É na medula, tecido esponjoso localizado no interior dos ossos, que estão as células-tronco hematopoiéticas – responsáveis pela formação das hemácias, ou glóbulos vermelhos; os leucócitos, ou glóbulos brancos; e as plaquetas. Uma falha na produção de qualquer um desses componentes do sangue pode dar origem a diferentes doenças, como leucemia, linfoma e mieloma múltiplo.
Diante da gravidade de algumas das doenças do sangue, uma das abordagens utilizadas é o transplante de medula óssea. “Hoje, a Dasa conta com sete serviços especializados nesse tipo de transplante, localizados em São Paulo, no Rio de Janeiro e no Distrito Federal, além de outros dois em instalação, no Maranhão e na Bahia”, destacou o dr. Celso Arrais, diretor nacional de hematologia da companhia e hematologista do Hospital Nove de Julho, em São Paulo, ao abrir o Simpósio Internacional de Atualização em Transplante de Medula Óssea da Dasa, maior rede de saúde integrada do Brasil. “São 60 hematologistas em equipes altamente especializadas no procedimento”, completou.
O evento online, organizado pela Dasa Educa, pilar de educação da empresa e que tem o propósito de gerar e fomentar conhecimento para o setor de saúde, foi realizado entre os dias 24 e 26 de maio e contou com uma audiência de mais de 3 000 participantes. “O objetivo era a troca de experiência e o compartilhamento do conhecimento em diferentes áreas relacionadas ao tema”, explicou o dr. Arrais.
“No simpósio, entre outros assuntos, discutimos o papel da equipe multidisciplinar na realização dos transplantes a fim de oferecer um atendimento de excelência, incluindo outras especialidades médicas, além da enfermagem, psicologia e odontologia”, observa a dra. Andresa Lima Melo, coordenadora da hematologia do Hospital Brasília, parte da rede Dasa, localizado no Distrito Federal.
A hora da decisão
O transplante de medula óssea é uma estratégia para tratar doenças onco-hematológicas. Os critérios de seleção para o procedimento variam de acordo com o tipo e o estágio da patologia assim como a idade e a saúde geral do paciente.
“O linfoma difuso de grandes células B, subtipo mais comum desse tumor, aparece em média aos 60 anos de idade”, exemplifica o hematologista dr. Jacques Kaufman, responsável técnico pelo transplante autólogo do Complexo Hospitalar de Niterói (CHN), no Rio de Janeiro. “O tratamento de primeira linha é a quimioimunoterapia, que consegue curar de 60% a 70% dos casos. Quando há recaída após o término da quimioimunoterapia, o transplante se consolida como terapia padrão”, pontua.
No transplante autólogo, as células progenitoras hematopoiéticas, ou células-tronco, vêm do próprio paciente. Elas são coletadas antes das sessões de quimioterapia e armazenadas até a data em que serão infundidas novamente na pessoa. As células coletadas cumprem apenas o papel de reconstituir a medula óssea. Ela será destruída pelas altas doses de quimioterapia, na verdade, direcionadas contra o tecido maligno. O transplante representa apenas uma forma de resgate da função hematopoiética.
No transplante alogênico, por sua vez, as células vêm de um doador compatível, seja ele aparentado, como irmão, pai ou mãe, seja não aparentado, quando então se recorre ao Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome) em busca de um voluntário cadastrado.
“Nos dois tipos, a quimioterapia prévia tem o intuito de eliminar e substituir a medula óssea do paciente, dando espaço para uma medula nova funcionar. No transplante alogênico, entretanto, as células transplantadas têm um papel adicional. Oriundas de um outro indivíduo, elas reconhecem o tecido maligno como distinto e iniciam o ataque: o transplante alogênico deve ser reconhecido, de fato, como uma forma pioneira de imunoterapia do câncer. Diferentemente dos transplantes de órgãos sólidos, não é necessário um procedimento cirúrgico. De forma geral, a infusão das células coletadas é feita por meio de um cateter implantado em uma veia central”, descreve a dra. Andresa Melo, coordenadora da hematologia do Hospital Brasília.
O olhar de diferentes profissionais
A complexidade do tratamento via transplante exige a participação de uma equipe multiprofissional. Nos serviços da Dasa, a jornada do paciente começa com o acolhimento pela enfermagem, momento em que ele recebe as informações sobre as etapas do tratamento e todos os cuidados de acordo com suas necessidades.
