Há quem diga que os livros são capazes de enganar a morte, ao menos temporariamente. Em A Louca da Casa (clique para comprar), a autora espanhola Rosa Montero conta a história de uma escritora argentina que tinha certeza de que um leitor não morria antes de chegar ao fim da obra. “É que a morte também é leitora, por isso, recomendo ter sempre algum livro a mão, porque, assim, quando a morte chega e vê o livro, se espicha toda para ver o que você está lendo, como eu faço no ônibus, e, então, se distrai”, diz na obra.
Ainda que não haja estudo científico que prove que um bom livro pode até trazer mais longevidade, todo leitor apaixonado atesta com facilidade que ler faz bem para a alma. A literatura tem um poder único: ela nos permite acessar a consciência dos personagens. Com tal ferramenta, conseguimos observar a intimidade deles e entender as escolhas que fazem – e as suas consequências.
A literatura é também uma cura para a solidão. Ao entendermos como os personagens pensam, sentem e agem, percebemos que aquilo que achávamos ser único em nós é, na realidade, uma experiência universal. Todos nos sentimos diferentes e até um pouco estranhos.
A literatura nos mostra como isso é parte da nossa humanidade. Não importa se é ficção, pois a regra básica da boa literatura é que ela deve ter sentido. A lógica interna que faz com que a ação avance sempre adiante é o que nos permite sentir e viver aquelas páginas como verdade.
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A literatura pode ser uma cura para a desesperança, pois sua premissa básica é a mudança. O romance nos mostra como os personagens se transformam ao enfrentar conflitos e desafios. Fica sempre aquela sensação: se eles conseguem, talvez nós tenhamos uma chance.
Elizabeth Bennet supera suas próprias barreiras e limitações internas e vai viver a sua história de amor com Mr. Darcy em Orgulho e Preconceito, de Jane Austen. Ao terminar a obra, é quase inevitável vir uma inspiração, um desejo de nos tornarmos também pessoas melhores.
Outro benefício é a possibilidade de nos encontrarmos nas páginas de um bom livro. Quantas vezes senti que o autor me conhecia melhor do que a mim mesma ao ler meus sentimentos mais profundos nas palavras do outro. O autoconhecimento pode vir de lugares inesperados – até mesmo das páginas de um romance.
“Parece obra de um gênio celestial, que se aproxima dos homens para lhes dar a conhecer a si mesmos da maneira mais natural”, exclama o protagonista de Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister, de Goethe, ao ler pela primeira vez a obra de Shakespeare. A ficção é um espelho mágico.
Em tempos de estresse e burnout, a literatura pode ser um antídoto poderoso. Ler ficção não “serve” para nada. O propósito é puro prazer. Quer algo mais revolucionário nesta era em que buscamos aumentar a produtividade e a eficiência?
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Tenho enxaqueca e luto contra ela há mais de uma década. Já passei por uma série de neurologistas, mas nunca vou esquecer de um em especial. A cada consulta, saía com uma recomendação de um livro junto com a prescrição médica. Alguns daqueles medicamentos funcionavam, outros não. Os livros, por outro lado, ficaram ao meu lado muito tempo depois que as crises passaram.
Com tantos benefícios e sem nenhuma contraindicação, a literatura deveria ser tratada como remédio. Ela cura a solidão, pode valer por algumas sessões de análise, traz empatia e nos inspira a virarmos pessoas melhores. A bula só deveria alertar que ela pode trazer dependência: minhas estantes que o digam.
* Carolina Ruhman Sandler é jornalista, escritora e biblioterapeuta na The School of Life
Por que os livros deveriam fazer parte da sua prateleira de remédios Publicado primeiro em https://saude.abril.com.br
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