Um estudo do Centro de Controle e Prevenção de Doenças, dos Estados Unidos, realizado entre 2012 e 2021 e publicado no ano passado, apontou que houve um aumento de 530% de casos de intoxicação pediátrica por melatonina – um hormônio natural usado como complementar na indução do sono.
Segundo o relatório, entre os efeitos colaterais desse tipo de substância para bebês e crianças estão distúrbios do sistema nervoso, gastrointestinais, cardiovasculares e metabólicos.
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Para explicar sobre os riscos da utilização desse tipo de medicação sem prescrição médica, conversamos com Clarissa Bueno, neurologista especializada em distúrbios do sono do Sabará Hospital Infantil.
Bebês e crianças podem usar remédios para dormir?
O uso de medicação para dormir não é recomendável na infância.
A maioria dos casos de dificuldade para dormir em crianças é resolvida por meio de estratégias comportamentais, com adequação de hábitos e, de acordo com a idade, a utilização de técnicas como relaxamento, exercícios e técnicas de respiração.
O tratamento medicamentoso é reservado para casos muito específicos.
Para quais diagnósticos pediátricos esse tipo de medicamento é indicado?
O tratamento medicamentoso apenas deve ser indicado quando há um diagnóstico definido, já que existem muitos tipos de distúrbios do sono – e cada um tem abordagens distintas.
Por exemplo: alguns distúrbios do movimento relacionados ao sono, como a síndrome de pernas inquietas e o transtorno do sono agitado, podem necessitar de tratamento medicamentoso, que será diferente daquele indicado para um distúrbio respiratório relacionado ao sono.
Já crianças com insônia e que tenham alguma outra doença associada, como o transtorno do espectro autista, podem ter indicação de tratamento medicamentoso associado à abordagem comportamental.
Além disso, dentro de uma mesma categoria de distúrbios do sono podem ser recomendados tratamentos diferentes.
Para ter ideia, vários estudos mostram que a melatonina não é eficaz na criança cujo principal problema é a presença de despertares noturnos.
Quais os riscos de fornecer medicamentos que causam sono para crianças sem diagnóstico definido?
As medicações atuam no sistema nervoso central, então é importante lembrar que, ao dar um remédio para induzir sono na criança, estamos dando algo que, de algum modo, vai atuar sobre o funcionamento cerebral.
Essas medicações podem causar sonolência diurna, alterações de frequência cardíaca, depressão respiratória, hipotermia, entre outros.
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No caso da melatonina, trata-se de um hormônio que atua não apenas em relação ao sono, mas também em várias outras funções do organismo, como o metabolismo de açúcares e gorduras, regulação da pressão arterial, nos mecanismos de inflamação, entre várias outras ações.
Assim, ao utilizar esse medicamento, estamos inadvertidamente interferindo em diversas funções do organismo (muito além do sono), o que pode trazer consequências.
Quais são os sintomas de que uma criança realmente tem problemas para dormir?
Crianças com dificuldade para dormir costumam ficar agitadas e irritadas, diferentemente dos adolescentes e adultos, que tendem a ficar sonolentos.
A privação de sono tem impactos cognitivos na criança, podendo prejudicar a atenção e dificultar o aprendizado.
Também pode ter impacto em relação ao desenvolvimento celular, ao crescimento e maior ou menor ganho de peso.
Quando os responsáveis devem procurar um especialista para falar sobre sono?
O sinal de que há algo errado deve soar quando:
- A criança apresenta de forma recorrente dificuldade para iniciar ou manter o sono;
- Tem um sono agitado com movimentação excessiva;
- Apresenta sintomas respiratórios relacionados ao sono;
- Ou quando se observam repercussões no seu comportamento durante o dia por noites mal dormidas.
Nessas situações, o pediatra deve ser consultado. E, se houver necessidade de um diagnóstico mais aprofundado ou ainda se medidas de mudança de hábitos e comportamentos iniciais não forem suficientes para resolver o problema, recomenda-se o encaminhamento para um especialista.
Quais são os tratamentos indicados?
O primeiro passo é fazer o diagnóstico do distúrbio de sono que a criança apresenta e quais condições podem estar associadas a ele.
Quando estamos diante de um quadro de dificuldade de início e manutenção do sono por hábitos ou associações inadequadas no momento de dormir, o tratamento indicado é a terapia comportamental – o objetivo é promover uma mudança de hábitos e comportamentos relacionados à hora do descanso.
Para outras situações, como distúrbios respiratórios relacionados ao sono, um tratamento otorrinolaringológico pode ser necessário.
Já alguns movimentos durante o sono podem demandar apenas orientações e cuidados em relação ao ambiente, enquanto outros podem requerer tratamento medicamentoso.
E quando as crianças têm condições complexas, como TEA (transtorno do espectro autista) e TDAH (transtorno do déficit de atenção com hiperatividade), qual deve ser a conduta dos cuidadores?
A construção de hábitos e comportamentos que promovam um sono tranquilo e independente sempre faz parte da abordagem terapêutica, mesmo para crianças complexas, embora adaptações possam ser necessárias.
Particularmente para esse grupo de crianças, o uso de telas no final do dia pode atrasar e dificultar o início do sono.
O estabelecimento de rotinas regulares de atividades ao longo do dia e a exposição à luz natural pela manhã contribuem para um sono saudável.
Por outro lado, é fundamental ter um ambiente tranquilo e propício ao sono durante a noite.
Além disso, o estabelecimento de limites claros e consistentes no momento de dormir por todos os cuidadores e a promoção da independência da criança para o início do sono fazem parte das recomendações.
Chás, alimentação, redução do uso de telas, rotina… O que pode ajudar bebês e crianças a terem um sono leve e tranquilo à noite?
Um sono tranquilo está relacionado a condições ambientais propícias para dormir e isso é construído ao longo das 24 horas.
Assim, rotinas claras, apropriadas a cada horário, que auxiliem a criança a organizar a rotina e a distinguir situações diurnas e noturnas, contribuirão para consolidar o sono noturno.
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Durante a noite, ocorrem modificações metabólicas que preparam a criança para o jejum durante o sono. Isso deve ser respeitado, com alimentação mais leve – mas sempre tendo em mente a idade da criança, já que as pequenas irão se alimentar em intervalos mais curtos.
As telas têm um efeito estimulante e inibem a produção de melatonina, hormônio que sinaliza o início da “noite interna”. Assim, o seu uso é contraindicado após o pôr-do-sol.
Remédios para dormir: quais os riscos de oferecê-los a bebês e crianças? Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br
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