Também teremos a chegada de duas medicações utilizadas uma vez por semana com injeção subcutânea. A semaglutida em nova dosagem (2,4 mg) promoveu, nos estudos clínicos, uma perda média de 17% do peso em um ano e meio em voluntários com obesidade.

E a tirzepatida é uma molécula que, numa população semelhante, levou à perda média de 21% do peso, um feito inédito entre medicamentos.

A indicação do remédio, dos novos às opções que já temos no mercado, é feita sempre pelo médico, pesando fatores individuais — e até é possível combinar drogas com mecanismos de ação diferentes. Mais uma vez, isso não dá carta branca para uma vida desregrada.

Pesquisas em andamento buscam confirmar se o tratamento da obesidade com esses novos fármacos ainda reduz o risco de ameaças ligadas ao excesso de peso e ao diabetes, como infarto, derrame cerebral e insuficiência cardíaca.

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Desafios persistentes

Na minha visão, o desafio com esses novos remédios toca em algo que já testemunhamos de longa data: o engajamento do paciente no tratamento de longo prazo. É comum ver pessoas abrindo mão da terapia e retornando aos maus hábitos assim que perdem um percentual do peso.

Ou trocando o certo pelo duvidoso, partindo para dietas ou chás falsamente milagrosos.

Os médicos também influenciam na falta de engajamento para a perda de peso. A primeira edição da pesquisa Receita de Médico, realizada com 654 profissionais brasileiros (a maioria endocrinologistas e cardiologistas), revela que 47% deles não consideram que o tratamento da obesidade deve ser algo constante, permeando a vida toda.

O estudo, recém-apresentado no congresso híbrido Diacordis 2022, mostra que 33% dos médicos suspendem o tratamento quando acreditam ter conseguido uma boa redução de peso.

Enquanto não podemos falar em cura definitiva do diabetes tipo 2, temos cada vez mais certeza de que a alimentação balanceada, a atividade física regular e, se necessário, o uso de medicamentos ou a cirurgia bariátrica são o roteiro para angariar uma vida com qualidade e livre de complicações e sequelas.

Essa é a rota indicada pela ciência para a remissão do diabetes tipo 2. Só devemos ter sempre em mente o desafio de manter a rotina de cuidados, o engajamento no tratamento e a parceria médico-paciente para evitar a volta do peso perdido — e das doenças.

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