“A doação de medula é um ato que salva vidas. E buscar um centro especializado dá mais segurança ao transplante, tanto para o doador como para o receptor. O cuidado integral ao paciente e seus familiares, uma equipe multiprofissional, a qualidade e a experiência também são importantes para o sucesso do transplante”, afirma a dra. Maria Claudia Rodrigues, responsável técnica pelo transplante de medula óssea alogênico no Complexo Hospitalar de Niterói (CHN).
O suporte vem também de uma rede de psicólogos, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas e nutricionistas, além do acompanhamento de médicos de outras especialidades, como infectologistas, cardiologistas e pneumologistas, que atuam para evitar qualquer complicação no quadro.
Os cuidados se estendem ao pós-transplante. No período de duas a três semanas após a infusão, enquanto ocorre o processo de restabelecimento da produção das células sanguíneas, podem surgir efeitos colaterais relacionados à quimioterapia, deixando o paciente mais vulnerável a infecções.
Depois da alta, o acompanhamento médico continua em consultas regulares. Nesse sentido, alguns hospitais, como o Complexo Hospitalar de Niterói, disponibilizam uma cartilha com orientações sobre alimentação, a necessidade de evitar aglomerações e outros riscos de infecções, além de um calendário de vacinação. “O transplante de medula promove uma substituição quase completa do sistema imunológico. Então, todos os transplantados precisam passar por uma revacinação”, lembra o infectologista dr. André Bon, do Hospital Brasília. “É como se voltasse a ser um bebê e precisasse ser vacinado desde o início. Essa programação precisa ser feita junto com o médico, para definir as prioridades entre as doses. O tempo mínimo para vacinação pós-transplante é de três meses para influenza em momento de surto, por exemplo. Mas, em geral, o processo se inicia a partir dos seis meses do procedimento, com vacinas inativadas”, esclarece.
A experiência de paciente e doador
Foi durante sua colação de grau, em 2018, que a bióloga Raquel Mello sentiu os sinais de que algo não ia bem com sua saúde. Ela compartilhou sua experiência em um dos painéis do Simpósio Internacional de Atualização em Transplante de Medula Óssea da Dasa. “Ao receber o diagnóstico de leucemia, o primeiro pensamento é o de sentença de morte”, disse. Saber que ia precisar de um doador desconhecido só aumentou o medo e a ansiedade. Atendida no Complexo Hospitalar de Niterói, ela foi ganhando confiança ao ser acolhida pela equipe e receber todas as explicações sobre o processo. “Algumas datas foram especiais, como o dia em que soube que tinham encontrado um doador e o dia da infusão da nova medula. É um renascimento”, resumiu.
Passado um ano e meio do transplante, como recomenda o protocolo, Raquel pôde tomar conhecimento do nome do doador: Vinicius Gonzales. O encontro entre os dois para celebrar o sucesso da terapia só pôde acontecer meses depois em razão da pandemia de Covid-19. Para Vinicius, que havia perdido um amigo e um vizinho com leucemia no passado, o cadastro no Redome para ser doador tinha sido um caminho natural. “Mas só quando fui chamado para de fato fazer a doação, anos depois, entendi a intensidade de tudo. Também vivi uma montanha-russa de sentimentos, mas o processo se mostrou mais simples do que eu imaginava. Para resumir a experiência em uma palavra: gratidão. Só ganhei”, finalizou o doador.
O papel da terapia celular
Um dos destaques do simpósio da Dasa foi a apresentação de palestrantes internacionais discutindo estratégias alternativas ao transplante de medula. “À medida que surge um novo agente, se desenham pesquisas comparando os resultados de combinações de diferentes drogas com os do transplante. Hoje, a terapia celular se apresenta como uma possibilidade de tratamento em primeira linha”, informou o dr. Roberto Magalhães, coordenador de hematologia do Complexo Hospitalar de Niterói. “Para os pacientes que evoluem de forma desfavorável com linfomas, as Car-T cells vêm sendo estudadas como alternativa ao transplante de medula”, pontuou o dr. Daniel Tabak, do Hospital São Lucas Copacabana e coordenador da onco-hematologia da Dasa no Rio de Janeiro.
As Car-T cells – sigla em inglês para células T com um receptor de antígeno quimérico – constituem uma terapia que utiliza células do sistema imune do próprio paciente reprogramadas geneticamente para combater células cancerosas.1 “Existem muitos aspectos a ser considerados para que as células Car-T passem a ser consideradas como um tratamento de primeira linha. A relação custo-benefício é um deles e representa um desafio, sobretudo para a realidade brasileira”, concluiu o dr. Tabak.
Referências:
Transplante de medula óssea: uma nova chance Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br
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